Só Tristeza

Não se preocupe, ó meu amor,
Com esse jeito que ando por esses dias,
Eu tenho apenas uma mistura amarga
Aqui dentro do meu peito 
E o gosto acaba subindo pra boca
E isso acaba desfazendo o sorriso
Que eu tinha guardado pra te dar
E  eu tenho tristeza, só tristeza...

Não se desespere, ó meu amor,
Não é nenhum outro mal que me aflige,
São coisas que estão andando tão ruins,
O mundo tem  dado tão loucas voltas
E os homens acabam se matando 
Num pouco-a-pouco tão inquietante
Talvez como nunca se viu antes
E assim tudo é tristeza, só tristeza...

Não perca a paciência, ó meu amor,
Eu tento e continuo ainda insistindo,
Minha esperança ainda teima em viver,
Ainda presto atenção aos cantos do dia,
Ainda quero o encanto de todas as flores,
Preciso ainda da alegria das crianças,
Mas a morte pode chegar à qualquer momento,
E eu sinto muita tristeza, só tristeza...

Não se amedronte, ó meu amor,
Se eu me atrasar pra chegar em casa,
Certos compromissos depois de assumidos
Não poderão ser mais descumpridos,
Ainda existem céus que preciso voar,
Versos que ainda preciso escrever,
Sejam em noites escuras ou em alguma sarjeta
Pois trago comigo tristeza, só tristeza...

Não fuja disso ,ó meu amor,
Prepare aquele vestido bonito, o azul,
Aquele que realça os teus olhos castanhos,
Não borre a pintura com lágrimas,
Amarre o cabelo do jeito que eu gosto,
Vai ao meu enterro como a viúva mais linda
E se te pergunta de que eu morri responda:
Morreu de tristeza, só de tristeza...

(Para J.A.B.S., extraído do livro "Muitos Dias Já Passaram" de autoria de Carlinhos de Almeida).