Anualmente
são perdidos sonhos em uma proporção inimaginável. Sua natureza pouco importa.
Desde supostos ganhadores do prêmio Nobel a os que almejaram condições mínimas
de sobrevivência básica. Desde artistas anônimos que sonharam em serem
superstars até guerrilheiros que queriam detonar o mundo. Sonham os banqueiros
de Wall Street sobre a falência de seus rivais de negócios e os meninos da
faixa de Gaza pelo fim do medo. Também sonham as garotas que rodam bolsinha em
Copacabana em arranjar um gringo para casarem e as levarem para o estrangeiro e
sonham as mães pedindo que seus filhos sejam alguém na vida. A roupa de marca e
o sapato velho sentam-se juntos. O adolescente nerd e virgem tem poluções
noturnas sonhando com a sua paixão de escola e o curumim com a volta de seu
povo para a reserva indígena tomada por grileiros. O mago e o mágico são muito
parecidos quando sonham. O padre e o pai-de-santo pensam em ter coisas
semelhantes. A notícia de indícios de um novo tempo causa tanto frisson quanto
a cura de uma gripe. O tiro que não matou causa tanta alegria quanto à visita à
maternidade. Sonha com o exame negativo o desprevenido enquanto solta suspiros
o poeta medíocre atrás de versos menos aleijados. O ofendido um dia quer dar o
troco e o missionário quer virar um mártir da causa. Se sonha o bom esperando o
ruim. Se sabe do ruim querendo que o inédito aconteça. No alto dos prédios corações
gemem e pelas calçadas de mãos estendidas também. A rede cheia de peixes vale o
mesmo que o iate na marina. A foto para a rede social e o novo quadro do pintor
cubista recém descoberto são iguais. Uma hora na lan house e uma viagem ao
espaço têm o mesmo tempo. A beleza quer aparecer em todos os espelhos. O lixo
reciclado salva o planeta e a hora extra espanta a insônia. Nada é tão igual
como são os homens e suas coisas e tudo se reflete em sua volta. Rosas querendo
se livrar dos espinhos se tornando margaridas e dias tristes querendo se tornar
noites alegres. Carnavais desesperados por novos tons e cerimônias saudosas do
riso frouxo. As tempestades tentam desviar sua rota e brisas calmas convidam ao
suicídio. Tudo sonha. E os sonhos não podem ser destruídos por ninguém ou nada.
Vão embora quando querem e muitas vezes lhes falta o querer. Os sonhos quase
nunca querem ser nada e apenas ser. Existiram desde sempre e sempre existirão.
O existir é sua única condição. Nada exigem a não ser serem satisfeitos ou não.
Se forem satisfeitos se transformam em outros para continuarem seu trabalho. Se
não satisfeitos continua sua cobrança silenciosa e atormentadora. Não adianta
tomar nenhuma providência para deles se proteger. Eles são imunes à nossas
defesas. Nada os faz morrer. Se parecem que morrem é apenas um disfarce. Os
sonhos podem parecer outros. E quando acontece isso eles devem ser satisfeitos
duplamente. Os sonhos se compreendem uns aos outros. Complementam uns aos
outros. Ajudam uns aos outros mesmo quando são opostos. Todos sonham. Mesmo
quando não sabem disso. O que quer a vida e o que quer a morte. O que sonha com
a paz e o que sonha com a violência. Coisas boas ou ruins causam sonhos. E até
enganos também. Até o não-sonho é uma espécie de sonho. Não querer sonhar e não
sofrer por causa disso na verdade é um sonho disfarçado em realidade. A
realidade por achar que existe sempre tem sonhos e não percebe isso mesmo se
alguém a tenta convencer. Porque a verdade é que é ilusória. A existência é um
sonho assim como a vida imita a arte. Sonhar então é tudo que nos resta...
Perdido como hão de ser os pássaros na noite, eternos incógnitas... Quem sou eu? Eu sou aquele que te espreita em cada passo, em cada esquina, em cada lance, com olhos cheios de aflição... Não que eu não ria, rio e muito dos homens e suas fraquezas, suas desilusões contadas uma à uma... Leia-me e se conforma, sou a poesia...
sábado, 9 de março de 2013
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Alguns Poemetos Sem Nome N° 322
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