quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Quaestio I

E por que o mundo parará de girar

Só porque nossos dias cessaram

No ciclo natural e trágico de vida?


E por que nossos mais pobres sonhos

Pararão de flutuar entre as nuvens

Só porque os planos acabaram falhando?


As palavras escritas nas paredes

Acabaram caindo definitivamente

Como as folhas que perdem a cor...


E por que nossos olhos se fecharão

Já que o amor acabou indo embora

Por causa da ingratidão do outro?


E por que o sangue parou de correr

Nesses rios que chamávamos veias

E agora são apenas estradas de poeira?


Os carnavais acabaram de terminar

E talvez num próximo ano seguinte

Seremos mais os donos da folia...


(Extraído do livro "O Espelho de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Na Cara

Amanhã é Halloween

Amanhã é Hallogreen

Amanhã é Halloteen


Faça o favor de não fazer favor nenhum

Só poderá rir quem perdeu seus dentes

Na forca só há alguns corpos pendentes

Só farei meu discurso se ficar bebum...


Amanhã é Nutella

Amanhã é Nuvela

Amanhã é Nucela


Vamos comer cacos de vidro de montão

No meu funeral que venham todos parentes

É a tristeza que nos faz todos tão contentes

Até no berçário estão fazendo extrema-unção...


Amanhã é Cacareco

Amanhã é Cacaneco

Amanhã é Cacateco


Nada melhor do que angu com goiabada

Rafael tem lá suas dívidas todas pendentes

Pobres milionários estão todos carentes

No seu aniversário ganhe uma pedrada...


Amanhã é Fast-food

Amanhã é Fast-nude

Amanhã é Fast-grude


Queda de braço só se for com marimbondo

Os drinques são agora com os gelos quentes

As minhas veias estão todas tão dormentes

O mundo é quadrado nunca será redondo...


Amanhã é Pasmaceira

Amanhã é Pasmaneira

Amanhã é Pasmabeira


Os arenques agora são todos eles de araque

Estão faltando todas as peças sobressalentes

Não passamos de um bando de indigentes

Toda vez que penso acabo tendo um baque...


Amanhã é Amendoim

Amanhã é Amendofim

Amanhã é Amendosim


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida). 

Pulagens ou Necessidades Desnecessárias

Arroz sem gosto de arroz.

O bem. O zen. O além.

A trela. A cela. A bela.

O gato. O mato. O fato.

Propaganda nova de velharia.

O milho. O filho. O brilho.

A ventania. A picardia. A putaria.

O banquete. O falsete. O joguete.

Fila de pulos para o abismo.

A rã. O afã. A van.

O estepe. O estrepe. O esquete.

O elétrico. O estético. O métrico.

Quem morrer verá.

O luxo. O bruxo. O tucho.

O bicho. O lixo. O nicho.

A mão. O chão. O vão.

Linda com dentes podres.

A esfinge. A laringe. O atinge.

O Nilo. O filo. O quilo.

O pente. O dente. A gente.

Roupas quentes para o verão.

O norte. A sorte. O porte.

A venda. A fenda. A fazenda.

O acerto. O concerto. O enxerto.

Sapatos gastos para novos pés.

A ajuda. A miúda. O deus-acuda.

O condomínio. O extermínio. O patrocínio.

A distância. A ganância. A estância.

Eu faço torres de papel sob encomenda.

A narina. A quina. A esquina.

A pandemia. A boemia. A putaria.

O palo. O galo. O falo.

O famoso se desnudará em público.

O estrangeiro. O derradeiro. O dinheiro.

A puta. A luta. A cicuta.

A cicatriz. A felatriz. A matriz.

Soltaram uma granada em Granada.

O otário. O operário. O mandatário.

A ereção. A exceção. A excitação.

O biscoito. O coito. O afoito.

O mangangá pousou na nossa testa.

O famoso. O seboso. O gostoso.

A faísca. A isca. A bisca.

O marafo. O bafo. O sarrafo.

Vamos tirar as nossas melecas.

O milhar. O olhar. O bilhar.

A figa. O diga. A catinga.

O social. O fenomenal. O vendaval.

O necessário mais desnecessário...


