domingo, 1 de abril de 2018

Eu

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Desde o tempo que o tempo era tempo. E eu fazia que fazia e não fazia. Porque eram outros os olhos que fitavam a paisagem bonita e sem cores que se destacassem. Sim. Claro. Eu já espreitava em rostos que não eram meus os planos que nunca pude fazer. Eram planos bons beirando o impossível. Mortas flores que iriam brotar. Flores mortas em cerimônias solenes de um desespero nascido aqui mesmo. Pensem em tudo que não veio. Em barcos sem velas que não partiram do cais. Porque o cais não existiu. Nem os ventos também.  Dedos sem anéis em mãos estendidas. Súplicas trêmulas junto a olhares suplicantes. Eu suplico. Com a idade dos números. Antes que as pedras fizessem as pirâmides. E os faraós dessem seus últimos suspiros. A Esfinge nunca foi tão clara. E tão amigável. Os passarinhos pousam em sua cabeça e em seus ombros para cumprirem seu ofício. Dali partirão pelo mundo procurando mais jardins. Poderemos segui-los em suas migrações. Milhares de quilômetros. Os que não forem velas serão asas. E as asas dificilmente se partem. Esqueci minhas cicatrizes. Esqueçamos as cicatrizes e as feridas também. Elas fecharão por si mesmas. Como num passe de mágica. Presto! Abracadabra!  Agora você vê. Agora você não vê. As ilusões de óptica são reais. E as cartas não mentem jamais. Ciganamente falando a estrada sabe bater e acariciar de acordo com o passar. Olhe as estrelas. Milhares delas nos olham também. E se perguntam sobre tão estranho ser. Eu sou aquilo que eu mesmo nem sei.  Eu sonho aquilo que desconheço ser. Atrás de cada espelho só existem estranhos. Cada manhã nosso corpo acorda com outra alma. E uma rotina estranhamente original. Tudo se repete e nada se repete. Tudo existe e nada se prova. Tudo se quer e nada satisfaz.  Do contrário o pano cairia antes do final da peça. A insatisfação é o sal de todas as terras. E a simplicidade é a equação que tudo move. Vamos que vamos! Mesmo que a carruagem quebre na estrada. E os cães parem de ladrar. Vamos que vamos! Sou o cavaleiro e a montaria e o galope numa coisa só. A montanha e a altura e a vertigem. A fogueira e a febre e a fuligem.  Como os alquimistas tentam descrever. As letras do alfabeto. As brancas nuvens num paciente rebanho. Em pastagens celestes. De sonhos em que casas e cadeiras sobrevoam árvores com espessas folhagens sem frutos. E a altura é o risco. Escorregar em escadas também é bom. O risco se transforma em riscos de desenho. E isso pode ser divertido. Nunca mais eu tive pressa e nem perdi minha voz.  Me prostro aos deuses procurando o perdão e o perdoar. Não me importando com os espinhos e os invejosos. Tambores tocam ao longe. O sangue antes parado agora circula em rápidas voltas. Eu sou filho da Esfera. Eu nasci do fogo. Nele permaneço sem vírgulas e nem reticências. Mas cheio de interrogações. Eu as faço sem hesitar.

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