sexta-feira, 31 de maio de 2024

Dia 31

Mais um para sofrer

Pelo menos mais um

Mais um...

Para olhar um céu inédito

Porém repetido

Para cobrar aos pássaros

Seu canto gratuito

Logo que mato a madrugada...


Mais um para mentir

Pelo menos mais um

Mais um...

Dizer que o mundo é bom

Com tanta maldade

Que os caretas são legais

Que a paz chegou

E a fome acabou de acabar...


Mais um para sonhar

Pelo menos mais um

Mais um...

Para ter mais desilusão

Como sempre

Para ter motivo para chorar

É de praxe

Neste pesadelo chamado vida...


Mais um para sofrer

Pelo menos mais um

Mais um...


(Extraído do livro "Águas de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quinta-feira, 30 de maio de 2024

Carliniana XLVIII ( Nem Sim e Nem Sim )

E o meu português com jeito forçado

Anda pelas janelas de todo meu país...

Eu faço o que quero, quer saber?

Espalho farelos de biscoito na memória

E me enamoro da última descoberta

Que nem mesmo sei se real poderá ser...

Claro, claro, tenho dúvidas atrozes

Como a costura que um dia fiz sem linha...

Era apenas mais uma enciclopédia velha!

Ganhei a rifa de uma dor no ombro

E algumas garatujas que achei na rua

Acabam me trazendo aquele certo conforto...

Por mais que minha tristeza se alegre

Fazem muita falta algumas essencialidades

Todas elas emanadas de um romance fictício...

Gravarei vídeos de uma nudez inexistente

Semelhante ao enxame de abelhas no mar

E correrei mais uma maratona adormecido...

Hoje teremos lança para prato do dia

E se sobrar para o jantar de todos nós

Até que todos os alfaces estejam meio secos...

Estou bem com esses meus andrajos novos?

A realidade é um saco de doces que está vazio

E o traseiro dela é o único conforto que tenho

Para tantas tempestades que hão de falhar...

O coelho parecia com o jovem prodígio

Até que alguém reparou e não foi nunca mais...

Quem quer tomar um soco na cara gratuito?

Metafísica do Biscoito

Num é oito, nem dezoito,

É trintioito...

Roupas novas de ano atraz 

Com a velha breguice costumaz...


Quer uma celveja?

Ou tumá um pupuaçu?

Podi escoiê meo povo,

Podi escoiê...


Num é oito, nem dezoito,

É trintioito...

Num abri a jinela,

Tamo na favela...


'Ssa aqui é tua cara,

'Ssa aqui teo escorno...

Podi escoiê meo povo,

Podi escoiê...


Num é oito, nem dezoito,

É trintioito...

A lujinha abriu agora

Tamo coa bunda di fora...


Qué tirá meleica?

Qué limpá rumela? 

Podi escoiê meo povo,

Podi escoiê...


Num é oito, nem dezoito,

É trintioito...

Ieu quiria um saiu oito

Tá pairecendo biscoito...


(Extraído do livro "Maluqueci de Vez" de autoria de Carlinhos de Almeida).


segunda-feira, 27 de maio de 2024

Carliniana XLVII (A Luta Eterna Entre O Efêmero e O Passageiro)

Que comece a luta, senhores, comece a luta!

Em mãos cheias de pó, eis nossos sonhos,

Escorrendo entre os dedos, escorrendo,

Como quem tenta segurar a fumaça e ela foge...

Onde eles foram parar? Nunca sabemos...


Que comece a luta, senhores, comece a luta!

Tentamos evitar nossa inevitável morte, tentamos,

Mas ela é apenas a consumação que o tempo

Acaba trazendo para nós, para todos nós,

Que fique apenas as lembranças, doces ou não...


Que comece a luta, senhores, comece a luta!

Todas as cartas estão marcadas, todas elas,

Mesmo quem ganhou acabou perdendo, perdeu,

Cada desejo depois de satisfeito, passa logo,

Como a graça de todo brinquedo novo, novidade...


Que comece a luta, senhores, comece a luta!

O abismo está pronto, está nos esperando,

Ele tem pressa, mas sua paciência é bem grande,

Quem irá finalmente ganhar essa luta?

Todos dois lutaram acabaram beijando a lona...