(Extraído do livro "Palavras Modernas" de autoria de Carlinhos de Almeida).

terça-feira, 29 de outubro de 2024

Alguns Poemetos Sem Nome N° 314

 

Você que é aplaudido

Eu quem sou esquecido

Você que é ovacionado

Eu quem sou desprezado

Ambos morreremos

E talvez o esquecimento

Lhe consuma também...


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Ela dançou naquele boteco sujo

Ele riu e socou a mesa sem motivos

Eles esqueceram a tristeza que tinham

Ambos não lembravam serem miseráveis

E se estavam por algo no mundo não sabiam

Ela tinha um encontro com a morte

Ele também e ambos não sabiam o horário

É melhor desse jeito mesmo

Abismos não possuem nem nome...


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Cem versos

Insuficiência crônica

Necessidade vital

Febre constante

Ar que respiro

Falta de aplausos

Sem versos...


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Aqueles passos que eu dei

Não sei se deram em nada

Ou se percorreram todas as terras...

Aqueles sonhos que sonhei

Acabaram não se realizando

Mas preencheram minha alma...

Todas aquelas febres que tive

Não sei se foram de vez curadas

Mas me ajudaram a voar e muito...


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Quero esquecer que fui esquecido

Pelo mais puro dos esquecimentos...

Quero poder rir sempre e sempre

Mesmo não achando graça mais...

Quero abusar do que é proibido

Mesmo que não haja tempo pra isso...

Quero continuar com a ternura

Mesmo que alguém vire o rosto...


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Soldados marcham em fileiras

Para uma guerra que não pediram

Para trazer a morte que não querem

Para ganhar aquilo que não terão

Para combater o que não conhecem

Para serem maus como não são

Soldados marcham em fileiras

Para caírem no chão como moscas...


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O meu cansaço é meio que parecido

Com o do vira-latas que abana o rabo

Nem sempre esse cão tem o que comer

Nem sempre as pessoas lhe tratam bem

Mas todas as ruas são mais suas

Do que de todos os homens do mundo

Está livre mesmo não podendo voar

Não tem horários para poder cumprir

E quando morrer não levará culpa alguma...

segunda-feira, 28 de outubro de 2024

Miséria Aos Miseráveis

Nada tenho à declarar

Os dias devoram a si mesmos

Só uivarei para a lua...


Tempestade...


Essa serenidade assusta

É como uma novela barata

Sem ter um final feliz...


Multidão...


Uma sinfonia de estômagos

Todos eles tão vazios

Como a velha geladeira...


Assassinato...


O banheiro velho e sujo

Profundidade de poço seco

Horda de bárbaros famintos


Ventania...


Cate os restos desta ilusão

Coma-os com todo o prazer

Só não vá vomitá-los...


Poeirada...


Espadas invisíveis para o ar

Balas de canhão para bocas

Tragédias para quem quer...


Tocaia...


Matar sem usar armas

Com mil suaves prestações

Eis a meta dos malvados...


Inestética...


A velha música repetida

A fome destaque de escola

Encostem ali no paredão...


Miséria...


Fora de nossos livros

Nas camas das sarjetas

O que dão aos miseráveis...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

domingo, 27 de outubro de 2024

Eu Acho Que Nem Existo...

Aquele gosto que não senti,

Aquela fruta que não provei,

Aquele sonho que desisti,

Aquele beijo que não lhe dei...


Minha saudade tão exagerada,

Saudade de tudo, saudade de nada...


O espaço que não ando,

A altura que eu não voo,

O ar que está sufocando,

O que não como me dá enjoo...


Minha sorte tão desesperada,

A vida é um jogo, carta marcada...


Aquilo que me roubaram,

Aquilo que não mereci,

Chuvas fortes que molharam,

Noites frias que tremi...


A poesia rude nunca antes olhada,

A fera está solta e a arena lotada...


Aquele gosto que não senti,

Aquela prazer que não sentirei,

Aquele dia que então morri,

Aqueles olhos que não olhei...


Existir é apenas uma ilusão criada,

Eu acho que não existo e mais nada...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida)


 

Impreciso (Sem Dublagem e Sem Legendas)


Mundo que é só mundo pelo nome...

Mundo de injustiças, miséria e fome...

De poucos muitos e de muitos nadas...

De erros fatais e de balas disparadas...

Amores declarados e nunca amores...

Vinhetas legais um circo de horrores...

Não ver com nitidez é como fuga...

