domingo, 27 de novembro de 2022

Minha Espiral



os cães passam e as caravanas ladram
é absurdamente absurdo aquele absurdo nosso
o teto de gastos acabou chegando ao teto
enquanto faltam saias para as saideiras saírem
feliz de quem tomou uma porrada e nem doeu
estamos na hora do lanche e nem felizes
no campo de refugiados há apenas silêncio
eu tenho apenas um motivo para ser mais um
os presos se rebelaram e agora querem marimbas
não iremos mais passear no bosque à noite
e nem comer doces sem lambuzar os dedos
a oficina de teatro agora conserta carros
e o senhor ministro dançou mambo na TV
é tudo madeira de dar em quem não é doido
no meio da noite estou procurando um sol
pois todos arrependimentos a mim pertencem
entrevistas à parte esqueci a vida noutro bolso
e minhas gravatas já levantaram voo faz tempo
cada uma frase feita esconde o seu esqueleto
mais água no feijão e teremos um oceano
toda lógica é uma mordaça que nos morde
em noites de lua cheia viro ser humano
o cesteiro que faz um cesto faz isso na sexta
todo clássico tem um quê de qualquer coisa
eu passo a língua nos meus cacos de dentes
e o meu não-falar constrói castelos implausíveis
a técnica claudica apenas de propósito
o charme dela causa-me inocentes ereções
e seus pelos pubianos seriam o hall do meu hell
há muitas formações quase rochosas agora
cada verso será saboreado com bom vinho tinto
enquanto a minha tristeza está sob a capa
mais um domingo e será mais uma semana
eu entro em transe todas as vezes que penso
como seria bom se todas as coisas fossem boas
até os animais se animariam bem mais
o meu espólio será composto de muitas loucuras
a poeira das cinzas da poeira está presente
e eu daqui limpo meus óculos de forma inútil...

(Extraído de "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Da Natureza dos Porcos

Somos porcos, nem percebemos isto

Comemos a merda do outro e nem vemos...

Há muitos chiqueiros por aí...

Alguns mais limpos, outros mais sujos,

Mas sempre isso - chiqueiros...

Chiqueiros caros, chiqueiros baratos,

Chiqueiros com muros, outros nas calçadas...

Chiqueiros barulhentos com muita festa,

Outros mais silenciosos com restos mortais...


Somos porcos, não temos noção alguma,

Queremos engordar, mas não sabemos do abate...

Há porcos pensantes, outros mais tolos,

Porcos letrados, outros que não estudaram...

Há porcos mais bonitos, com bundas lindas,

Outros sem estética, mas também porcos...

Que porcos mais mentirosos que somos,

Nossa principal preocupação é comer

E quando podemos também - foder...


Somos porcos, quase sempre enganados

E o que nos engana é aquilo que queremos...

Mesmo limpo o corpo, a alma é suja...

Vamos remexer nos baldes de lixo,

Procurando restos mais sujos possíveis,

Restos de sonhos agora semidevorados, 

Pedaços de taras mal disfarçadas...

Somos assim desde outros tempos,

Sujeitos à mudanças que não nos muda...


Somos porcos, porcos que se dizem sábios,

Porcos sabidos, porcos mais malandros...

Não escapamos do açougueiro do destino,

Que vai nos expor em muitos pedaços,

Linguiças, pernis, toucinhos, costelas

Para os mais variados gostos e preços,

Nós mesmos é que nos vendemos,

Por algumas sujas e pobres moedas

Que nem ao menos de prata são...


Somos porcos, humanos porcos vis

Numa grande sujeira chamada mundo...


(Extraído do livro "Só Malditos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quarta-feira, 23 de novembro de 2022

O Mar Não Tem

Eis o menino

que um dia quase se afogou

em sua beira

num dia de muito e muito sol...

Não pregarás mais estas peças...

Os castelos de areia

há muito inexistentes

não haverão mais em tua areia...

E aquelas boias de pneu?

Agora o menino não brinca nelas

e nem quer voltar a brincar...

Papai não me acordará bem cedo

para pegar a maré cheia

com a água ainda morninha

antes do sol bater seu ponto...

Eram dias felizes...