Que termine a luta, senhores, empate...

 

Alguns Poemetos Sem Nome N° 266


Danço que nem só um louco

Consegue enfim dançar

Não me importam ruas vazias

Que ninguém esteja vendo

Ou se quem vê se importa

Minha alegria é doença incurável

Resistiu à tudo que fizeram

Para que ela passasse...


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Taquicardia? Foi o que senti!

Quando vi que nem o passado

Conseguiu matar o que foi bom...

Nada enfim acaba passando

O que está feito assim está...

E aquela ternura de tardes chuvosas

Ainda continua rindo e chorando

Tudo de uma vez só...

Taquicardia? Foi o que aconteceu...


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Cavalos imaginários percorrem terras...

Eu me seguro em suas crinas

Para que não possa cair...

Tomo carona das asas do vento...

Como quem segura em pássaros

Para ir o mais longe que puder...

Não me esperem em hora alguma...

Todas as partidas são inevitáveis...


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Eis a teimosia dos nossos dias:

Nem sempre o que se sente

Pode ser arremessado feito pedra

Só os poetas conseguem

Consegue compartilhar bem e mal

Só os poetas ferem as almas

Com a mesma intensidade

Da ferida que lhes foi causada

Só os poetas conseguem...


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As manhãs correm muito mais...

Você sabe por que?

Elas acabaram de acordar,

Mesmo que meio sonolentas ainda

Entusiasmam-se com o sol

E saem andando por aí pelo mundo...

As tardes não, são meio preguiçosas,

O que tinha para ser feito

As manhãs já acabaram de fazer...

Depois as noites vem vindo...

Com seu cansaço costumeiro,

Filho de algumas decepções,

Mesmo que ainda tentem se alegrar...

E as madrugadas? Ah, as madrugadas,

Essas sim, são mais teimosas,

Esperam para ressuscitarem os dias...


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Toda paixão é um tiro que acerta a vítima...

É um dardo que vai bem certeiro ao alvo...

Um espinho que acaba ferindo o dedo...

O inevitável que queríamos poder evitar...

Mas, afinal, não somos nada diante

Desse monstro que emerge do abismo...


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Cenas desfilam ante meus olhos

Algumas boas, outras nem tanto

Mas todas elas dignas de lembrar

Cada pedaço, cada fragmento

Cartas que não chegaram ao destinatário

Horários que se atrasaram

Planos que acabaram dando errado

Carnavais que foram embora

E um auto rodando eterno

Em todas as mais frias ruas...


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Eu Tenho A Chave

Eu tenho a chave...

Só não sei de qual porta!...


Abrirá ela por acaso

As portas de minha percepção?

Ou ainda, a caixa de Pandora

Que soltará meus males?

A chave que abrirá a jaula

E soltará a minha própria fera?

Ou uma caverna obscura

Em que meu demônio reside?...


Eu tenho todo o amor...

Só não tenho a quem amarei!...


Amarei apenas a maior ilusão

Que será apenas uma foto na net?

Ou ainda será uma quimera

Que apenas quer me devorar?

Amarei apenas um contentamento

Que atrás da carne seja só ossos?

Ou será ele a causa inútil

Por que lutei toda minha vida?...


Eu tenho as asas...

Só não tenho os céus!...


Estes céus desabaram ontem

Sobre minha cabeça e nem percebi?

Seriam eles o próprio inferno

E eu achei que eram o paraíso?

Eles estavam longe ao extremo

E caí de cansaço pelo caminho?

Ou seriam parte de um pesadelo

Que me acordou no meio da noite?...


Eu tenho o sono...

Só não tenho hora para dormir!...


Por que fui fazer amizade

Com a noite e ela agora atormenta?

Estarei procurando seus olhos

No meio desta minha escuridão?

Terei medo de acabar dormindo

E sonhar com meus velhos dias?

Esse meu choro constante

Que atrapalha o meu descanso?...


Eu não tenho o mar...

Só tenho essa ânsia de navegar!


Suportarei todas as tempestades

Que também maltratam o cais?

As ondas gigantescas não afligirão

Minha fragilidade contínua?

Conseguirei me livrar dos ardis

Das sereias de minha vaidade?