Esconder a palidez sob uma ruga...

Esconder o furacão sob a serenidade...

Somos os donos menos da vontade...

O louco nada vê e assim esbraveja...

E o miserável une moedas para cerveja...

A top model desfila manca na passarela...

Não tem cor e a raça é indefinida...

E nós nem sabemos se é morte ou vida...

Rua que é rua porque só passa gente...

Tudo bem e o médico também está doente...

Ele só fala se for numa língua estranha...

Agora comer também é uma façanha...

Uns te negam e outros ainda te devoram...

Uns apenas te enxergam e outros te ignoram...

Mundo que é só mundo pelo nome...

Mundo de injustiças, miséria e fome...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida). 

sábado, 26 de outubro de 2024

Desesperate

Eu sou filho do tempo,

do tempo perdido,

do tempo acabado,

me seguir não faz sentido

pois estou - desesperado.


Eu sou produto do meio,

só tenho pressa,

só tenho culpa

e toda minha conversa

é apenas - desculpa.


Eu sou a próxima vítima,

deste sistema,

da maldade do banco, 

quem dera o poema

fosse apenas - cheque em branco.


Eu sou um morador,

dos corredores

deste prédio gigante,

senti todas as dores

em apenas um  - instante.


Eu sou escravo da moda,

acabo ficando feio,

penso que estou bonito,

o carro está sem freio

e eu só dou - um grito.


Eu sou filho do tempo,

do tempo perdido,

do tempo achado,

me seguir não faz sentido

pois estou - desesperado.


(Extraído do livro "Pane na Casa das Máquinas" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quarta-feira, 23 de outubro de 2024

Alguns Poemetos Sem Nome N° 313

 

- Essa será a primeira última vez! - disse ela imperativa em nossas tardes escondidas...

- Jura? - perguntei como quem pergunta as horas ao carrasco...

- Poderei voar? - continuei insistindo em minhas eternas perguntas.

- Depende... - respondeu ela com um sorriso de canto de olho - depende só você. Com qual asa?

- Com o par que eu guardei. Aquele mesmo de um tal beijo que não dei, mas que ainda sinto o gosto...

(Final de cena...)


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O menino tinha mania de muitas águas. Muitas mesmo. Quase todas elas. As salgadas daquele mar que um dia quase lhe afogou. Dos rios que brincaram com ele. E dos lagos que ficaram imóveis tipo um monge meditando sob as folhas. E as das nuvens brincando num espaço infinito. Águas, muitas delas, de todo e qualquer tipo. Até daquele poço que gravou a infância. E, finalmente, daquelas que desceram dos olhos pelo rosto. Mania de muitas águas...


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Um estalo com as pontas dos dois dedos - o médio e o polegar! Um segundo tímido e rápido no cronômetro! O segundo cismou e cresceu até que virou minuto. E os minutos acabaram dançando esta tal dança das horas. E pintaram a cara dos dias! Dos dias, pobres dias que acabaram vindo e indo. Sóis! Luas! E tudo e mais um pouco. Até os anos, pesadões, mas passageiros também. E pensar que tudo começou num simples estalo de dedos...


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Tenho como fiéis companheiras estas noites insones. Em que minha rotina se resume em simples palavras - quarto, cozinha, banheiro. E as palavras de um solitário para as nuvens de um quase milagre meio estranho. Cada tecla apertada uma pincelada de um pintor que não usa cores. Sim, os poetas são apenas pintores, eles esqueceram suas tintas e agora usam palavras...


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As pedras falam mais que os homens. Sua voz permanece num tempo bem maior que qualquer vida. As notas das canções são maiores que os discursos. Nem sempre conseguimos falar o que sentimos, elas conseguem sempre. Os sonhos conseguem voar mais do que os pássaros, pássaros se cansam e têm que pousar, sonhos não, são donos dos céus...


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Tenho pelo menos uma ilusão diante meus olhos. O trem não partiu da estação, esta não existia. O barco não navegou para fora do cais, o cais dorme sempre e por isso não há partidas. A estrada permanece no mesmo lugar, sua poeira é bem mais que eterna. Só o coração nosso parte e parte sempre e nunca volta...


