sábado, 9 de agosto de 2025

Fiquei Como Ficam Os Pássaros Sob O Temporal

É compreensível que existam tantos teatros por aí, principalmente agora. Nossos espelhos estão distorcidos como nunca estiveram e nossos olhos colaboram bem mais para isto. A apatia nos atingiu como uma faísca que não apenas fere, mas acaba cegando.

Comoções de um mundo mais insano, supremacia dos idiotas, capitalismo babando com o surto que ele mesmo provocou...

Peças de dominó que caem uma após a oura num espetáculo digno de qualquer esquecimento. Musas ao avesso nas redes sociais, heróis de nada, o talento saiu para tomar um café e não voltou. A piora do paciente acontece do jeito que o médico assim o quis...

Coleção de diferentes beijos em noites banalmente cheias de uma libido em que apenas faltava um pouco mais de tesão...

Para vivermos basta estarmos mortos. Silvícolas de paletó e gravata da melhor grife que o dinheiro pode pagar. Os palhaços com cara cruel correm atrás de nós e a única saída foi aquele beco sem saída. Mais uma, por favor.

Há muitos nomes agora quase que esquecidos, principalmente aquele que foi meu...

A nuvens cor-de-rosa agora estão mais do que acinzentadas. Os anjos surtaram e deram ataques de riso na nova comédia que é a velha guerra que teima de permanecer entre todos os homens. A inocência é agora um palheiro numa agulha.

Escuto a tristeza de um blues com alguns toques de um samba-canção que um poeta fez em sua embriaguez...

Tão bonita, tão feia, arte moderna de tons mais que milenares. Os tamanduás não comem mais formigas, sentem saudades de esquecidos formigueiros. Cada ideia há de falhar para que possa valer alguma coisa.

O milionário acabou de perder tudo e praticou haraquiri com sua escova de dentes importada...

Um radinho de pilhas sem pilhas de repente tocou. Todos os odores repugnantes agora fazem certo sentido. Batam as palmas mais efusivas para o começo de qualquer um fim.

Gosto por demais de todos os absurdos que podem ser servidos em meu pobre desjejum...

O corpo dela apodrece na gaveta enquanto todo choro agora seco foi substituído pela diversão que o nada pode proporcionar. O tanque do automóvel acaba explodindo. A cena de nudez da novela foi um prato vazio.

Muitas palmas, muitas mesmo, agora e sempre, agora e nunca, para os fantasiados com a sua nudez...

O catador de reciclagens tem mais trabalho do que possa imaginar. Cata o não que foi jogado fora, o que foi também jogado, o que nem existe para ser jogado. Agora os rios vêm vindo do mar.

Lanternas chinesas para noites russas onde cisnes imitam perfeitamente os rouxinóis...

O nó de Górdio, o cardiograma que trouxe preocupantes resultados. Você tem saúde de ferro e poderá estar enferrujado daqui uns meses porque mora bem na frente do mar.

O adolescente tem uma ejaculação involuntária toda vez que ganha uma partida de videogame...

Acabou a pressa do beija-flor e de agora em diante as flores que se virem sozinhas. É um enxame de abelhas mutantes que preferem flores de plástico ou de papel alumínio.

Em qualquer uma das vinte e cinco horas do dia mais um desesperado tenta beber de sua saliva...

O monge ascensionado  grita impropérios no boteco da esquina enquanto atrai os passantes. O preço das marmitas não é o mesmo do ano passado. E sempre temos dito. Maldito proprietário dono do sacolão do bairro.

As raízes secaram por conta da umidade excessiva de uma quinta estação desse ano de trezentos e sessenta e sete dias...

Onde estão meus óculos? Onde estão meus óculos? Sem eles me sinto como os pássaros sob esse temporal de chuva seca...


(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).

sexta-feira, 8 de agosto de 2025

Mandigaria


A vida engolida que nem cachaça...

Viver? É muito mais do que pirraça...


