Não há mais urubus na primavera
E nem cigarras por falar nisso
As promoções acabam hoje
E qualquer uma das poéticas morreu
Somos tudo que funciona às avessas
E a execração não foi para o condenado
Não há mais girassóis girando
E a bela voz acabou se calando
Na hora que a canção suplicava
Os barulhos do dia agora são banais
Mesmo as bombas que caem sobre meninos
Ou estampidos tirando qualquer vida
Não há mais necessidade de óculos
Porque cegos já vêm de fábrica
Os nossos sentidos estão falidos
A teimosia anda sumida do mercado
E todos os idiotas de plantão
Vão trabalhar até nas suas folgas
Não há moeda sem três lados
Nesse tão intricado labirinto
Onde vencedores e vencidos
Irão acabar no mesmo lugar
Não são muito poucas as vezes
Que socos doem menos que beijos
Não há mais rapazes latino-americanos
Fazendo protestos quase inúteis
E se hoje se esconder é questão tática
Viver uma brincadeira de mau-gosto
Em que anjos e demônios se uniram
E participam do mesmo banquete
Não há mais lógica na própria lógica
Quando a questão é apenas outra
Quem poderá respirar agora sossegado
Quando os venenos bailam pelo ar?
Todas as filas servem para ensinar
Como se comportar na última delas
Não há mais reticências para se pôr
Não há mais um leve desespero
Todos eles acabaram ganhando peso
Numa estética que faz até o ar rir
Porque a dicotomia vive falhando
A sujeira não está debaixo do tapete
Porque os miseráveis não possuem um
Não há mais como proibir o proibir
Quando até velhos ídolos se quebraram
O barro de Adão acabou apodrecendo
E as costelas são servidas no jantar
Faço votos que encontrem algum lugar
Onde tudo isso tenha uma resposta
Não há mais porque me alongar
O cansaço chega o tempo todo
E afinal de contas sempre perdemos
Mesmo antes da corrida começar
E alguém posso levantar o dedo
E dizer que não há mais nada...
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