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Todo dia vai nascer. Com seus passos tímidos de atrevimento. Com seus vultos que andam para as fábricas. Para uma urbanidade que além de tosca, é malvada. Todo dia vai passar. Os dias são formiguinhas andando em carreira. Não carregam folhas para o formigueiro, cansam-se pelos capitalistas. Todo dia irá morrer. Será apenas mais um dia lembrado no velho calendário.

terça-feira, 22 de outubro de 2024

Alguns Poemetos Sem Nome N° 312


Uma pausa para o café. Uma pausa para respirar. Não me importando se o dia está chuvoso. Ou se pode melhorar. Uma pausa para essa vida. Mesmo que uma outra não há. A vida sempre nos ensina. Mas a morte vai ensinar. Uma pausa para a corrida. Uma pausa para nos ninar. Eu tenho muitas lembranças. Nem todas posso lembrar. Nem todas me fariam rir. Mas nem todas fazem chorar. Uma pausa para ficar parado. Outra pausa para ir voar. Mesmo não tendo nada no mundo. Acho que herdei o mar. Uma pausa para o café. Uma pausa para respirar...


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Toda dor tem um propósito, a alegria não. Toda dor segue uma direção, a alegria tem todas elas. A dor às vezes consegue voar, a alegria é as asas de quem a tem. A dor pode ser terna ou bruta (isso depende), a alegria tem a ternura como sua própria natureza. Os carinhos da dor são breves, os da alegria mesmo quando breves, são inesquecíveis. A dor é suportada, a alegria todos pedem bis. A dor geralmente causa silêncio, a alegria é aplaudida de pé. Toda dor tem um propósito, a alegria é caminho que nem percebemos, mas é...


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Eu viajei, viajei sim, por todos os países do mundo, não saindo do lugar. Todas as casas que morei, foram castelos. Todos os corredores lembraram-me romances policiais. Os quintais traziam maravilhas e medos também. Em algumas eu ri, o choro me visitou em todas elas. Da primeira até a última, cresci e envelheci, aqui estou. Deverei ter uma última morada, mas agora não importa. Eu viajei, viajei sim, vejam só como estou cansado e com asas gastas...


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Não critico, isso não é a minha tarefa. Mas mesmo assim a memória funciona. Encontrei a maldade na maioria dos meus dias. Loucuras sem motivo algum. Não posso negar. Mas a maioria das tempestades acabaram indo embora. A morte cuidou de muitos dos malvados que encontrei pelo caminho. A terra comeu todos eles. Mas uma coisa não posso esquecer, mesmo que a amnésia tome conta da pobre mente me aposse de repente. É da maldade dos jovens. É um grande engano dizer que ela não existe, ela sempre existe. E isso não muda em nada o que todo mundo tenta ser hoje...


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O barulho do vidro quebrando é mais do que um simples barulho. É uma lição de suma importância. Nós também somos de vidro. O vidro colorido que reflete luz. O vidro que se transforma em arte seja ela qual for. O que resiste ao frio fechando a janela. O para nós mesmos em nossos monólogos de confissão. Nós também somos de vidro. Só que um vidro que além de quebrar, também apodrece...


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O tudo é a véspera do nada. O contente, a véspera do triste. O são, a véspera do doente. O acompanhado, o só daqui há pouco. O amado será o desamado. O valente será o covarde. O sensato vai ser o mais louco. Tudo muda, tudo se transforma, só o sonho, esse teimoso, permanece sempre...


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A janela do meu quarto é o mundo. Ela tem um abismo de poucos centímetros do qual me debruço. A rua é um palco onde variadas peças são encenadas sempre. Onde cães e gatos mostram alegria, homens não. A janela do meu quarto são meus olhos, onde utilizo do silêncio para o tempo passar...    

domingo, 20 de outubro de 2024

O Espelho de Narciso

Narciso tem um espelho

Ou o espelho tem um Narciso?


Todo vidro é perigoso,

Caindo o espelho é quebrado

E seus cacos pontiagudos

Ferirão nossos dedos...


A vida nos trai

Ou nós é que nos traímos?


O tempo nunca falou

Que ele nos seria propício

E nem a morte nos enganou

Qual seria seu objetivo...


As rugas pedem licença

Ou já teriam ingressos comprados?


Estamos com pés descalços

Mesmo achando que calçados

As marcas do caminho sempre

Sangram e sangrarão nossos pés...