Dormir sem saber do acordar amanhã,

Acordar sem saber se poderá dormir,

Não saber onde logo mais estaremos,

Se estaremos aqui ou estaremos ali...


A vida mastigada feito pão dormido...

Viver? Sem cachorro no mato perdido...


Comer sem saber se tem mais comida,

Comer pensando num próximo prato,

É tudo daquele mesmo jeito de sempre,

O destino nos fazendo de gato e sapato...


A vida tomada feito um gole de café frio...

Nunca estive mais cheio de tanto vazio...


O sonho é mais um pesadelo agradável,

Sonhar é como final fingido desta novela,

O sonho do pobre é morar num barraco

Enquanto come seu pão com mortadela...


A vida quase igualzinho que nem corte...

O morto está vivo e o vivo quase na morte...


A vida parece até mandiga... Não parece?...


(Extraído do livro "Pane Na Casa das Máquinas" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Colibri Na Garganta

Tenho um colibri na garganta

suas asas são as milhares de palavras

que falei por esses muitos dias...


Há muitas borboletas em meus olhos

são o resultado mais que exato

de tantas pinturas que admirei...


Silêncios abundam nos ouvidos

como o discurso de minhas lágrimas

que fizeram esta máscara que levo...


Meus cabelos não são mais a noite

talvez algum cinza quieto de nuvens

mesmo que sejam tão raras...


Tenho um colibri na garganta

suas asas são as milhares de palavras

procurando por seus perdidos jardins...


(Extraído do livro "O Espelho de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Tatuagens Invisíveis

Tenho preguiça de quase tudo

Escrevo mais versos nas nuvens

Que em tímidos pedaços de papel...

Sou a sombra do que um dia fui

Este é o fato mais que inconteste

Assim como rochas embriagadas...

Caiu um cisco no olho do furacão

 E lágrimas são todas de Newton

Mesmo não sendo nunca a maçã...

Casas de marimbondos são simples

Mais do que todas nossas cidades

Onde todos se atacam mutuamente...

Garrafas de guaraná são quebradas

Para a confecção de novos tapetes

Para os faquires do tal pós-moderno...

É o maior de todos os tapas na cara

A fome que não só corrói o estômago

Mas de forma maior todas as almas...

Tenho mais preguiça ainda que antes

Com a lentidão apressada dos caracóis

Que esqueceram de registrar seu nome...

Faço de conta que o poço chamado vida

Não tenha a mesma profundidade usual

Daquilo que nós chamamos de medo...

Temos auroras boreais tão incolores

E oceanos insípidos de tão raras águas

Onde estrelas-do-mar agora filosofam...

Em terras por onde nunca vou passar

Temos sextas com semblante de segundas

Com pegadas de pés que nunca pisaram...

A menina feia agora sonha que não sonha

Enquanto os burgueses fumam seus havanas

Num chiqueiro de cobertura lá na Zona Sul...

Os leões comem placidamente suas saladas

Enquanto o vento insiste de soprar segredos

Como num jogo de bola com cortadas cabeças...

O mesmo slogan irritantemente é repetido

Enquanto o motorista fecha os seus olhos

Para beijar o primeiro poste do caminho...

Celebremos a mesma maldição já proferida

De uma tatuagem que se apaga aos poucos

Com a invisibilidade casual dos cegos...


(Extraído do livro "Pane Na Casa das Máquinas" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quinta-feira, 7 de agosto de 2025

Alguns Poemetos Sem Nome N° 354

Célebre desconhecido é o que sou...

Velho fazedor de esparsos versos,

Desesperado arquiteto de fantasias,

Vejo-me como fumaça em pleno ar...

Continuará à existir ou não mais?

Talvez lá em cima, num céu vazio,

Exista um lugar bem silencioso,

Para essas fumaças que subiram

E para versos antes nunca lidos...

Célebre desconhecido é o que sou...


