segunda-feira, 6 de maio de 2019

De Leve

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O chinês de Madureira flita pastéis pensando na mulata de tranças afro que passou quase agora. E sol persegue os passantes em busca de seu sustento diário. São mil vozes sem coro algum em perfeita harmonia. Não repare seu moço esse lixo espalhado por aí. É que depois de pintado o pessoal do pintor surrealista não veio mais buscar o material de trabalho.
As vozes dos camelôs fariam tremer a Capela Sistina. Cristina tem os dentes meio acavalados. Não é culpa da moça que já envelheceu. Aparelho nos dentes não era moda no seu tempo de fogo. Os velhos que se cuidem. Os novos estão na fila para envelhecer se seu Zé Maria deixar.
Seu filho da puta! Não me contou o sonho e deu na cabeça? Era o número da cova. Bem que eu sabia. Elefante e águia iguaizinhos. Sem pôr nem tirar. Pra gringo ver. Chicano também. Vem tudo pra cá. E uma passeata de ontem me deixou cansado. Tudo que nem fila. A gente sabe esperar.
Acabaram os vaga-lumes. Mas o pessoal da dengue anda caprichando mesmo. Deixa eu contar as moedas aqui. Dá pro pão ou pra cana. Depende da sede ou da fome. Vai que meu anjo-da-guarda manheceu na esquerda e aí já viu. Bato o pé e é cara feia mesma. Eu sei tudo. Tirando o que sobra não fica mais nada. Pulava o muro depois da merenda.
Disseram que ia mudar. Só se for pra pior meu bom! Olha a cara do cara. Nem o Capeta se engana. Filosofia do baralho eu sei e muito que bem. Rebola aí mais um pouco. Faz parte da solidão ficar com um monte de gente. Até estranho serve. A rua é minha. A praça também. É só questão de tempo e o carro vai.
Vai ali rapidinho e tira um xerox pra mim. Guardo no bolso que nem mandinga de preta véia. Faço questão. Passo tão e tão. Só o chinelo não pode rebentar. Coloco preguinho e tá nos conformes. Baba aí Tiãozinho. Nem foi dessa vez que certaram.
Tem quem nem esquenta e ronca até não poder mais. É quase que sempre. Se soubesse. Não queria mais. Ficava de boa em qualquer lugar. A meia rasgou. Mas tem tempo que nem uso. Bigode é coisa séria de se arrumar. Folia também. Eu sou bate-bola o ano todo. Tenho até parente. Nem me diga. 
Black is black. Apesar de toda covardia que usa galocha. Nem sei mais o que inventam. Tamos aí. Meu jabuti anda de skate. E eu conto todos os olhares que dei. É coisa de maluco. Mas quem não gosta? Pedaço por pedacinho eu sei. Deus não duvida de mais nada. Falta só alegria.
É quase de graça. Quase de graça. É só chegar minha freguesa. Esmola pouca é bobagem. Eu cá no meu canto lucro menos. E quem sabe não é isso mesmo? Vou dar uma mijada ali e já volto. Desde que o cigarro não caia da boca. Liberdade é quase fundamental mesmo. Atrás de toda seriedade quase morri de rir. Mas também se morre quase toda hora...

(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).

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