quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Eu de Mim

Young Sad Boy Sitting On The Floor Stock Photo, Picture And ...
Eu de mim posso falar muito 
ou quase nada ou nada...
Depende de que dia estou, 
embaixo do sol mais quente
ou correndo de malvadas chuvas...
No palco da vida aplaudo de pé
ou grito vaias ou assobios
ou simplesmente vou embora...
Todas as mancadas que fiz
partiram de mim,
eu sou a origem dos meus sonhos,
o nascedouro dos meus pesadelos...
São meus pés que escolheram
as ruas escuras por onde passo,
os abismos de onde salto,
o que pode ser riso ou dor...
Eu mesmo abri os frascos
e dá lá tirei os meus venenos,
coloquei-os no copo e engoli...
Eu mesmo fiz todas as festas,
pulei em todos os carnavais
e decretei meus dias de luto...
Fui palhaço, saltimbanco,
vagabundo, maldito e carpideira,
acho que todos eles ao mesmo tempo...
Cultivei amores impossíveis,
verdadeiros roseirais sem rosas,
mas plenos de muitos espinhos...
Fui o mais inocente e o mais sórdido,
a fera que infunde todo o medo
e o anjo que galopa entre nuvens...
Guardei milhares de moedas para nada
em baús das mais velhas recordações
e acabei perdendo as chaves de todos eles...
Sou o passarinho de asa quebrada,
o demônio que chora de ternura,
o Judas feito de trapos no poste,
até aquilo que nem eu sei...
Luxo e lixo, ventura ou desgraça,
o cheiro do incenso ou dos dejetos,
a pressa e o relógio quebrado, 
incomparável e totalmente igual...
Eu de mim mantenho o sigilo,
mas coloco meus crimes pelos jornais,
na boca de todos os arautos
e nas previsões nefastas dos profetas
num Apocalipse particular ou não...
Eu de mim posso falar muito
ou ainda permanecer calado...
Talvez seja muito lembrado
ou passe a ser um nada quando partir,
seja motivo de bastante choro
ou receba a indiferença de todos, 
mas isso não importa tanto,
ou simplesmente não importa mais
como um dia há muito importou...
Eu de mim me amo e me odeio...

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