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Ele colocou sua máscara e saiu por aí,

Assoviava canções mudas dentro do peito,

Caçava todas as borboletas imaginárias

De alguns jardins não mais existentes,

Olhava com ternura gatos no banho de sol,

Passarinhos em seu eterno malabarismo,

Cães de rua tristonhos (quase um deles)...


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Todo velho é o jovem que foi,

Todo jovem é a criança que era,

Toda criança foi no ventre da mãe

Algum sonho que um dia aconteceu,

Mesmo quando nem sonho foi...


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Parem de escrever versos alegres,

Isso acaba sendo uma maldade.

A alegria existe ou não existe?

Existir ela certamente existe sim,

Mas é tão rápida que ao repararmos

Já foi embora nas asas do tempo...


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Celebremos erguendo nossos copos:

Alguma ternura que sobrou no peito,

Algum gesto de carinho que faz até chorar,

Alguma flor que não escapou aos olhos,

Algum canto novo inventado por aí,

Aquele amor que foi e acabou voltando,

Uma crueldade que não deu certo,

Aquela bomba que caiu e não explodiu...


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Não há segredo nenhum em viver...

Vivamos das coisas mais simples...

Toda invenção tola acaba doendo.

A ternura brota em todos os cantos.

Para o carinho só basta a vontade.

Ser bom não necessita de regras.

O amor sabe pular todos os muros.

Para a alegria basta ser chamada.

Os sonhos reais possuem coragem.

O medo corre ao primeiro grito.

Só há segredos diversos para morrer.

Aproveitemos as coisas mais simples...


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Pretendo fazer algumas coisas

Antes de minha partida inevitável:

Sorrir de inevitável satisfação

Ante uma nova rosa na roseira,

Deixa um passarinho pousar em meu ombro

Para me mostrar seu novo canto,

Correr descalço em um riacho manso,

Contar estrelas até ficar cansado,

Andar sem medo pelas ruas co mundo,

Chegar em madrugadas inesperadas...

Quem sabe poderei ser até mais feliz?...

terça-feira, 5 de agosto de 2025

Poema de Pedra e Água

Poema de pedra e água é assim:

Eu por você e você por mim...


Na maior das comunhões,

Pulsam nossos corações

De vidro, cristal, diamante,

Pequenos, grandes, gigantes,

De agora e o que foi antes...


Poema de pedra e água é assim:

Qualquer quintal é jardim...


Na coragem dos soldados,

Os dias de braços dados,

Dias de todos os tamanhos,

Comuns e tão estranhos,

Negros, azuis, verdes, castanhos...


Poema de pedra e água é assim:

Tem começo e não tem fim...


Nas asas destes decaídos,

A viagem dos meus sentidos,

A febre mais que alta,

Como me faz falta,

Meu solo de flauta...


Poema de pedra e água é assim:

Eu em você e você em mim...


(Extraído do livro "O Espelho de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Alguns Poemetos Sem Nome N° 353

Sou do tempo das latas de biscoito,

Das caixinhas-surpresa de papel-cartão,

Das réstias de cebola e dos tamancos

Que se penduravam pelas vendas,

Do café torrado e moído na hora,

Do arroz pesado à gosto do freguês,

Programas preto-e-branco nas TVs,

Programas engraçados nos rádios,

Um tempo que era tão bom e ruim,

Que dá muita saudade e nenhuma...


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Paratudo

Paranada

Para pedidos feitos ao acaso

O que foi adiantado

O que teve atraso

O que foi a vida

Uma outra despedida


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Tento ver diariamente suas masturbações

num velho vídeo quase recente

que escondo entre as dobras do meu computador.

Não há medidor de alguma intensidade

mas valeu cada moeda que me custou.

Mar revolto na mais franca das calmas

neste bom dia que nunca me respondem...


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Minha dúvida é tão mais tímida

Que acaba se tornando temerária.

Sabe quem eu sou?

Se isso for algum dia descoberto

Por favor que eu seja comunicado

Esqueci isso faz um bom tempo.

Minha dúvida é tão mais tímida

Que até brincou de roleta-russa...


