- Essa será a primeira última vez! - disse ela imperativa em nossas tardes escondidas...
- Jura? - perguntei como quem pergunta as horas ao carrasco...
- Poderei voar? - continuei insistindo em minhas eternas perguntas.
- Depende... - respondeu ela com um sorriso de canto de olho - depende só você. Com qual asa?
- Com o par que eu guardei. Aquele mesmo de um tal beijo que não dei, mas que ainda sinto o gosto...
(Final de cena...)
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O menino tinha mania de muitas águas. Muitas mesmo. Quase todas elas. As salgadas daquele mar que um dia quase lhe afogou. Dos rios que brincaram com ele. E dos lagos que ficaram imóveis tipo um monge meditando sob as folhas. E as das nuvens brincando num espaço infinito. Águas, muitas delas, de todo e qualquer tipo. Até daquele poço que gravou a infância. E, finalmente, daquelas que desceram dos olhos pelo rosto. Mania de muitas águas...
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Um estalo com as pontas dos dois dedos - o médio e o polegar! Um segundo tímido e rápido no cronômetro! O segundo cismou e cresceu até que virou minuto. E os minutos acabaram dançando esta tal dança das horas. E pintaram a cara dos dias! Dos dias, pobres dias que acabaram vindo e indo. Sóis! Luas! E tudo e mais um pouco. Até os anos, pesadões, mas passageiros também. E pensar que tudo começou num simples estalo de dedos...
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Tenho como fiéis companheiras estas noites insones. Em que minha rotina se resume em simples palavras - quarto, cozinha, banheiro. E as palavras de um solitário para as nuvens de um quase milagre meio estranho. Cada tecla apertada uma pincelada de um pintor que não usa cores. Sim, os poetas são apenas pintores, eles esqueceram suas tintas e agora usam palavras...
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As pedras falam mais que os homens. Sua voz permanece num tempo bem maior que qualquer vida. As notas das canções são maiores que os discursos. Nem sempre conseguimos falar o que sentimos, elas conseguem sempre. Os sonhos conseguem voar mais do que os pássaros, pássaros se cansam e têm que pousar, sonhos não, são donos dos céus...
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Tenho pelo menos uma ilusão diante meus olhos. O trem não partiu da estação, esta não existia. O barco não navegou para fora do cais, o cais dorme sempre e por isso não há partidas. A estrada permanece no mesmo lugar, sua poeira é bem mais que eterna. Só o coração nosso parte e parte sempre e nunca volta...
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Todo dia vai nascer. Com seus passos tímidos de atrevimento. Com seus vultos que andam para as fábricas. Para uma urbanidade que além de tosca, é malvada. Todo dia vai passar. Os dias são formiguinhas andando em carreira. Não carregam folhas para o formigueiro, cansam-se pelos capitalistas. Todo dia irá morrer. Será apenas mais um dia lembrado no velho calendário.
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