terça-feira, 24 de julho de 2018

Eu Sou O Próprio Mestre dos Meus Enganos

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Eu já perdi a noção do tempo. Por isso tenho todas as idades possíveis. Sou mais velho do que as pedras, mais novo que a última manchete dos jornais...
Não ralhe comigo, o menino arteiro só quer brincar entre as nuvens e galopar em bravios ventos que vêm lá das bandas do mar. Estou contente, olho minha caixa de brinquedos com a satisfação que só eu mesmo posso conhecer...
Deixem que siga meu caminho em paz. Os sapatos apertam os pés, a vida segue adiante e, mesmo assim, longe de mim ser apenas mais um burguês sem quaisquer pretensões loucas...
Não tenha pena de mim, o velho anda lentamente recontando as moedas da felicidade que se foi, sem angústia alguma, na obediência natural de todas as coisas. Velho marinheiro, vou navegando entre as ondas sem quaisquer temores...
Eu já perdi a noção de espaço. Não sei mais qual a minha velocidade. Se muito rápido vou até às estrelas lhes dar um beijo furtivo, se muito lento as conto e reconto delicadamente. Muitos caminhos vão até Roma, mas só um ao meu próprio coração...
Faço quase todas as insanidades que quiser, as escolho à dedo, rio nos momentos mais inoportunos, danço enquanto deveria permanecer imóvel, mas mesmo assim respeito o luto dos meus próprios dias...
Não sou afeito à todas as superstições, mas reverencio os símbolos do que está a minha volta como quem permanece de joelhos até não poder mais. A minha, as nossas vidas, são intermináveis pedidos que sobem os ares como os incensos mais suaves...
Deixem que continue a desenhar risonhos sóis na terra para que o tempo fique bom novamente. Eu amo todas as manhãs com a simplicidade dos que sofrem por excessiva ternura e dos sonâmbulos que andam pela escuridão sem mais algum temor...
Eu sou como o pássaro ferido que insiste em voar. Já quebrei os grilhões que me prendiam, abri a porta da gaiola e a verdade cegou-me com sua luz. Nada mais impede que os meus versos acordem os que andam pelas sombras...
Eu sou o próprio mestre dos meus enganos. Deixem que seja assim, é a vida...
(Extraído do livro "Muitos Dias Já Passaram" de autoria de Carlinhos de Almeida). 

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