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Não avisem mais aos navegantes

Eles pararam para poderem ouvir

Um cravo que executa agora

Um rock quase pós-moderno...

Não avisem mais aos navegantes

Eles tentam agora sem esforço

Entender todas as novas palavras

De um velho idioma que inventaram...


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Num pequeno córrego de esperança

Segue meu barquinho de papel esperança

Mesmo batendo em pedras pelo caminho...

Muitas são minhas esquisitas crises

De esquecer até aquilo que não doeu...

Num singelo avião feito de papel

Consigo voar alguns metros quilométricos

Tentando alcançar alguma esperança por aí...


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Por mais que eu diga sim

O não me atrapalha e muito...

Por mais que eu queira tudo

O nada vem e tudo estraga...

O que quero agora 

Nesse exato momento?

Algumas asas vagabundas

E o fim do medo de voar...

Antagonia

Pássaros e vermes

Num banquete histriônico

De luz e escuridão.


Escolha a palavra com todo cuidado possível...


Velhos e moços

Numa batalha medieval

Em santas terras.


Silêncio para não acordar o delicado sonho...


Bons e malvados

Quem vai acender primeiro

Uma lenha molhada.


O paciente está convalescendo pela calçada...


Porões e sótãos

O mofo já vem depressinha

Nada é o impossível.


A mesma jornada sem começo e sem final...


(Extraído do livro "Pane Na Casa das Máquinas" de autoria de Carlinhos de Almeida).

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Meu Querido Peixe Podre

Meu querido peixe podre:

Que já foi água toda,

Foi graça nadando,

Escamas quase prata,

Agora náusea total

E nem chego perto,

Meus pêsames...


Meu querido tempo pobre:

Que já foi menos abjeto,

Mesmo só enganando,

Escondendo mazelas,

Não mostravas a bunda,

Ainda tendo merda,

Meus pêsames...


Meu querido sonho podre:

Foste de limpas nuvens,

Sorrisos aí sinceros,

Até que impossíveis,

Entretanto viciantes,

Secador de prantos,

Meus pêsames...


Meu querido amor podre:

Nem esse teu pus todo,

Nem essa casca disforme,

Carne viva e sofrível,

Não impedirá que pare,

Mexendo no machucado,

Meus pêsames...


Meu querido homem podre:

Distribuidor de desgraça,

Espalhador de mentira,

Apiedo-me de tua morte,

Da tua morbidez,

De onde permanecerás,

Meus pêsames...


Meus pêsames, meu querido, meus pêsames...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Tangonomango

Diferente e também tão igual...


A doce e salgada combinação

De calmos caos

Que foram e não são mais...


Adjacente e distância sideral...


De mãos dadas nós não iremos

Aos céus térreos

Que eram e são amnésios...


Pretendente e desprezo final...


Tenho pés que falam e tanto

Preguiças ágeis

Que serão e não bonitas...


Inocente e muito venal...


Corro numa tal imobilidade

Fogueiras e fontes

Que aguardam capataz...


Diferente e também tão igual...


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Mangueira Que Só Dá Coco

Masturbação feminina sob efeito de ferormônios.

O menino cheirou cola e morreu sobre o asfalto.

Mandar à merda é um elogio como qualquer outro.

Conheci um suíno viciado em comer só bacon.

Namoramos platonicamente uma nota de duzentos.

Escondi um elefante atrás de uma vara de bambu.

Deu meia-noite e o dia não estava nada claro.

Ainda bem que as aranhas não aprenderam a voar.

O peixe-boi estava com muita vergonha de mugir.

O faquir só comia em churrascaria com rodízio.

O desenho ficou animado por não ser esquecido.

Dispenso falar sobre este meu problema de fala.

Morar numa vila é quase o mesmo que na fila.

Só parei de ter dúvidas sobre as minhas dúvidas.

O pato é o instrutor de um curso de sapateado.

Tive tanta febre que a minha peruca incendiou.

Naquele pé de manga só deu coco até agora.


