sábado, 20 de outubro de 2018

Ao Menino

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Ao menino que eu fui, ao menino que eu era um dia, eis aqui o meu total agradecimento. Não foste o mais feliz entre todos, pelo contrário, foste talvez um dos mais tristes que já conheci por esse mundo à fora, mas eu sempre te amei.
Amei teus risos sinceros pelas manhãs, eles eram mais fortes do que os teus choros pelas noites de insônia ou de pesadelos. Amei contigo teus amores impossíveis que foram e não voltarão jamais, amores que faziam queimar o peito e que teus olhos te traíam.
O meu agradecimento, ao menino que tinha medo de escadas e das alturas, mas que sonhava sempre em poder voar. O mesmo menino que olhava com todo o prazer do mundo as casas vistas lá de cima quando podia passear de roda-gigante.
Eram felizes dias de carnaval aqueles e ainda lembro do teu rosto pintado com as cores do palhaço que te acompanhou por toda a tua existência. Eram ruas cheias de barro que o teu contentamento transformava em coisas bonitas mesmo naqueles dias de frio e de chuva.
Ao menino que eu fui, ao menino que eu era um dia, eis aqui o meu total agradecimento. Não foste o mais belo entre todos, mas carregavas nos teus olhos, já naquele tempo, todos os meus sonhos que acabei vendo morrer um à um.
Brinquei contigo naquelas tardes solitárias em que enfileiravas teus pobres brinquedos e vi neles todo o encanto do mundo. Fui teu parceiro de pequenas e inocentes aventuras e contigo desenhei os sóis risonhos no chão do quintal pedindo tempos melhores. 
Chorei contigo pelos que amávamos e que um dia partiram e com o mesmo medo olhei os brancos jazigos porque desconhecíamos o inevitável caminho da morte.
Muito obrigado por teres me compreendido, aceitado as minhas queixas, perdoado a maioria dos meus erros, ter comemorado junto os poucos acertos que a vida nos oferta.  Obrigado, obrigado de todo o coração.
Meu confidente, meu cúmplice, meu mestre, a tua antiga inocência valia mais do que todas as moedas que carreguei nos bolsos; as tuas fantasias são ornadas de todas as cores do mundo.
Tu me ensinaste à fazer os versos que ainda me mantêm vivo, me apontaste onde as nuvens dormem e as estrelas brincam, e isso, nunca poderei te pagar.
Ao menino que eu fui, ao menino que eu era um dia, eis aqui o meu total agradecimento...

(Extraído do livro "Muitos Dias Já Passaram" de autoria de Carlinhos de Almeida).

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