sexta-feira, 19 de abril de 2024

15

Acordei quase pouco atrasado

Para o cometa que passaria ali

Pelo fim dessa manhã anoitecida

Estranho a mim mesmo em espelhos

Enquanto um burguês desnorteado

Faz profecias em yoruba clássico

Pelas ruas insanas da velha Paris

E o menino vende flores lilases

Que a menina avidamente come

O real destino é não ter algum

Moedas chacoalham em bolsos sujos

E a família reparte as velhas sobras

Não quer ser mais incômodo ainda

Agora sobram pérolas e faltam porcos

Meu sotaque nordestino é caprichado

A cultura nacional cabe na vasilha

As bruxas se esconderam nos bunkers

Fogueiras tímidas são digitadas

E a novinha trai o corno por algum pix

Farinesi é a agora a nova moda eterna

E batalhões de saltos altos invadem

O que restou de alguns meros escombros

Me intoxico cada vez mais de eu mesmo

Só que me viciei tem dois dias seguidos

Fragmentos poéticos agora sujam o ar

E versos aleijados dançam a polca

E certos nomes são apenas nomes

Dois contos de pão agora é normal

Orcas caribenhas e vegetarianas

Coleção de velhos maços de cigarro

Os velhos óculos quase quebraram

Só estão faltando certos detalhes

Os talheres estão arrumados no chão

Enquanto conhece todas as iniciais

O caos será somente de onomatopeias

E balões de puro material caseiro

O arroz que eu comi já estragou

Verdades não possuem sequer idade

O meu quinze faz muito que aconteceu

Mas mesmo assim acontece diariamente...

quinta-feira, 18 de abril de 2024

Carliniana XXXVII (Tutti)

Tudo que acaba, termina,

Ondas na praia, qualquer lugar,

As nuvens caem, não são folhas,

São águas, assim temos de chorar...


Tudo, tudo, um imenso encanto,

Todo som ou ruído, é um acalanto...


Todo sonho parte, vai embora,

Só sabemos que não mais voltará,

Cada folia é mais uma folia,

E todo nosso carnaval vai passar...


Tudo, tudo, descomunal ciranda,

Tempo escravo que nos comanda...


Todo beijo, apenas uma lembrança,

Todo carinho, impregnado de ternura,

Um cão latindo na mais cheia lua,

Toda claridade, mesmo que escura...


Tudo, tudo, toda chama acesa no velário,

Falsa esperança de um poeta solitário...

Carliniana XXXVI (Propriedade)


Caminho entre tempestades azuis

Num jardim de borboletas ferozes

Cada palavra deve ser bem pesada

E cada gesto bem medido portanto

Nunca escaparemos dessas cercas

Sem algum ato mais louco e heroico...

Gigantes não esperam por pedras...

E nem o prato do dia sempre é melhor...


Enlouqueço com certos detalhes

Até que minha paixão me imploda

E todas as cores que escolhi sumam

Afinal de contas faltaram as contas

E os meninos agora foram na rua

Espero chegar um novo carnaval...

Toda velhice já foi juventude...

E meus bons modos são grotescos...


Duelo com minha própria sombra

Até que o copo e o prato esvaziem

E a velha casa crie brancas asas 

E o improviso seja mais estudado

As lentes não estão mais salgadas

E o carro corre noturno pela cidade...

Nenhuma piedade acende velas...

E cada nascimento é novo funeral...


Estalo os dedos esperando faíscas

Enquanto estrangeiros entre terras

Me pesadelo feito o novo mártir

De uma causa um pouco desconhecida

Como um jornal velho do futuro

Que teima em falar só verdades...

Acabei de engolir um pouco de poeira...

Nenhum mal me aflige de forma alguma...

quarta-feira, 17 de abril de 2024

Vale do Anoitecer

Quando chega a noite,

Quando morre o dia,

Quando chega o sono

E nem há mais ave-maria...


Eu penso nesta solidão,

Mais solitário do que um cão...


Quando a fome maltrata,

Quando a impaciência manda,

Se apagou a fogueira

E acabou a nossa ciranda...


E toda resposta é apenas não

E todo o sonho foi apenas vão...


O xarope não passa tosse,

O remédio a doença não cura,

A chama não ilumina o caminho

Dentro dessa noite tão escura...


Um centavo pode valer um milhão,

Uma vida inteira pode não ter razão...


Mas mesmo assim eu corro desesperado,

Procurando entre escombros um motivo,

De mesmo com tantas coisas amargas,

Mas uma razão para continuar vivo...


Para a vida não há amor, há paixão,

Para a morte não há explicação...