Até o amor se cansou 

Ou nossos olhos que não viram?


Não há mais coelhos na cartola

Nem rodas de fogo para atravessar,

A luzes do circo se apagaram

E a plateia não bate mais palmas...


A felicidade é uma mentira inocente

Ou uma lâmina que corta sem ferir?

E nem me preocupa mais,

O meu já se quebrou faz tempo...


Narciso tem um espelho

Ou o espelho tem um Narciso?


(Extraído do livro "O Espelho de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

Terra Tremeu, Gigante, Terra Tremeu

Terra tremeu, Gigante, terra tremeu...

E faltaram ossos para o meu ofício, isso faltaram...

O amor me faz engasgar feito a ração...

Que meu cão teve pressa de engolir...

Terra tremeu, Gigante, terra tremeu...

Como o improviso que tinha de fazer, que não fiz...

Eu subi no palanque pensando no discurso...

Mas acabou que deu em nada, eu não sei nada...

Terra tremeu, Gigante, terra tremeu...

Queimei meu dedo com a ponta, queimei mesmo...

O óbvio já foi um dia, hoje não é mais não...

É tipo um tal de ferro que foi transpassado...

Terra tremeu, Gigante, terra tremeu...

Todo dia acaba tendo uma feira, acaba tendo...

Misturam-se todas as nossas necessidades vitais...

E um pouco de loucura, não pode faltar tempero...

Terra tremeu, Gigante, terra tremeu...

Tenho mais eternas dúvidas se estou aqui ou ali...

A vida é mais um contrato de risco firmado...

Para criança brinquedo não tem tempo algum...

Terra tremeu, Gigante, terra tremeu...

Quanto mais a vista diminui, mais eu enxergo...

A hora faz o espaço, mas o espaço não faz hora...

Não existem surpresas dentro do sanduíche...

Terra tremeu, Gigante, terra tremeu...


(Extraído de "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quinta-feira, 17 de outubro de 2024

Tem, Mas Acabou...

Tem amor, 

mas acabou o sonho...

Tem ternura,

mas acabou o carinho...

Tem ensejo, 

mas acabou a coragem...

Tem desejo, 

mas acabou o tesão...


Resta um pouco de tempo,

mas a palavra de ordem é não...


Tem calor,

mas acabou a chama...

Tem estrelas,

mas acabou a noite...

Tem nuvens,

mas acabaram as asas...

Tem canção,

mas acabou a voz...


Eu agora quero virar para a parede,

pois o meu sono logo irá chegar...


Tem caminho,

mas acabou o ânimo...

Tem argumento,

mas acabou a verdade...

Tem crime,

mas acabou o castigo...

Tem mistério,

mas acabou o enigma...


Poderia fazer muitas e muitas perguntas,

mas não quero ouvir nenhuma resposta...


Tem amor, 

mas acabou o sonho...

Tem ternura,

mas acabou o carinho...

Tem ensejo, 

mas acabou a coragem...

Tem desejo, 

mas acabou a paixão...


(Extraído do livro "Muitos Dias Já Passaram" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Alguns Poemetos Sem Nome N° 311

Bocas não possuem olhos

Bocas não enxergam

Quando muito são míopes...

Bocas não são calmas

Não são serenas

Estão sempre ávidas

De beijos de outras

Ou de outros lugares alheios...

Algumas têm muita fome

Outras muita sede 

E outras mascam chicles fatais...


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Garras de pantera

Olhos gateados de lince

Frescor de chuva

Cheiro de creme rinse

Sonho de Dali

Madona de Da Vince

Quem dera a quimera

Que você existisse...


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Eu me encantei

Mas não foi com as estrelas

Eram muitas e não poderia contá-las

Também não foi com os pirilampos

Minha alma iria se distrair 

Como o bando deles

Foi com aqueles fogos tantos deles

Que faziam no céu

Aquele incêndio tão bonito

E aquela cantoria sem fim...


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Em rimas mais que imperfeitas

Tentei te mostrar o amor que não tive

O que definiria outros rumos

O que faria andar outros caminhos

Mas as palavras morreram...

Em planos mágicos e falhos

Tentei pegar as estrelas dos teus olhos

Na palma das minhas mãos

Mas elas acabaram fugindo

Para um destino incerto e ignorado...


