sábado, 5 de setembro de 2020

Masque Chicletes

Boy Blowing Bubble Gum High Resolution Stock Photography and Images - Alamy
A poeira zunia mais um pouco, era acompanhante de um solitário vento, desses vermelhos que não se fazem mais. Mudaram os ventos? Sim, mudaram faz tento. Não há mais aqueles ventos que nos traziam ideias mais felizes, mesmo quando morriam ali mesmo. 
Os ventos são outros, são frios como o hálito de uma morte esperada, mas adiada. Ou então mornos como os que saíam de profanas bocas nos dizendo disparates que faziam amarelar nossas desprevenidas faces que não enrubesciam por costumeiro pudor.
Moscas agora não voam mais em círculos como antes. Seu voo agora nos aflige como os rasantes de bombardeiros de uma velha guerra que ainda não acabou. Eu me irrito, todos se irritam, mas falar sobre isso agora tem alguns ares de um indecente tabu.
Todos tem sua espécie de razão, até os tolos e olhos são responsáveis por tal façanha. Os canibais também usam fio dental, sempre é bom ter etiqueta. Disfarces agora são muito recomendados pelos programas matinais que invadem nossas sagradas salas.
Um círculo, dois círculos, três círculos, o menino observa as bolhas de sabão, mas imortais do que certos modernismos que sem precisar de moeda alguma, acabam ficando cada vez mais caros.
Minhas narinas estão invadidas, é uma perpetuidade que não consigo escapar mesmo se me desespero. Eu tento disfarçar procurando algum sentido nos rabiscos de muros e paredes, mas são histórias de livros fechado que nunca conseguirei ler.
Nesta minha caverna de tijolos e cimento com algum toque de modernidade eu volto para minha brutalidade delicada. Meus quilômetros ainda são muitos, mas o tempo manda em meus passos. Se tropeçar e cair no meio do caminho, poderei gritar apenas com alguns monossílabos, isso até que é meio reconfortante.
A poeira acumula em lugares cada vez mais insólitos. Poderia escrever uma nova enciclopédia sobre coisa alguma se assim o quisesse. Mas o tédio que a novidade traz quase que me infarta, mas melhor não, infartos agora não estão muito na moda.
Qualquer dia desses, serei tomado de uma coragem inédita e não sorrirei mais com esse otimismo idiota que dizem fazer tão bem, mas no final apenas ocupa espaço. O belo e o feio navegam nos mesmos mares e ambos possuem asas e praticam suas ações quase juntos.
Temos uma sociedade às avessas. A musicalidade agora pertence aos carros de anúncio, encartes de mercados são didáticos, as tristezas alheias agora só podem ser memes que viralizarão até que algo pior aconteça. Beethoven tocando no carro do gás sim.
Eu olho minhas marcas com certa indiferença, o tempo é o grande destruidor de possibilidades, aquele que embaça nossas vistas e acaba com nossas probabilidades de fazermos sonhos virarem pedras. Toda dor acaba um dia, menos a saudade, é claro.
O vento deve ter parado, não escuto mais suas obscenidades interessantes como antes, talvez seja isso que aconteceu ou outra opção mais nefasta. Não importa, existiram perigos maiores que um dia enfrentei ou então, corri deles. Tudo nesta vida é tão simples como mascar chicletes...

(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).

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