Todos os lugares da alma
Estão preenchidos pela ressaca do ontem
Ela não se importa com a natureza
De seus fantasmas e ilusões
Um vento frio leva a poeira embora
Enquanto saudades teimam em ficar
Um par executa um tango argentino
Em passos precisos demais...
O meu contentamento se espalha
Entre os móveis mais imóveis
Como um menino acuado no canto
Que nem sabe se chora ou se ri
Como só as marés sabem fazer
Um pássaro solitário e sem malas
Prepara ao acaso uma viagem
Para durar segundos ou eternidades...
Eis a poesia bebida em fartos goles
Como num quadro na parede
Onde autos amarelos desfilam
Em um carnaval fora de prumo
Com a pressa imotivada de zumbis
A menina loura de lábios de sangue
Ainda repousa num mundo morto
Que podemos chamar noite passada...
Somos todos canalhas por acaso
Até que alguém prove ao contrário
Um inferno de chamas coloridas
Aguarda-nos em novas embalagens
Que acabaram de chegar pelo correio
E todos os profetas de plantão
Anunciam mais breves tempestades
Festivais de adjetivos e substancialidades...
Os trios elétricos da ilha de Marajó
E a foto do Elvis no boteco sorriem iguais
Um pouco de ternura faz muito bem
Mesmo quando isso nos acaba ferindo
Domingos esperados de cinema
Com luzes numa roda-gigante
Que só mesmo os antigos verões
Acabam nos presenteando gentilmente...
Todos os lugares da alma
Estão preenchidos pela ressaca do ontem...
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