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Samba do Morcego Anão

 

Na barraca do Garibaldo Rose não bebe mais...

De agora em diante está inventado o Lenocard!

É uma grande iguaria bem da cintura pra baixo...

Vamos assistir o desenho do calça redonda?

A ave mais rara que existe é a nossa avestruz...

Se hoje der macaco eu juro que me cago todo!

Vamos experimentar um churrasco de sorvete?

Vamos rolar no caco de vidro de pura alegria...

Até o mudinho sabe bem o que dizer no pé!

Amendoim engraçado é o que conta piada?

Ela pelada parece um frango e de roupa dois...

A queijadinha no vatapá ficou maravilhosa!

Baleia que dá leite também tem par de chifres.

Quero morrer amarelo se comer melancia...

Gato só usa garfo em apresentação de balé?

Tem gente que só doa sangue dos seus cabelos.

O filósofo comia chicória escondido no mato.

São irmãos gêmeos de pais e mães diferentes.

Acarajé pobre é feijão e farinha frito na água.

Cuscuz só consegue matar por afogamento.

A velha e o velhaco estão muito bem obrigado!

Serafina adora fazer maquiagem com parafina.

Eu só vou no tororó se for de asa delta...

Fui no samba do morcego anão e voltei doido!...


(Extraído do livro "Maluqueci de Vez" de Carlinhos de Almeida).

domingo, 3 de agosto de 2025

Espinha de Peixe Com Macarrão

Ah, moleco cabra ruim duma porra!

Pensava que ia me enganar?

Hem? Hem? Hem?

Daqui uns duzentos anos talvez...

Quando a barata for mais barata

E Cristina Batata virar Narizinho!

Já xiripou hoje, carrim de feira?

Bebel tá quase no beleléu

De bunda de fora e de chapéu.

Juro pela mãe do guarda!

Me dá aí três-tostão

Pra eu comprar meu carvão?

Mim não mói, mim só rói.

Qualquer hora apareço no gesso

E vou mijar no teu endereço.

E isso é só o começo,

Quanto mais subo, eu desço.

Olha o rato de cuia! Olha o rato de cuia!

A lontra se casou? Casou sim...

Foi amanhã na semana passada.

Quero uma cachaça e uma empada!

Dei bobeira na vida inteira...

Qualquer dia saracoteio no Anil!

Taytay não escorrega mas cai.

Mexidinho é bom pra carilho,

Que diga o pai e também o filho.

Ninica entrou na bica

E o Lulu tomou no sul...

Seu Penaforte teve um desmaio

E me disseram que foi em maio!

Tacaram fogo na canjica

E nem esperaram o camarão!

Tem bambolê só pras nádegas...

O grelo dela parece uma janela?

Pelos poderes de porra nenhuma

Pra me cagar nem faço força...

Toma vintão aí logo

E me compre meio quilo de meleca.

E capricha, viu? Capricha!

E traz brigadeiro de vinagre!

Senão eu taco fogo no fogo, entendeu?

Em quarto de motel a coisa é medonha,

Lá só tem lençol e fronha...

Vamos comer espinha de peixe

Com bastante macarrão?

Dizem que é bão, muito bão...

Pensava que ia me enganar?

Hem? Hem? Hem?...


(Extraído do livro "Maluqueci de Vez" de Carlinhos de Almeida).

Serviçais Códigos

Código de muitas letras aleatórias

E alguns numerais para certo tempero.

Os artistas de rua não saem de casa

Medrosos com as assombrações vivas.

O motoboy me chamou no portão

E me trouxe uma moto e um boy.

Aqui estão todos os meus espinhos

Para poder confeccionar nova coroa.

Agora existem estradas de manteiga

Em que astecas jogam bolas de penas.

Mastiguei folhas azuis de Coca-Cola

Até meus dentes pularem de alegria.

Tenho uma estranha alergia à lactose

Sobretudo as que as pedras produzem.

Num palheiro sem uma agulha sequer

Alguns versículos banais de Hollywood.