O velho carro cheia de coisas

para alguns dias fora de casa

até que a saudade fosse presente...

Não há também rodas-gigantes

que subíamos felizes

em noites quase generosas

dos fins-de-ano com lâmpadas...

Eu não sei... Eu não sei...

Eu não me lembro mais...

Onde foi parar o barco vermelho

de plástico com salva-vidas amarelo...

Eu não sei... Eu não sei...

Eu não sinto mais...

Aquele amor por que foi embora?

Foi o peso dos anos que chegou?

A tristeza que transbordou?

Algum vento mal que virá

sem ao menos dar algum sinal?

Mar... Mar... Querido mar, desculpa-me...

Continua com teus barcos serenamente

parados enquanto continua

tua tarefa de ir e vir sem cansaço...


(Extraído do livro "Muitos Dias Já Passaram" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Alguns Poemetos Sem Nome N° 212

Aos sós - a solidão,

ferida sem tamanho exato,

deserto ou multidão...


Aos sós - o desespero,

um desespero que não fala,

que tortura com esmero...


Aos sós - a morte viva,

que chega de mansinho

e desse banquete é conviva...


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Não sei quando amei pela primeira vez,

acabamos esquecendo de coisas antigas,

deve ter sido num dia destes perdido...

Há até outras coisas mais antigas

que surpreendentemente me lembro...

Deve ser que essas doeram bem menos...


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Não sou desse tempo líquido

onde as pessoas perdem a vida

atrás de efemeridades 

que se suicidarão fatalmente...

Meu tempo é outro...

É um tempo que tem tempo

Para alguns sonhos

e até algumas impossibilidades...


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Deixa a porta aberta pra eu entrar

Não sei se venho daqui ou de lá

Se voei pelos mais altos ares

Ou me embriaguei pelos bares

Se falei besteiras sem sentido

Ou chorei quando deveria ter rido

Enfeita teu cabelo com aquela flor

E não estranhe - esse é meu amor...


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Quero lugares- comuns

Não me importo com mais nada

O tempo correu e eu

Não tenho mais tempo algum

Para assumir outros compromissos

Quero sentir cada pétala macia de flor

E a vida que as folhas possuem 

Antes de uma por uma morrer...


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Todo verso é teimoso

Traz um mundo dentro de si

Um universo que não consegue

Ir na esquina ver novidades...

Todo verso é egoísta

Quer dentro dele todas as cores

Quer pintar todas as paredes

E gravar corações nas árvores...


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Sento-me comodamente em meu túmulo

Vestindo minha mortalha da moda

Enquanto escuto a notícia do meu falecimento...

Eu morro em cada momento

Com as notícias do mundo...


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Erros Flexionais

 

Nada é,

Tudo era...


Flexionamos tudo erradamente

O momento chega e tão-somente

Antes de vermos já foi embora

Tudo não possui o riso agora...


Nada tem,

Tudo tinha...


Não adianta fazer algum alvoroço

O sonho é apenas um vão esforço

As gotas do soro caem lentamente

Todo igual fica diferente...


Nada posso,

Tudo podia...


Quando eu estava há pouco tempo aqui

Desconhecendo as tristezas que já vivi

Tudo agora é cinza e dessa mesma cor

Será feito uma colcha de retalhos de dor


Nada quero,

Tudo queria...


Frases feitas não darão em nada

Gestos ensaiados são apenas piada

Chega de ter o que resta todo perdido

Escrevendo versos sem algum sentido


Nada voou,

Tudo voava...


A queda nem sempre é o que há de pior

Anular-se pode causar uma ferida maior

Pedras não são quebradas com socos

Hospício sem médicos, apenas loucos


Nada espero, 

Tudo esperei...


As feridas insistem de ser no mesmo lugar

São semelhantes os opostos - amar e desamar

É só mudar uma só letra e aí estão temporais

Vivemos cometendo meros erros flexionais...


Nada é,

Tudo era...

terça-feira, 22 de novembro de 2022

Cemitério de Pássaros


A tua chance acabou,

a fantasia rasgou,

sonho? Não tem mais...

A guerra foi declarada,

claro que não foi nada,

foram meros temporais...


