terça-feira, 28 de abril de 2020

Todos Os Doze

Calendário Antigo Da Revista Americana Time Anos 78 E 79. - R$ 12 ...
Todos os doze, 
Todos eles um à um,
Não são apóstolos,
Mas testemunham crises,
Assistem crimes,
Olham nascimentos e mortes...

Todos os doze,
Marcam felicidades e desesperos...

Todos os doze,
Todos eles sem exceção,
Não são bichos.
Mas não são tampouco gente,
Apenas insensíveis,
Riem e choram mecanicamente...

Todos os doze,
Tão fieis e traiçoeiros também...

Todos os doze,
Todos em sua plenitude,
Não são pedintes,
Nem ao menos patrões,
Comem e passam fome,
Luz e trevas todos misturados...

Todos os doze,
São amantes e são carrascos...

Todos os doze,
Todos eles sem falha alguma,
Não são pacientes,
Mas também não se irritam,
Ficam quietos na fila
E no seu barulho a fila anda...

Todos os doze,
São o infinito e o nada...

segunda-feira, 27 de abril de 2020

Alguma Paisagem

Foto de Comercial Comercial Cena De Rua Cheia De Gente Em Nanjing ...
Sinto em mim um calafrio
Como se fosse febre mas não é
E acabo me confundindo 
Observador e cena ao mesmo tempo
Um gosto inusitado de mistura
Invadem o meu ser sem licença
E chorar pode ser o único recurso...

Vejo cada objeto de mim um pedaço
E a imobilidade mórbida me pertence
Estou vivo e ao mesmo tempo morto
Ou ainda não vivo como os objetos
Sou como uma natureza-morta
Que um velho pintor em desespero
Acabou esquecendo de terminar...

A solidão das ruas mais cheias
São como as minhas próprias veias
E cada drama que acontece pulsação
Para um coração cansado de medos
E eu juro que desconheço
Se no próximo instante teremos
A vida ou a morte cumprindo seu papel...

Os cães passeiam sobre a minha pele
Os mendigos desenham nela tatuagens
Cada uma delas é mais uma história
Daquilo que poderia ter sido belo e não foi
Do amor que poderia ter sido bom 
Mas que acabou não sendo 
E o livro da vida acabou sendo rasgado...

Cada folha morta é mais um dia
Cada bocado de lixo mais um enredo
Cada janela aberta mais uma aflição
E as portas escancaradas bocas gritando
Apenas mais alguns pedidos de socorro
Que nunca serão atendidos
Porque a maldade sufoca o próprio ar...

Sinto em mim um calafrio
Como se fosse febre mas não é...

Pontes Quebradas

Ponte, sobre, madeira, antigas, riacho. Ponte, antigas, riacho ...
Sim, sim, eu quebro as pontes,
todas elas, sem exceção alguma,
não passo duas vezes pelo mesmo lugar,
não existe mais chance nenhuma...

Sim, sim, eu respondo perguntas,
não pergunte de novo, não repito,
o meu tempo agora é muito pouco,
e o meu caminho é o infinito...

Sim, sim, eu amo amores impossíveis,
amo sempre, demais, sem descanso,
mas se deixo enfim então de amar,
só resta em minha podre alma o ranço...

Sim, sim, eu atendo aos caprichos,
tudo aquilo que estiver ao meu alcance,
mas quando perder o seu encanto
não existe mais uma segunda chance...

Sim, sim, eu quebro as pontes,
cada uma delas já está quebrada,
eu vou embora, eu vou partindo
e então não restou mais nada...


(Extraído do livro "Leonardo e O Chão" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Alguns Poemetos Sem Nome Número 74



Nada falarei
Permanecerei mudo
até que a festa se acabe
Quando ela se acabar
abaixarei meus olhos 
e seguirei em frente
O caminho me espera
Não porque seja bom
ou simplesmente ruim
mas porque é caminho
A fogueira se apagou 
e a cinza agora nada mais é
do que o meu velho corpo
Eu tentei subir aos céus
como a velha chama fez
mas não conseguiu
Mas acabou indo mais perto
do que muitos conseguiram
Não me chame de volta
é tarde demais para isso
Não se entristeça por mim
nem agora nem nunca
Eu sou apenas uma simples
e desoladora bobagem
que um dia pensou sonhar...

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Eu não tenho medo algum...
De teus olhos mais fundos
do que um poço seco é...
Da tua brancura estranha
que parece a dos lírios
que nascem em jardins
há muito desprezados...
Tua boca escancarada
num sorriso de escárnio
me é indiferente...
Não tenho medo 
dos teus ossos morte...
O estalar deles
é menos assustador
do que as batidas
do meu coração...
Sou apenas humano 
e a minha alma
é a mais feias das criações
que um dia Deus fez
por um mero descuido...