Vou fazer o funeral para este valentão

Habitante desta pocilga chamada cidade.

É claro que hoje tem sempre marmelada

Mesmo faltando a peneira para a água.

Meus cartões são hábeis bolinadores

Quando seu olfato funciona casualmente.

As vítimas da chacina foram protestar

Da falta de habilidade do falso sniper.

Temos sempre macarrão instantâneo

Para todas as vis paixões instantâneas.

A vida é sempre o maior dos fardos

Principalmente aqueles de capim.

Agora temos coleiras para águas-vivas

E pedágios para os torpes pensamentos.

Estarei gentilmente mascando a água

Que o dromedário me trouxe da aldeia.

Nesta comédia que chamamos Idade Média

Foi detectada mais de uma tragédia.

Cada palavra tem seu gosto tão específico

Assim como as impressões digitais eólicas.

Vamos compor mais um desses sambas-enredo

Cuja temática será correr perigo sem tê-lo...


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Observações Épicas de Um Velho Pobre Que Foi Comprar Pão Um Dia Desses

Vento malvado! Quase que me derruba na rua...

Num gesto como quem mergulha em todas as águas

Iria provar ou a poeira de alguma calçada dessas...

Ou talvez uma folha morta ou um fragmento desta

Ou ainda algum papel de bala que fugiu do doce...


Alguns metros para mim são muitos quilômetros...

Respiro com certa dificuldade com pulmões cansados

Mais cansados com o tempo do que com cigarros...

Vejo algumas pessoas e acabo vendo o mundo todo

Aqui estão todas elas em uma criptografia rara...


Que falta me faz tivesse pelo menos um par de asas...

Esses intermináveis minutos se tornariam segundos

E eu não precisaria dar mais bons-dias ignorados...

Há muitos sons (cacofonia) aos meus pobres ouvidos

Como quem acorda com uma sinfonia inesperada...


Finalmente alçar os dois degraus que nos separam...

Até os cheiros bons acabam uma hora enjoativos

E os do que fabricam ali não escapa a esta regra...

A bela novinha com sua bunda tão convidativa

Quase não escuta o pedido sem voz de dois reais...


Mais uma jornada quase fenomenal voltar pra casa...

Malditos sejam estes bons filhos da puta daqui mesmo

Que fizeram esse Himalaia de quebra-molas na rua...

Coloco com uma certa dificuldade característica

A chave no meu portão que o tempo comeu a tinta...


Alguém precisa tirar esse mato aqui da calçada...

Meu casal de cães abanam o rabo de talvez alegria

No meio desta selva Amazônica que chamo quintal...

Passo suavemente pela varanda já meio suja

E sento em frente ao PC pra ver um pouco lá fora...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Infinitamente Finita

Teu dedo apontado - acusação

Sou um pobre coitado - ou não...


A drogada foi estudar

O motivo sem explicar

Quero rir feito cativo

Talvez ainda esteja vivo...


Tenho fome - não quero comer

Tenho sede - nem quero beber...


A puta foi me amar

O motivo sem explicar

Esse sonho é tão nocivo

Talvez ainda esteja festivo...


Tenho pressa - vou ficar parado

Tenho dúvida - antes fosse perguntado...


(Extraído do livro "O Espelho de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Domingo Sem Parque

É pelo meio. Bonito e feio. São sem razão.

De onde veio. Sem ter receio. Desta escuridão.

Não tem parque em domingo algum.

Eu era tudo e todos e virei nenhum...


É mais um raio. Logo desmaio. Sem explicação.

De onde eu saio. Eu quase caio. E beijo o chão.

Não tem jardim em nenhum quintal.

Foi quase anteontem nosso carnaval...


É mais um canto. Logo entanto. Sem moderação.

De onde acalanto. Quase um santo. É a explosão.

Acabou essa conversa fiada.

Esse nosso domingo virou um nada...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

O Restante do Resto do Restante

Instantes de viola foram apagados como giz.