A morte descansou em pequenos túmulos,

vemos lápides de tantas perdas e acúmulos,

vemos anonimatos e fatos dignos de nota,

aquele vencedor e o que abraçou a derrota...


A tua encomenda chegou,

teu cão não avisou,

desejo? Não tem mais...

A vulgaridade foi aplaudida,

é o que chamamos vida,

não haverão festivais...


A morte arrumou os seus canteiros,

bem vindos conhecidos e forasteiros,

todos aqui chegam ao mesmo destino,

o rico e o pobre, o velho e o menino...


O teu ar já cessou,

o tempo que roubou,

ir por aí? Não tem mais...

Agora só há essa casa,

sem voar mesmo com asa,

pode descansar em paz...

sábado, 19 de novembro de 2022

Estático ou Não

Estático -

o dia como todos os dias o são...

Ilusão nossa -

o tempo usa sua máscara 

acaba existindo o inexistente...

Os pássaros acabam colaborando...

O mesmo canto nos engana

Pois a novidade envelheceu...

As ruas -

continuam com a mesma cara...

Os versos -

repetem sua mediocridade e batem no peito:

- Mea culpa! Mea culpa! Mea culpa!

Enquanto a sinceridade

ensaio um novo tango sem sentido...

Esperem! -

disse a Morte procrastinando 

seu último dever de casa...

Escuto o barulho de águas

Caindo sobre mim...

Não sei -

se o amor estava vindo ou indo,

trens ou barcos são assim...

Tão forte -

como uma pedra teimosa

em ser mais que a maldade

da destruição aos poucos....

E fraco -

como a ternura que engana

e domina tudo e todos...

Numa foto -

o rio passou e não passou

o que passa são olhos...

Aquele menino

sou eterno...

sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Alguns Poemetos Sem Nome N° 211

 

Estrelas tímidas

Que acabam nunca falando

O silêncio dos céus

São infinitos gritos

Mais do que imaginamos...

Estrelas de tamanho sem fim

Desenham por todo espaço

São grandes passarinhos

Que nos olham lá de cima

E vivem cochichando sempre,,,


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Perdi meu dinheiro 

Perdi a razão

Perdi a matéria

Transcendental não

Perdi o arroz

Perdi o feijão

Perdi o rumo

Acabei perdendo o pão

Perdi o meu sim

Perdi o meu não

Sou apenas mais um

Infeliz cidadão...


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Homem cortado ao meio,

Não homem-pedaço,

Mas meio-homem sim...

Abaixe a cabeça ao dinheiro,

Acredite nas mentiras capitais,

Se impressione com o mesmismo

De antigas e rotineiras "novidades"...

Espere a sua morte no sofá,

Sem fazer nada, andar nada,

Apenas se lamentando

Que a vida passou e ninguém viu,

Muito menos você...


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Num tempo que o tempo era tempo

Não sabíamos de quase nada...

De algodão eram feitas as nuvens

(seriam de algodão doce?)

Existiam varinhas de condão

enquanto mágicas e milagres aconteciam...

Todo mundo era bom

(até quem nos assustava)...

Num tempo que o tempo era tempo

Eu nem pensava na morte...


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Estou no meio...

No meio de um vulcão que eclode

e mal noto o seu calor...

No meio de um tiroteio

e as balas são apenas mosquitos....

No meio de uma explosão de estrelas

e o pó delas é apenas purpurina...

No meio de um jardim feito de sonhos

e mesmo assim espinhos me ferem...

Estou no meio...


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Peguei um copo d'água

e engoli meu lirismo...

Sua presença não incomodará

mais ninguém nem eu mesmo...

Fiz dele um simples comprimido...

Não ocupará espaço...

Chegará ao estômago

e finalmente, morará em minhas veias

até que me envenene de uma vez....


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Estou sentindo um cheiro de céu...

Não sei se a chuva que vem chegando

Para compor outro buquê de terra molhada

Que quase me faz sentir alegre...

Não sei se é apenas o vento amigo

Que vem trazendo alguma boa notícia

Como já não tenho faz tanto tempo...

Não sei se é cheiro de circo,

Se é cheiro do parque, dos cinemas

Ou das festas de igreja que eu ia...

Das férias de fim de ano

Ou de velhos carnavais que não voltarão...

