É festa, minha amada, é festa!
As cruzes que sangram nossos ombros, pesam nossos pés, porque afinal todo o sacrifício foi em vão. Todos os planos falharam e as noites de sono que perdemos acabou dando em nada. Os dias estão sepultados em corretas fileiras, a maioria deles sem lápide alguma.
É festa, minha amada, é festa!
Vejamos o tempo passar sem podermos agarrá-lo pelos cabelos, pararmos ele à força. As rugas pulam sobre nós feito parasitas e mesmo sabendo quem somos, acabamos nos desconhecendo. Velhas fotos são papéis onde estranhos estão estampados com uma felicidade já terminada.
É festa, minha amada, é festa!
Não adianta reclamação alguma, nenhum gesto desesperado, nada podemos fazer. Nossos brinquedos estão empilhados num canto, a poeira cobre tudo e, afinal de contas, nós nem sabemos mais como se brinca com eles.
É festa, minha amada, é festa!
Continuamos maus como sempre, mesquinhos como sempre, indiferentes como fomos por toda nossa curta eternidade. Nosso maior carrasco - nós mesmos - continua afiando o machado para o dia da nossa execução. Todos os nossos erros continuam escritos de forma definitiva em nossas almas.
É festa, minha amada, é festa!
Toda vez que me refugio em minha caverna de tristeza, ouço as feras lá fora e seu rugido acaba sendo um convite para o próprio risco que é viver. Por incrível que pareça, sempre fui um grande covarde, mas sempre aceitei este desafio.
É festa, minha amada, é festa!
Bato a cara na parede e sangro, sou enganado voluntariamente, acreditando que alguma coisa poderia dar certo. Esqueço de propósito a nossa natureza humana e não é culpa sua ter me ferido o tempo todo.
É festa, minha amada, é festa!
Dissimule mais um pouco, esconda teu riso debochado atrás da compaixão que nunca existiu. Diga o impossível - que me ama. Afinal de contas, o que tenho eu para ser amado? Diga o insólito, o absurdo - que gosta dos meus reclamos e dos meus vícios e que quer viver sob a tempestade.
É festa, minha amada, é festa!...
(Para Renata Ramos de Souza, por um dia).
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