sexta-feira, 10 de maio de 2019

Carta Antecipada para Minha Mãe



Mãe:
Desculpe essas linhas mal traçadas
Como naquelas cartas antigas.
É que eu tenho pressa, muita pressa,
Acho que desde que me entendo por gente...
Pressa sim, muita mesmo...
Sei que depois de amanhã é teu dia,
O dia de todas as mães do mundo,
Mas como o teu é todos eles,
Me deixa falar...
Eu sei que nunca fui aquele filho
Que a senhora queria que eu fosse,
O herói do dia, 
O mais forte e o mais bonito de todos.
Não fui herói,
As injustiças desse mundo me fazem tremer;
Não fui forte,
Não consegui controlar minhas paixões;
Não foi o mais bonito de todos,
O azul dos meus olhos fugiram
E foram parar no castanho tão belo dos teus.
Desculpa, se não coloquei netos em teu colo,
Se não dei oportunidade para que tricotasse
Belos mimos para eles,
Para que fizesses aquela cara séria 
Diante de alguma de suas traquinagens
Para depois lançares um daqueles sorrisos tão teus.
Desculpa, eu sinto falta daquele café
Que era tua ciência e arte mágica,
Que vinhas me trazer em manhãs de ainda sono...
Sinto falta de tudo, tudo mesmo
E milhares de versos que escrevesse
Não poderiam conter a minha falta.
Falta dos teus passos pequenos pela casa,
Falta do teu rosto concentrado vendo a novela,
Da tua curiosidade fazendo perguntas
Que nem eu mesmo poderia responder...
Outra coisa, antes que me esqueça,
Apesar de falar sobre isso sempre e sempre,
Desejo toda a felicidade do mundo para as outras mães,
Mas não consigo detestar os dias de domingo, 
Detesto todos eles, sem exceção alguma.
A senhora gostava tanto de domingos
E o destino foi debochado e malvado comigo,
Num deles eu te perdi
E no outro fui ao teu funeral,
Naquele dia os domingos para mim acabaram
E o encanto deles se tornou apenas choro.
Desculpe, mãe, eu sei que é egoísmo de minha parte,
Sei que estás num lugar bem melhor que esse.
Do lado do meu velho que te amava e ama tanto,
Que as tuas dores causadas pelo tempo cessaram,
Mas é que eu sinto tua falta, muita mesmo
E certas coisas não podemos evitar...
Fica aqui então aquele beijo
Que eu te dei muitas vezes 
E hoje não posso te dar mais.
Só peço que não dê muitos carinhos aos anjos
Porque eu morro de ciúmes...


(Homenagem para minha mãe Maria Nair Oliveira de Almeida - in memorian - do livro "Muitos Dias Já Passaram" de autoria de Carlinhos de Almeida).

2 comentários:

  1. Que emocionante texto, ela certamente estaria orgulhosa e feliz com as palavras sinceras, sentidas.
    Sabe de uma coisa? Como mãe e filha, digo: O que o filhos pensam que as mães querem deles provavelmente é só achismo, nós mães queremos tão pouco dos filhos e muitas vezes carregamos(eu carrego) pesos inúteis. Espero que um dia meu filho compreenda isso, antes que eu morra.

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  2. MUITO BOM PENSO QUE JA O RECITEI. MANUEL JORGE (MANELOSTAR)

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Carliniana XLIV (Tranças Imperceptíveis)

Quero deixar de trair a mim mesmo dentro desse calabouço de falsas ilusões Nada é mais absurdo do que se enganar com falsas e amenas soluçõe...