Eu faço minhas tocaias como quem masca chicles.

A sopa está no fundo do prato e lá permanecerá.

Os cães raivosos dormem tão placidamente.

Fiz um amuleto de cristal com fios de palha.

Saquei minha arma mas não havia munição.

Na sessão da tarde os mocinhos usam batom.

Os gatos agora são pescadores de ilusões.

Pulei o muro e caí no caldeirão do inferno.

Degolei-me como o gorila no clássico mudo.

Quanto mais coloco sal os doces se adoçam.

Me vesti de vermelho como fosse um pássaro azul.

Não esquecerei mais daquilo que nunca mais vi.

Domingos são terças que esqueceram seu cantil.

Coloquei os grilos na gaveta antes da ventania.

Uma agulha sem ponta para bordados sem volta.

Nada é tão estranho que não possa ser comum.

Faço um novo vocabulário com os restos existentes.

Uma sacola de serpentes é tudo que nós temos.

As senzalas estão agora dentro das casas grandes.

Podem dar um café ali para quem foi condenado.

Achei vários e variados batons nas latas de lixo.

O Conselho nunca mais me pediu um conselho...


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Sem Legendas

Pois é, meu amor...

A vida é um filme sem legendas

Num idioma que não entendemos...

Cada surpresa é mais um perigo

Que nos espera na esquina...


Pois é, minha linda...

Amanhã você será uma outra,

Mais velha e com mais rugas...

Você terá mais medos do espelho

Porque espelhos nunca mentem...


Pois é minha bela...

Seu dia, nosso dia chegará,

Todo final acaba começando...

É o destino é feito um rio

E ninguém vai poder pará-lo...


Pois é, meu amor...

E mesmo se as legendas existissem

Seria impossível lê-las pela rapidez...

Cada segundo é que nem beija-flor

Não vemos nem suas asas...


(Extraído do livro "O Espelho de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida). 

sábado, 2 de agosto de 2025

Tudo Aquilo Que Voa

A ave que inspirou Poe em noites solitárias

O pombo sem ter asas que o menino jogou

Cobardes bombas se atirando de altos céus

E a minha imaginação pelo ar sempre...


O habitante de tristes mares que morre cego

Aquele que me dava medo em antigas noites

E o voo rasante e certeiro pelas escuridões

E a minha imaginação pelo ar sempre...


A minha aventura que cortou o Atlântico

O carcará na voz do mais triste dos poetas

Versos imortais do nosso Assaré de Patativa

E a minha imaginação pelo ar sempre...


Procura do sangue desavisado dos pescoços

Colorido quebrando o verde maior de jardins

Cantiga que não se importa com a tragédia diária

E a minha imaginação pelo ar sempre...


Asas que desconheço se algum dia eu terei

Que nem Ícaro quando a cera vai derreter

Mesmo assim o sol também me atrai sempre

E a minha imaginação pelo ar sempre...

Pelo ar sempre... Pelo ar sempre... Pelo ar...


(Extraído do livro "O Espelho de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Atravessia

Quem primeiro irá embora sou eu,

Pela lógica natural do que existe,

Num desses meses que fazem o ano,

Não irei nem alegre e nem triste...


Talvez vá rindo, talvez vá chorando,

Não sei se parado ou caminhando...

Seria melhor ir de forma natural,

Ir dormindo ou ainda no carnaval...

Olhem lá, aquele folião sou eu!

Que deu um último suspiro e morreu...

Em que horário? Isso pouco importa...

Morrer é como passar por uma porta,

O tempo ensinou que não há ilusão,

E inevitável, ainda continuando ou não...


Quem primeiro irá embora sou eu,

Pela lógica natural do que existe,

Num desses meses que fazem o ano,

Não irei nem alegre e nem triste...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Fiquei Como Ficam Os Pássaros Sob O Temporal

É compreensível que existam tantos teatros por aí, principalmente agora. Nossos espelhos estão distorcidos como nunca estiveram e nossos olh...