A cega sendo conduzida pelo filho louco.
O orgasmo da puta que não soube se conter.
Os vassalos do tédio mascando chicles usados.
O cara desesperado porque o suicídio falhou.
Existem tantos abismos por aí...
O divã do psicanalista no quarto de motel barato.
A discussão filosófica de bebuns num boteco sujo.
A alegria incontida de um prato de arroz e feijão.
Fragmentos de tabaco no quarto do velho abandonado.
Existem tantos abismos por aí...
A nova novidade fadada ao próximo esquecimento.
A escuridão voluntária de olhos que não cegaram.
O prazer decorrente da próxima desgraça alheia.
O casal de psicopatas dançando tango nos escombros.
Existem tantos abismos por aí...
Os nomes bonitos que são indícios de mais miséria.
O passeio dos ratos sobre as prateleiras do mercado.
Uma sinfonia de moscas em cima do cachorro morto.
A descoberta científica da mais iminente tragédia.
Existem tantos abismos por aí...
O pano sujo que serviu de máscara na pandemia.
A gargalhada nefasta do bate-bola no carnaval.
O idiota que tatuou uma suástica em seu pescoço.
A modelo desfilando descalça nos cacos de vidro.
Existem tantos abismos por aí...
As maldades cínicas camufladas como fofocas.
A rotina às avessas dos pacientes hospitalizados.
O total abandono de quem ficou sozinho por aqui.
O influencer que ficou famoso por não fazer nada.
Existem tantos abismos por aí...
A coleta de lixo realizada com as mãos nuas.
O gago feliz fazendo mais um discurso na praça.
Um cigarro atrás do outro chamando a morte.
A alegria que foi confiscada ainda anteontem.
Existem tantos abismos por aí...
Um gole de vinho para as manhãs depauperadas.
Gastamos o nosso latim com superficialidades.
Livros de autoajuda para quem não quer ajuda.
Estamos comendo forçado aquilo que só temos asco.
Existem tantos abismos por aí... Tem sim...
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