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Eu sou o demônio que guarda a chave do abismo,

Não teme tirá-la de meu bolso, não está aí,

Aliás, nunca esteve, está em meu coração...

Eu sou o demônio que passeia pelo abismo,

Não tente quebrar as minhas velhas asas,

Nunca precisei delas, eu tenho as maiores, os sonhos...


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Não me importo com o teu jeito meio desajeitado,

O modo que tu me olhas é o verdadeiro encanto...

Não me importo com aquela tatuagem estranha

Com o nome de outro cara, teu corpo vem a mim...

Não me importo com as tuas zangas repentinas,

Pois é aí sim que consegues até ficar mais bonita...

Não me importo se mostrar não importar com nada,

Já tomas conta do meu universo e ele é tão grande...


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Admiráveis figuras...

Abandonadas pelo tempo...

Presas por paredes imaginárias...

Quando tinham todo o tempo do mundo...

E agora não possuem mais nenhum...

Sorriso e seriedade juntamente...

Talvez em velhos álbuns de papel...

Ou em pedras frias de lápides...

Admiráveis figuras...

Que se tornaram o próprio tempo...


Polititicagem

A prefeitura mandou distribuir restos de feira! Oba!

E também distribuir sepulturas de graça! Eba!

Com caixões feitos de caixote de bacalhau! Aleluia!

E vão querer comer a sua filha e a sua mulher! Apoiado!

Já mandaram distribuir camisinhas furadas! Ó glória!


O vereador cheira muito pó com os seguranças! Tá certo!

Enriqueceu do dia pra noite sem ninguém ver! Mereceu!

Ele rouba até doce da boca das crianças! Isso é bom!

Até a vida dele por inteiro é só fake news! Manda ver!

Na fazenda dele tem trabalhador escravo! Claro que pode!



O governador mandou a polícia baixar a porrada! Beleza!

E fazer muitas chacinas nas favelas! Que maravilha!

Mandou cortar a luz de todos os miseráveis! Isso mesmo!

E fez um novo esquema pra roubar merenda escolar! Corretíssimo!

Eu gargalho nas fuças de quem tá doente! Com certeza!


O deputado mandou matar o rival político! Agiu certo!

Descobriram que o cara traía a mulher com o cunhado! Isso é bom!

Eu compro seu voto por uma cachaça! Só se for agora!

Papel higiênico é bem melhor que livro! Sempre foi!

Com a ajuda do Cão eu vou foder a sua alma! Demorou!


O presidente não gostava nem de trabalhar! Direito dele!

O nosso país quase que ficou na merda! Deveria ter ficado!

Quero cédula de papel pra limpar meu cu! É pra já!

Cadeia é lugar só pra pobre! Que apodreça lá!

Rico bêbado pode atropelar qualquer um! Todo dia!


O ministro cagava e andava pro povo todo! Isso sim!

Sopa de osso é um dos melhores pratos! Papa fina!

Agrotóxico é muito bom pra nossa saúde! Cura tudo!

Botar fogo nas matas agora virou moda! Capricha!

A terra sempre foi plana! Nunca tivemos dúvida!


O civil caga fedido e o militar caga cheiroso! É verdade!

A justiça tem dois pesos e duas medidas! E com razão!

Compre logo seu terreno lá no céu! Tá na promoção!

Por um dólar eu mato qualquer um desgraçado! Valeu!

Deus agora virou uma garota de programa! Amem! 


Minha terra agora não tem mais palmeiras

E agora o sabiá está aposentado...


(Extraído do livro "Só Malditos" de autoria de Carlinhos de Almeida).


Filosofia

Eu como meu silêncio em silêncio

Em pequenos pedaços e bem pequenos

Escolho as roupas que não combinem

Sobretudo as que são mais esdrúxulas

O doce deve ser consumido com sal 

Bom-dia seus grandes filhos-da-puta

Afinem de uma vez essa merda de piano

Posso falar ou não posso?


Eu vejo quase tudo e finjo não ver nada

Testemunhar pode ser o que há de fatal

Macaco velho não põe mão na arapuca

O celular agora é quem manda nessa porra

Conforme diz aquele maldito popular

Se a farinha é pouca pode engasgar com ela

Tenho manhãs de anjo e noites de Cão

Posso gritar ou não posso?