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Paredes multicoloridas
Muros de algumas praças por aí
E uma sede aumentando
E a saudade de nada também

Portas todas fechadas
E muitas janelas abertas
Contam algumas histórias
Acontecidas não sei quando

Barulhos mais silenciosos
De uma rotina quase insólita
A palavra de ordem é repetir
Até que não se exista mais

A eternidade é um tempo qualquer
Onde o Caos faz sua lição de casa
E a loucura apresenta credenciais
Para assumir seu papel de sempre...

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E o vento descansou...
Não vai mais de encontro 
aos meus pobres olhos
trazendo invasoras poeiras...
Não sussurra aos meus ouvidos
segredos inquietantes
que me fazem um menino medroso...
Não me desafia para duelos
onde sempre saio perdendo
contra milhares de folhas mortas...
Minha sentença já está assinada
hei de passar pelo mundo
como um momento que foi perdido...
E o vento descansou...

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Copos de vidro
Pratos de louça
Talheres de metal
A mesa posta
E as pessoas contentes...

Praça cheia
Dia bonito
Sol quente
Os passarinhos alegres
E os meninos brincando...

Os namorados se beijando
Os amores correspondidos
A paz entre os homens
E o final de todas as guerras...

As roupas nos varais
Os quintais felizes
Os lares com tranquilidade
Nossas difíceis utopias
Se tornaram realidade...

Quem amamos voltou
As despedidas acabaram
O trem chegou
Nada à reclamar
O choro acabou...

Acorde...
O dia acabou chegando
Todas as fantasias morreram
Só nos resta agora
Um sol triste...

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Me chamem pelo apelido
que eu não gostava muito
Me puxem as orelhas
que deixava meu rosto vermelho
Só não me batam mais...
Devolve-me a caixa de papelão
onde guardava meus brinquedos
Não me lembro de todos eles
mas me lembro da maioria
E me fazem muita falta...
Quero meu terninho de volta
junto com as maçãs de vovó
Não esqueçam também
dos biscoitos de polvilho de vovô
E os doces de tia Inês...

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sábado, 25 de abril de 2020

Produtos Descartáveis

Portrait Of A Boy In A Medical Mask. Stock Photo - Image of child ...
Eu sou do meu tempo infelizmente
Acabaram-se todas as minhas saudades
Todos agora temos as mesmas idades
E a palavra de ordem é estar doente
Somos androides defeituosos e saudáveis
Meu bem, somos produtos descartáveis...

Em meio à tantos frutos não há semente
A minha prece é só mais um escapismo
Estou orando na beira de um abismo
Existem tantas bocas e nenhum dente
Somos apenas brinquedos desmontáveis
Meu bem, somos produtos descartáveis...

Preciso de um novo veneno imediatamente
Um veneno para poder viver que não mate
Pois a vida é um diamante sem ter quilate
O coletivo nada mais é que um inconsciente
Há tantas boas intenções tão desprezáveis
Meu bem, somos produtos descartáveis...

Nós caímos bem no ninho da serpente
A nossa cegueira é tudo aquilo que vemos
A nossa pobreza é tudo aquilo que temos
Eu acreditando ou sendo um descrente
São tantos os feitos mais formidáveis
Meu bem, somos produtos descartáveis...

Só isso...

sexta-feira, 24 de abril de 2020

Um Poema de Flores Cegas

Young man holding bouquet of dead flowers — Stock Photo © lofilolo ...
Eu vejo flores cegas
andando por aí
seu cheiro confunde
os meus sentidos
como quem vai 
de encontro à parede...

Está tudo em câmera lenta
perco a noção do tempo 
e então já é tarde demais
um simples baque
uma dor profunda
e finalmente vou ao chão...

O carro freia bruscamente
e a rota de colisão
já é mais que inevitável
apenas ferros retorcidos
e um sensacionalismo
em um jornal qualquer...

A noite chega intempestiva
em letras garrafais
sobre alguma dessas novidades
mais do que vulgares
sem nos explicar de onde 
e nem como aconteceu...

O mar está revoltado
os peixes dormiram mais cedo
e os pombos da minha cidade
andam sem migalhas
e os que moram nas ruas
são seres invisíveis...

Talvez erre esse caminho
e chegue em algum lugar
um céu de sofrimentos
ou um inferno de alegrias
porque agora tudo se confunde
acho que de propósito...

Talvez as folhas secas
ainda prestem a última homenagem
e seu barulho me encante
como nunca fui antes
e o sono dure uma eternidade
ou apenas mais um segundo...

Eu vejo flores cegas...

Alguns Poemetos Sem Nome N° 322

O amanhã é o hoje com requintes de ontem. Todo amor acaba sentindo raiva de si mesmo. Os pássaros acabam invejando as serpentes que queriam ...