quinta-feira, 23 de abril de 2020

É Só Tudo Isso

Carpideiras, panos brancos sobre os objetos e santinhos: o que ...
Mesmo com o silêncio solene de missas de corpo presente ainda escuto os sons do passado, sons esses que vêm me cobrar a minha dor em moedas de saudade. Mesmo em passos tropeçantes que num caminhar letárgico eu vou indo, não sei se direto ao nada ou se esse nada sou mesmo eu. 
É só tudo isso, somente. Um choro bem chorado no meu rosto doente.
Mesmo com as pinturas abstratas que anunciam catástrofes sem idioma, compreendo as vozes sem som algum que a rua me fala aos ouvidos. Mesmo com o velho rádio agora quebrado que magicamente funciona, notícias de anteontem ainda me causam certo impacto.
É só tudo isso, somente. Um sonho massacrado no meu medo crescente.
Mesmo com a raiva incontida que me faz rosnar feito um cão raivoso, me contenho porque toda corrente tem seu certo limite e dele não passo. Mesmo que a comida tenha esfriado sobre a mesa, vou almoçando uns versos bobos da mais pura sofreguidão como todo e qualquer faminto de alegria.
É só tudo isso, somente. Um gato no telhado quase que dormente.
Mesmo que eu não tenha mais vergonha na cara, declaro-me culpado de meus erros com as piores intenções possíveis. Mesmo que o cadafalso esteja logo ali, logo depois da curva, dou meu pescoço à forca como quem dá a cara á tapa por ainda te amar.
É só tudo isso, somente. Um final esperado e um fim diferente.
Mesmo que a fila esteja grande demais e demore tanto, tenha então que escutar as boçalidades de todo chamado bom senso que não é. Mesmo que a vista escureça porque enlouqueço aos pedaços como a fruta que amadureceu demais e caiu no chão, ali permanece.
É só tudo isso, somente. Uma dor aqui do lado tão pungente.
Mesmo que todos os prédios desta cidade desabem, sua poeira de tijolos faça apenas um quadro de cores malfeitas e de um tom monótono. Mesmo que as minhas vestes se rasguem em confissão sobre segredos inconfessáveis que deveriam nem existir.
É só tudo isso, somente. Um violão sem cordas não é plangente. 
Mesmo com o barulho desesperado de carpideiras pagas com algumas moedas no seu desespero caricato, os mortos vão enterrar os outros. Mesmo em passos cambaleantes de quem bebeu e deveria beber mais, eu vou indo, não sei se direto ao nada ou se esse nada sou mesmo eu.
É só tudo isso, somente. Um riso desesperado no meu rosto demente... 

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