Só sei que estou sentindo um cheiro de céu...


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quarta-feira, 16 de novembro de 2022

Aleatórium Number 1

 

Sem tipo. sem previsão,

Apenas aquilo que é,

Sem causa, sem ficção,

Sem descrença, sem fé


tantas mágoas vieram me chamar de bicicleta

nunca soltei suspiros quando comi suspiros

mergulho todos os dias numa piscina vazia

nas coisas mais banais descobrimos alegria


Sem motivo, sem rumo,

Vou dar de cara no muro,

Sem parede, sem plumo,

Sem passado, sem futuro


o mágico tirou um elefante da sua cartola,

nem todos os que morrem viram notícia,

a baiana exagerou no vatapá da minha pimenta,

a felicidade só chega se for em câmera lenta


Sem choradeira, sem carnaval,

Não houve vaias e nem palmas,

Sem previsão, sem fato fatal,

Sem corpos, sem almas


quem dita todas as regras é o nosso freguês,

a nossa fome determina aonde iremos parar,

eu perco meu juízo algumas dezenas de vezes,

nesse grande curral do mundo somos as reses


Sem insônia, sem cochilo,

Não houve rotina, nem acidente,

Sem preguiça, sem o esquilo,

Sem oculto, sem evidente


eu tenho os fósforos mas não tenho a caixa,

tenho todos os motivos e nenhuma razão,

as evidências acabam pulando na cara,

a vulgaridade se transformou joia rara


Sem tipo, sem previsão,

Apenas um sanatório,

Sem causa, sem razão,

Tudo é apenas aleatório...


(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).


sábado, 12 de novembro de 2022

Pix

Sem pix

sem pax...


Um pix, tá pago,

um gole, um trago,

o remendo, o rasgo,

o i-food,

o nude...


Sem like,

sem bike...


Um like, tá feito,

uma bunda, um peito,

o errado, sem defeito,

o i-food,

o grude....


Sem combo,

sem rombo...


Uma balada, um porre,

uma porrada, um corre,

quem vive, quem morre,

o i-food,

o gude...


Sem nexo,

sem sexo...


Um perigo, um castigo,

um predador, um inimigo,

o moderno, o antigo,

o i-food,

a vicissitude...


Sem pix,

sem pax...

quinta-feira, 10 de novembro de 2022

Filosofia para Idiotas

Eu fumo sal

Eu bebo carvão

Eu me enveneno

Tomo banho de fumaça todos os dias

Me envelheço com a minha mocidade

Como um prisioneiro voluntário

Me jogo no chão

Sujo minha roupa

Voluntário de erros

Acredito nas minhas reais mentiras

Exagero no meu mais fiel conformismo

Passeio calmo no meio de um tiroteio

Eu falo merda

Esqueço tudo

Compro uma briga

Eu me drogo consumindo droga nenhuma

Enfio mentiras de minha goela abaixo

Gasto tudo que tenho por mais um nada

Eu me dou mal

Na escola de tolos

Só tiro nota dez

Acabo rasgando todos os livros que são meus

Santifico toda e qualquer ignorância que há

Eu faço a minha lição de casa com cuidado

Falta de espaço

More num buraco

Sou quase rato

Eu mato o pau e não mostro nunca a cobra

Preparo os golpes mais idiotas possíveis

Acredito em tudo aquilo que me contarem

Eu engulo tudo

Não tenho nojo

Espero a morte...

Alguns Poemetos Sem Nome N° 210

Quintas com gosto de quintas

Assim como toda semana

Novidades mais banais

A surpresa é o prato do dia

Hoje é a vida

Hoje é a morte também

Decepções à granel

Como Bandeira um dia falou

Vamos tocar um tango argentino...


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Sou mais um idiota na fila

Achando que sei alguma coisa

Mas sou apenas um enganado...

As flores estão à venda no mercado

As estrelas estão impassíveis

Todos estão olhando para o lado

O choro não convém para as pessoas...


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Um passo, dois passos, 

Tudo feito numa incerta noite

Como muitas por aí...

Os jardins são atacados,

Todos os soldados são malvados...

Todos os passarinhos perdem as asas,

Acabaram-se todos os voares...