Quando morre a noite,

Quando irá anoitecer,

Quando chega o sono

Neste vale do anoitecer...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

A Lua Esta Lá (Miniconto)

Falava mais através de gestos do que por vocábulos. Apontava mais para o nada como qualquer outro. Era mais enganado por si mesmo do que por qualquer um outro. Responsável pela maioria de seus erros, principalmente os que escondeu de si próprio mesmo quando os colocava expostos em praça pública. Está onde deveria pelo menos ter estado fisicamente, entre os mares de seu choro e os lados de seu suor, sem falar dos rios de sua indecisão. Isso importou o que? Quem souber que o responder, pois a lua continua onde sempre esteve...

terça-feira, 16 de abril de 2024

Morbidez Imediata

E eu ando entre túmulos esquecendo minha morbidez imediata. E só me lembro daquilo que não podia lembrar. Rio sozinho dessa minha solidão quase sólida feito um muro de Berlim que ainda não caiu...

Estou cansado, tão cansado de mim mesmo como se tivesse mais de mil anos existindo e sofrendo...

E minhas recordações são espinhos profundamente doridos com algum tempero para poder disfarçar. A piedade para os velhos é um tiro como qualquer um outro antes mesmo do dedo puxar o gatilho...

Jogaram um balde d'água sobre as chamas da fogueira e se comprazem em vê-la agonizar antes da extinção...

Queria eu saber galopar entre nuvens e outros cristais de cores mais cintilantes como é qualquer uma utopia que não conhecemos. Se o caminho fosse conhecido seria apenas mais uma repetição de uma rotina que acaba enjoando também...

Cá estamos com nossa memória quase apagada por camadas e mais camadas da tinta do tempo que é da cor cinza...

E meus demônios passeiam depois do almoço para melhorarem sua digestão depois de tantos pecados nossos engolidos. Uma indústria de perdões acaba fazendo sua produção em massa como uma outra qualquer que exista...

Respiramos com a mesma dificuldade de sempre como se fumássemos cem cigarros de uma vez só...

E toda forma de censura é a castração do que há de mais belo, mesmo que não exista nada tão bom. Poetas engolem narcisos enquanto pedem humilhadamente likes por improváveis redes...

Mão estendidas como suplicantes que afinal somos mesmo quando pensamos que não...

E a cachaça desce de goela abaixo sob as formas mais impossíveis que nem ao menos notamos. A embriaguez do que não é nosso nos atinge mais que qualquer vírus sobre a face da terra e nem percebemos nossa morte na hora...

Procuro adjetivos no escuro e só achamos superlativos, alguns com alguma graça e outros sem nenhuma...

Tudo é tão mórbido e pálido como deveria ser...

Alguns Poemetos Sem Nome N° 259

O famoso pisa

Na cara do anônimo

O saciado ri

Da cara do esfomeado

Que está são

Não liga para o doente

O feliz zomba

De quem está infeliz

Mas todos finais igualam-se...


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Azul e azul...

Por que não?

Em dias como estes

Nada mais poderemos evitar...

Em céus tumultuados

A estranheza vem caindo...

Chorar pode ser ruim

Mas há bem pior...

Azul e azul...


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Ele era ele e ela era ela. Minha cabeça tonteia sem motivo algum. O céu era o céu e o abismo era o abismo. Para os dois é preciso ter asas e sempre. Água era água e fogo era fogo. Todas as perguntas irão se calar em breve. Um brinde é um brinde e o luto é apenas o luto. Nunca enxergaremos que não existem opostos em nosso existir. Cada poema é sentimento ou tentativa insana. Os olhos podem fazer discursos e nosso sono pode dar gritos sem notarem. O caos é o caos e o repouso é o repouso. O poeta dança sozinho na praça solitária. Ele era ele e ela era ela...


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Línguas são cegas

Lábios destituídos de razão

Sonhos são perigosos

Todas as nuvens caem do alto

Os pássaros são teimosos

E as flores mais ainda

Toda ternura se agiganta

Até não poder mais...


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Meu silêncio é um ácido

Que corrói o metal de minha alma

Até que tudo esteja consumado...

Minha sina é uma piada de mau-gosto

E eu sou apenas um clown

Que acabou faltando o picadeiro...

Meus versos são inutilidades

Como pequenas flores ou insetos

Que acabo pisoteando sem querer...


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Não era eu... Era um outro menino que reinava um reino de coisas e sonhos... Foi num tempo tão distante... Foi num outro carnaval onde a alegria existia e muitos risos também... Eram outras águas que faziam sonhos diferentes de um quase acordar... Tudo vai embora... O bem e o mal acabam nem se despedindo... O amor e o desamor cumprem o mesmo itinerário e nunca mais nos visitam... Tudo passa... Não era eu...


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Poesia é febre

E cada delírio que ela nos dá...

Poesia é vento

E nos bailado das folhas arte...

Poesia é nuvem

E quem dera fossemos com ela...

Poesia é muro

Barreira instransponível de nós mesmos...

Poesia é cor

Juntadas todas elas na mesma paleta...

Poesia é febre...

15

Acordei quase pouco atrasado Para o cometa que passaria ali Pelo fim dessa manhã anoitecida Estranho a mim mesmo em espelhos Enquanto um bur...