Eu sinto muitas coisas que a tela não aceita

Os cirurgiões estão agora em ritmo de funk

Hoje é dia de pão com mortadela e cachaça

O segredo da poeira é ser servida em copos

No dia do cabelo maluco eu raspei o meu

A nossa vergonha acabou morrendo de velha

O pobre do Jeca agora fez seu doutorado

Posso berrar ou não posso?


Tudo o que eu quero é ilegal e imoral ou diet

Eu pedi um dengo e me deram um soco na cara

Juro que nunca mais morderei a língua nativa

Comprei um pião eletrônico muito legal mesmo

Fui rezando para que o vento levantasse sua saia

É bem mais educado comer com a boca aberta

Para ter sol amanhã eu fiz logo a dança da chuva

Posso uivar ou não posso?


Eu penso no anonimato porque que é arriscado

Caprichem no molho do meu radinho de pilha

Tubarões agora usam sapatos de couro de jacaré

E na tenda do malandro ocorrerem muitos milagres

Só deliro nos dias pares e nos dias ímpares também

Ganhei um choque no aparelho que está desligado

Posso grunhir ou não posso?


Eu me perdi numa selva de perigosas balelas

Só apoiarei aquele que nunca na vida me apoiou

Fiz um curso de como fazer ignorâncias caseiras

Jujuba de caju é muito bom para nossos dentes

Fui ali catar uns cacos e acabei me tornando um

Já morri tantas vezes numa mesma esteira

Posso latir ou não posso?


Fatídico agora é meu sobrenome de família

Bah acabei sentando no ferrão do marimbondo

Queimo tubo de pólvora na mão e nem dói mais

Mercedes bebia cerveja até no palito de dentes

Vou fazer uns biscates pra perder uns trocados

Marinheiro que sabe nada cai também no fogo

Posso miar ou não posso?


Eu como meu silêncio em altos brados

Em pequenos pedaços e bem pequenos

Escolho as roupas que estão rasgadas

Prefiro os salgados feitos anteontem

O sal deve ser comido com açúcar

Bom-dia seus grandes filhos-de-égua

Afinem logo esse caralho de pandeiro

Posso falar ou não posso?


(Extraído de "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Exuberance

Num pátio rosa-chá aconteciam milagres

e alguns outros desatinos mais...

O telhado decadente tem pouca importância

sobretudo com estes seus detalhes...

Nunca mais nos excederemos com esta dose

e juramos por estes velhos catálogos...

Os poetas engoliram as rimas que sobraram

junto com o café que servido foi...

A nudez sempre foi e será mais bem recatada

do que toda mentira proferida...

Minha querida mãe seu filho sente mais dor

dentro da alma do que nas pernas...

As medidas estão soterradas sob os escombros

E eu vou rindo enquanto necessário...

Bem-aventurados os que não valem mais nada

a terra já é sua por antecipação...

Bem-aventuradas as meretrizes do meu bairro

porque o consolo está sob suspeita...

Todos os ditadores merecidamente post-mortem

merecem todo esse nosso escárnio...

Quem corre com muita sede até chegar no pote

até vomitará aquilo que bebeu...

Cachaça barata envelhecida em tonéis de pano

é o que sobrou das bodas do filme...

O motorista largou as mãos do volante do carro

na hora da curva mais fechada...

As formigas levaram o pobre cadáver da mosca

com toda a solenidade possível...

Esse pesadelo tem exatamente a minha cara

mas este rabo é certamente o seu...

A nossa sociedade é apenas um show de títeres

que batem cartão de ponto e lancham...

Demônios não possuem mais chifres no repertório

enquanto os anjos lançam os novos looks...

Cadeiras velhas plásticas espalhadas pelo salão

e práticos sachês de molho insípido...

Estamos em plena geração de tão novas velharias

onde pensar pode causar o câncer...

Os Ursinhos Horrorosos passam na velha televisão

que implora ser queimada na Inquisição...

Na Mansão dos Mortos não haviam mais vagas

e por isso dormimos sob os viadutos...

Exuberante paisagem bem mais do que tropical

onde os restos de feira compõem a pintura...


(Extraído de "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida")

Alguns Poemetos Sem Nome N° 322

O amanhã é o hoje com requintes de ontem. Todo amor acaba sentindo raiva de si mesmo. Os pássaros acabam invejando as serpentes que queriam ...