Um passo, dois passos,

Na noite incerta da morte...


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Leve como plumas não existentes

são nossos sonhos latentes

dormindo sob cinzas apagadas...

Os rios com suas vertentes

lembram-me de tantos ausentes

que se transformaram em nadas...


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Eu hei de dançar sob pedras

descansar sob elas

não como quem está

sob uma caverna...

Ainda há muito o que fazer

depois farei mais coisas...

Descansarei sob o silêncio

de todos os jardins do mundo...

Todos eles são silenciosos...


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Fábulas modernas acontecem

quando damos razão aos que não possuem

Quaisquer palavras são parecidas

desde que nos tirem o trabalho de pensar

Há bem mais sob os montes de lixo

do que aquilo que nós imaginamos

Somos mansos cordeiros que mordem

e cada um briga pelo seu bom pedaço

Vamos logo olhar a nova bunda da semana?


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O meu tiro acertou em mim

é o meu fim

O meu tiro acertou no próximo

não foi nada...

Eu dei perdão para meus erros

eu sou perdoável

Alguém acabou de fazer errado

cortem sua cabeça...

O meu amor deve ser respeitado

mesmo não amando...

O coração alheio pode ser ferido

isso é o de menos...

Quem é o próximo? Quem é?...


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quarta-feira, 9 de novembro de 2022

Alguns Poemetos Sem Nome N° 209

Claro-azul de rosas serpentinas, eu ando desnorteado como um pássaro no meio da fumaça, ando cego como um colibri entre metais. Esqueci meu nome, de onde vim, para onde vou. Fico o dia todo olhando as bolhas de gás que sobem pelo refrigerante e penso se não poderia ir com elas. Dói o corpo, mais a alma, não sei como explicar isso, mas é o que acontece. Às vezes vozes inarticuladas chegam aos meus ouvidos. Será apenas um canto ou um anúncio sem trombetas de velhos anjos?


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Um carrossel gira, gira, gira sem parar. Sua velocidade pouco importa. Ele vai consumindo nossos dias, nossas chances. Ele engole nossos sorrisos, nossas ideias, nossa resistência. Vai rasgando nossa fantasia, terminando nossos carnavais. Ele não é o carrasco, nenhuma carpideira, amigo ou inimigo não é. Vai realizando sua tarefa, não observa detalhes, não escuta gritos, não analisa lamentos. Faz caretas no espelho, mostra a língua aos passantes, tira as calças em público. Um carrossel gira, gira, gira sem parar. Que carrossel? O da nossa vida...


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Pedra de encanto

Perdida no meio do mar

Pensei que nunca te veria

Mas o destino gosta de brincar...


Umas vezes ele faz caretas

Outras vezes ri conosco...


Pedra de encanto

Solta no meio das nuvens

Eu contei todas as estrelas

Até te achar entre algumas delas...


Não sei qual delas brilha mais

Mas acredito que sejam teus olhos...


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Morte em versos

água só

Continuemos nossa teima

até faltar pedaço

Preciso de um carinho

por mil anos

Perdi todos os meus dias

malvado tempo

Pode parar com esse choro

não me salva mais

Morte em versos

vento só...


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Vejo a mudez de meus próprios passos numa escuridão que só há em mim. Escuto barulhos imaginários que só pertencem ao meu próprio medo. Espero dias mais felizes que pararam pelo caminho e nunca mais virão. A fogueira está acesa, mas suas chamas não me iluminarão nem tampouco me aquecerão por entre frias madrugadas. Os ossos muito me doem, sou apenas eles, numa brancura espectral que antes nem eu mesmo conhecia. Vamos brincar de fantasmas?...


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Tiros para todos os lados

o que temos

o que podemos

o que pode nos salvar...

Gritos em todas as direções

o que nos assusta

o que me faz tremer

o que me faz tontear...

Sombras quase todas

é quase noite

é tudo escuro

eu quase nem vejo...


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Quem não tem, não tem

Quem não tem, tivesse

O mal junto ao bem

O que sobe e o que desce

Quem não faz, não faz

Quem não faz, fizesse

A guerra junto da paz

Fizeram uma quermesse

Quem não ama, não ama

Quem não ama, amasse

A comédia com o drama

Tem as duas um enlace...


