Eu como meu silêncio em silêncioEm pequenos pedaços e bem pequenos
Escolho as roupas que não combinem
Sobretudo as que são mais esdrúxulas
O doce deve ser consumido com sal
Bom-dia seus grandes filhos-da-puta
Afinem de uma vez essa merda de piano
Posso falar ou não posso?
Eu vejo quase tudo e finjo não ver nada
Testemunhar pode ser o que há de fatal
Macaco velho não põe mão na arapuca
O celular agora é quem manda nessa porra
Conforme diz aquele maldito popular
Se a farinha é pouca pode engasgar com ela
Tenho manhãs de anjo e noites de Cão
Posso gritar ou não posso?
Eu sinto muitas coisas que a tela não aceita
Os cirurgiões estão agora em ritmo de funk
Hoje é dia de pão com mortadela e cachaça
O segredo da poeira é ser servida em copos
No dia do cabelo maluco eu raspei o meu
A nossa vergonha acabou morrendo de velha
O pobre do Jeca agora fez seu doutorado
Posso berrar ou não posso?
Tudo o que eu quero é ilegal e imoral ou diet
Eu pedi um dengo e me deram um soco na cara
Juro que nunca mais morderei a língua nativa
Comprei um pião eletrônico muito legal mesmo
Fui rezando para que o vento levantasse sua saia
É bem mais educado comer com a boca aberta
Para ter sol amanhã eu fiz logo a dança da chuva
Posso uivar ou não posso?
Eu penso no anonimato porque que é arriscado
Caprichem no molho do meu radinho de pilha
Tubarões agora usam sapatos de couro de jacaré
E na tenda do malandro ocorrerem muitos milagres
Só deliro nos dias pares e nos dias ímpares também
Ganhei um choque no aparelho que está desligado
Posso grunhir ou não posso?
Eu me perdi numa selva de perigosas balelas
Só apoiarei aquele que nunca na vida me apoiou
Fiz um curso de como fazer ignorâncias caseiras
Jujuba de caju é muito bom para nossos dentes
Fui ali catar uns cacos e acabei me tornando um
Já morri tantas vezes numa mesma esteira
Posso latir ou não posso?
Fatídico agora é meu sobrenome de família
Bah acabei sentando no ferrão do marimbondo
Queimo tubo de pólvora na mão e nem dói mais
Mercedes bebia cerveja até no palito de dentes
Vou fazer uns biscates pra perder uns trocados
Marinheiro que sabe nada cai também no fogo
Posso miar ou não posso?
Eu como meu silêncio em altos brados
Em pequenos pedaços e bem pequenos
Escolho as roupas que estão rasgadas
Prefiro os salgados feitos anteontem
O sal deve ser comido com açúcar
Bom-dia seus grandes filhos-de-égua
Afinem logo esse caralho de pandeiro
Posso falar ou não posso?
(Extraído de "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).