Se, por acaso encontrares comigo, não estranhes. A face está um pouco mudada, tenho mais rugas do que antes, o cansaço agora se mostra mais do que um ator interpretando sua peça...
Antes, estas ruas não eram minhas, mas agora são. Já se foi um tempo em que aquele quintal antigo era meu reino e meus castelos lá estavam. As ruas são minhas, todas elas, onde a crueldade e a ternura estão de braços dados e ainda, apesar de todos esses frios dias consigo até sonhar...
Passo em frente às ruínas do que amei um dia. Sei de cor muitas histórias que não posso mais contar. Elas estão bem guardadas e, talvez um dia, encontrarei alguém que possa enfim escutá-las...
Se, por acaso, eu te cumprimentar, não me faças pouco. Eu sei que pode ser mentira desejar um bom dia quando a tristeza está em alta, que há uma guerra particular para todos os mortais, mas assim que tem de ser. Os pássaros nos saúdam com suas melodias sem propósito, as flores jogam suas cores em nossos olhos cansados e o mar repete seus versos num vaivém mais do que eterno. Responda, mesmo que se agora te pareço apenas mais um estranho em tua grande lista de esquecimentos...
Depois, segue teu caminho, não olhes para trás. Não é legal ver os velhos chorarem. Quando os jovens choram, choram pelos sonhos que querem ter e não estão alcançando; os velhos só choram pelos seus mortos, os sonhos que se deitaram e jazem em túmulos silenciosos...
Esquece que me viu, segue a tua rotina. A tua batalha continua, não chorarás todos os choros que desejarias e nem rirás todos os risos que estavam em tua agenda. Mas é assim, o destino é um patrão exigente que cobra que todas as nossas tarefas sejam bem feitas...
Amanhã, noutro dia qualquer, nunca se sabe, talvez nos encontremos de novo. Não te surpreendas, estarei mais velho, a ampulheta escorre suas areias sem se cansar. Estarei mais triste, isto faz parte de nosso enredo mesmo sem um carnaval. Mas tenhas toda a certeza, a esperança ainda me tortura, feito um espinho no pé...
(Extraído do livro "Novos Textos Poéticos" de autoria de Carlinhos de Almeida).
(Extraído do livro "Novos Textos Poéticos" de autoria de Carlinhos de Almeida).
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