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segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Lírio Delírio (Um Poema de Coisas)

 

Papéis rasgados e espalhados pelo chão

Tal qual cinzas dos cigarros que mesmo faço

Enquanto meu desespero brinca comigo

(Eram de ladrilhos de cimento amarelados)

Eu faço apenas um esforço sobre-humano 

Para que a memória não falhe mais ainda

E o cansaço não dê mais socos em minha cara

(Eis aí a chave de tudo aquilo que temos!)

Cada um tem seu preço seja alto ou baixo

Enquanto tudo é igual em sua diferença

São bailarinas descalças sobre as pedras

(Quem poderá nos salvar de nós mesmos?)

Minhas mãos estão todas sujas de tempo

E maior é a minha pressa de comer alguma coisa

Antes que eu mesmo seja engolido pelos chãos

(Não haverá mais azuis quando sobrarem cinzas)

Me ajoelho contrito e peço alguma misericórdia

Como um gato que dá pulos repentinos em roseiras

E faz do cão que o persegue sua nova vítima

(Todo sangue é vermelho e todo medo amarelo)

Os dentes dela apodrecem cada vez mais

Enquanto suas formas tão belas ficam disformes

E o tesão que todos tinham acaba passando

(Não fale aquilo que poderá se arrepender!)

Cada nome é apenas mais um original ou não

E todas as poses a fotografia acaba engolindo

Enquanto as velas se consomem aos poucos

(Poderei dormir enquanto o sono não chega?)

Numa quinta com gosto de sábado fiz segunda

Disputei milho com alguns pombos da praça

Mesmo quando não estava mais nela de vez

(Eu nunca fui bem comportado e não o serei)

Qualquer hora resgato aquilo que perdi

Até os versos que acabei jogando fora

Brinquedos quebrados e festas terminadas

(Será tudo feito de uma vez só ou não?)

E mesmo quando o pó tomar conta de tudo

E os vidros estiverem todos eles embaçados

Talvez alguém ver se minha febre está alta

(Como um delírio que afinal sempre tive...)

Alguns Poemetos Sem Nome N° 208

Sujas estrelas

    de poeira azul

Caminham por um céu

    onde beija-flores

e algumas borboletas sentimentais

fazem um coro...


Alto-falantes são rouxinóis,

    são rouxinóis, são, são...!


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A casa cai

O tempo vai...

O que sobrará para nós?

Apenas a voz...

A voz enfraquecida?

Eis o que sobrou da vida...


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Eu duvido de quase tudo

Da volta da paz qualquer dia

De novos sóis menos malvados

De outros sorrisos que brotarão

De brincadeiras pra nos distrair

De que os pássaros lembrarão de mim

De que as flores me serão generosas

De que algum gato roçará minhas pernas

E de que um cão lamberá minhas mãos

Eu duvido de quase tudo

Menos dessa teimosa esperança

Que não passa um dia sem me castigar...


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Me confundo com todo mundo

Em querer o que não preciso

Me confundo com todo mundo

E me machuco sem um aviso

Me confundo com todo mundo

Quando perco até meu siso

Me confundo com todo mundo...


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Abissais

Abidoces

Talvez algum perfume nos salve

Ou ainda que não

Nos console...

A arte acabou caindo de fome

Várias dores de cabeça

Sem analgésicos

Para salvá-la...

Um dia chegarei lá

E não perdoarei

Nem meus desencantos...


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Está esquecido

quem é ou quem era

Só meus passos 

poderão acompanhar-me

Antigas lanternas

não mais funcionam

E tudo que já vi

há muito morreu

Nem mais sombra

eu sou ou serei

Quero bailar agora

por toda eternidade

Embalado docemente

por alguns enigmas

que não me matem mais...


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Estático

e ainda assim vivente

Tolo

e ainda assim pensante

Rindo

e ainda assim de luto

Feroz

e ainda assim tão manso

Amando

e ainda assim malícia

Tudo e nada

todo o tempo todo...


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Come Na Cuia

Comê na cuia Comê na tuia Comê na nuia Experimente o berimbau catreiro Em todas as noites de pé de sapo! Paca tatu Paca tutu Paca Dudu Apert...