Assim é se te parece. Nada
de novo há de nos redimir. Estou apenas esperando que as fronteiras caiam de
vez. E a quinta vez logo venha.
Enquanto isso. Hei de ser
egoísta o bastante para chorar de mim. Ver meus sonhos espalhados pelas
paredes. E nada mais.
Olá. Como vai? Não apenas
acene para mim como manda o protocolo. Nem sorria como manda a educação. Há
mais coisas do que imagina. E essas coisas o perseguirão até que os tempos se
consumam.
Eu sou o carrasco. E se
faço tuas vontades é por pura estratégia. E se escondo meus desejos é por pura
teimosia.
Olhe como está esta rua. A
maldizes em cada passo que dás. Quão tolo tu és! Ela conhece seus passos mais
que tu mesmo. E sabe seus pensamentos mesmo que os ignore. Ela conta cada
história que tua mente escondeu. E cada vergonha sem nome que compõem o teu
calendário. É a ela que deves o teus dias. E na verdade. A dívida é tão alta
que nunca poderás pagar.
Deixa pra lá. Tudo é
normal. A única coisa que conta é aquilo que não conhecemos. A única saída é
atravessando paredes. Mesmo que isso signifique sangue em nossos olhos. Nenhum
muro é mais sólido que a nossa vergonha. E maior inimigo não há que nosso
ridículo.
Conta teu tempo. E conta o
meu. Na verdade não vivi um segundo a mais. Pelo contrário. Enquanto tento o
meu menino pra que não envelheça. Levas o teu para a velhice que não tem mais
volta. Conta teu tempo. E conta o meu. Na verdade não vivi um segundo a mais.
As velhas coisas e as coisas novas são iguais. O encanto é mesmo. E isso basta.
Quando olhar antigos brinquedos não veja o que eles são. Mas o riso que deram.
E esse riso não muda nunca.
Não há nada mais sólido do
que aquilo que desejamos. Coroas caíram de reais cabeças. E canhões
enferrujaram. Os metais apodreceram sob o sol mudando de cor. E todo sangue derramado
secou sobre a terra. Mas o que cada um de nós desejou em sonhos assim o
permanecerá.
Não. Não é isso que eu
quero. Mesmo que seja para pedir desculpas pelo engano. Estava sem óculos. Era
a mente que não andava boa. Era o calor e a luz que me confundiram. Foi o
repente que fez a vaga num coração vazio. Mas se não for e não tentar: será a
morte. Não essa morte que vem logo e nos leva. A morte aos poucos. Que é a
pior. A morte que não nos muda de mundo. De país. De sei lá. A morte à
prestação por não ter tentado o que talvez valesse à pena. Pior que essa – só a
rotina.
Assim é se te parece. Se o
tempo é pouco ou muito. Se falta a estética. Ou o verso tem o pé quebrado. Se
as pedras são muitas. Ou as noites mais compridas. Ou se os amigos te deixariam.
É puro engano. Nada que perdemos foi verdadeiramente nosso um dia. Nada que
ficou no caminho poderíamos levar se assim o desejássemos. Para o pote quebrou
não há conserto. Cada coisa é cada coisa e nada mais.
Ontem mesmo sonhei com o
auto. Era o mesmo. Mas não era. Daria para entender? Pois bem. Na poeira de
vinte anos espelhava a mesma cor em outra diferente. E um caminho qualquer me
esperava. Não mais aos meus olhos. Mas em mim mesmo. Assim como este. Outros
ainda rodam eternamente. E cada um tem os seus.
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