Como muitas coisas foram
Isso foi há muito tempo,
Muito tempo mesmo,
Eu ainda não tinha vindo por aqui
Para poder chorar,
Mas papai contava...
Nos fins-de-semana na barbearia,
Vô Eusébio de pé fazendo pose
Enquanto lia seus sonetos
(Até papai conhecia essa palavra)
E vó Augusta chorando...
Foram das poucas vezes
Que meu pai, meus tios e tias
Não viam ela chorar de tristeza...
Ela não chorava pela vida difícil,
Não chorava da dificuldade
De criar tantos filhos,
Do cansaço de Fábrica de Tecidos Bangu,
Da dificuldade do dinheiro não dar pra nada
(O pouco dinheiro que vinha dela
Ia todo na cachaça dos porres
Que meu avô tinha com tio Zinho Hilário),
Não chorava da vida enfim...
Chorava de emoção,
De como eram bonitos aqueles versos,
De como uma alma conseguia alcançá-los,
Num tempo perdido de há muito tempo,
Onde as coisas eram tão difíceis...
A roda do tempo roda sem parar,
Hoje esse seu nome, um homem envelhecido,
Fica imaginando como eles seriam...
Devem ter sido muito bonitos,
Talvez neles continham viagens que nunca pude fazer,
Talvez esperanças que só nos versos existem...
Ficaram perdidos para sempre, o papel destruído,
A voz de quem os declamou, silenciada,
Mas para sempre presentes no infinito...
De certa forma, eu, esse poeta amargo,
Compreendo porque vó Augusta chorava...
(Extraído do livro "Muitos Dias Já Passaram" de autoria de Carlinhos de Almeida).
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