quinta-feira, 20 de outubro de 2022

Todos os Lugares da Alma

Todos os lugares da alma

Estão preenchidos pela ressaca do ontem

Ela não se importa com a natureza

De seus fantasmas e ilusões

Um vento frio leva a poeira embora

Enquanto saudades teimam em ficar

Um par executa um tango argentino

Em passos precisos demais...

O meu contentamento se espalha

Entre os móveis mais imóveis

Como um menino acuado no canto

Que nem sabe se chora ou se ri

Como só as marés sabem fazer

Um pássaro solitário e sem malas

Prepara ao acaso uma viagem

Para durar segundos ou eternidades...

Eis a poesia bebida em fartos goles

Como num quadro na parede

Onde autos amarelos desfilam

Em um carnaval fora de prumo

Com a pressa imotivada de zumbis

A menina loura de lábios de sangue

Ainda repousa num mundo morto

Que podemos chamar noite passada...

Somos todos canalhas por acaso

Até que alguém prove ao contrário

Um inferno de chamas coloridas

Aguarda-nos em novas embalagens

Que acabaram de chegar pelo correio

E todos os profetas de plantão

Anunciam mais breves tempestades

Festivais de adjetivos e substancialidades...

Os trios elétricos da ilha de Marajó

E a foto do Elvis no boteco sorriem iguais

Um pouco de ternura faz muito bem

Mesmo quando isso nos acaba ferindo

Domingos esperados de cinema

Com luzes numa roda-gigante

Que só mesmo os antigos verões 

Acabam nos presenteando gentilmente...

Todos os lugares da alma

Estão preenchidos pela ressaca do ontem...

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