Em algum Triângulo das Bermudas

Estará mesmo o meu final?


Eu tenho a chave...

Só não sei de qual porta!...


(Extraído do livro "Águas de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

domingo, 26 de maio de 2024

A Grande Dupla de Um

Enquanto um, sou dois...


Companheiro de minha solidão

Ando falando comigo mesmo

Em todas as ruas do mundo...


Enquanto um, sou dois...


Testemunha ocular de meu crime

Sou o único que pode me perdoar

Em todos esses tais delitos...


Enquanto um, sou dois...


Penso quase que escondido

Pois sei que estão me matando

Enquanto meu tempo é engolido...


Enquanto um, sou dois...


Tento parecer com o rebanho

Mas isso pouco me adianta

Pois sou um único universo...


Enquanto um, sou dois...


Faço um par quase perfeito

Bem e mal com braços dados

Eis porque tudo é dança...


Enquanto um, sou dois...


Quando a morte assim chegar

Faremos sim um novo par

De uma dança mais eterna...


Enquanto um, sou dois,..


(Extraído do livro "Águas de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

sábado, 25 de maio de 2024

Alguns Poemetos Sem Nome N° 265

Quero tanta poesia

Que encha os rios

Abarrote os mares

Desfaça as nuvens!

Quero tanta poesia

Que ocupe os pássaros

As flores se pintem

Quase faltem palavras!

Quero tanta poesia...


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Menino me devolva o vento

Minha pipa não alcança os céus

Deixa de esconder o brinquedo

Eu também quero me divertir

Faça meu ânimo voltar

Falta conhecer muitos lugares

Mesmo que o tempo esteja

Acabando nessa velha agenda

Ainda tenho o que fazer e não fiz...


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Fiquem calmos, meus mortos

Não se preocupem com esquecimento

Eu não preciso memorizar suas lápides

Não preciso guardar datas de vindas e idas

Minha memória é bem uma outra

Hei de lembrar sempre de suas passagens

Nem o tom de suas vozes eu me esqueci

Se nos encontramos um dia nem eu sei

Mas o mesmo carinho que tive continua

Carinho esse que nem sei se terei ao partir...


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A vida é quadro-negro

(Um quadro-verde?)

(Um quadro azul-marinho?)

Alguém vai escrever nele

O mesmo ou outro apagará...

A vida um rio que corre

(Grande ou pequeno?)

(Limpo ou sujo?)

Mas todos irão correndo

Para o mesmo lugar...


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Não consigo escutar cor nenhuma...

E a minha matemática fica estranha

Contando segundos feito pedinte...

E a minha lógica acaba profana

Rindo do que não achei graça...

E as fábulas contam realidades

Como apenas mais um desesperado...

E o meu instinto de sobrevivência

Acaba procurando abismos novos...

Não consigo ver som nenhum...


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Célebre desconhecido

sem um verso lido sequer...

Máximo incompreendido

minhas razões morreram...

Pensador barato

morro em cada rua...

Pedestre sem tino algum

atravesso a minha vida...

Como será meu amanhã

se nem o hoje posso ver?


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Pássaro não...

Pássaros voam quando querem

Eu só consigo isso quando sonho...

Maré não...

Marés se sucedem pelos dias

Eu só quando a paixão me atinge...

Ventania não...

Os ventos varrem folhas de saudade

E eu só consigo guardá-las...

Choro não...

Minhas lágrimas são velhas conhecidas

Deste rosto envelhecido de sempre...

Quando Tem Pão (Miniconto)

Criança tá mais do que certa, viu? Quase toda criança adora pão, sabia disso? Pelo menos ainda não conheci uma que não goste... Já conheci gente que não gosta muito de pão fresco, sabe? Se acostumou desde que era criança em comer pão dormido, acabou gostando. Mas a maioria não resiste ao pão bem fresquinho, aquele que ainda conserva o calor do quase agora, que nem eu... Mas vejamos, eis a vida nesses nossos dias, raro quando tem pão dias seguidos. Podia ser assim, mas nem todos os capitalistas querem pelo menos dar essa alegria tão simples...  

sexta-feira, 24 de maio de 2024

Samba-Enredo para O Nada

Preparou a luz do dia 

Para que ela se apagasse

Treinou as nuvens para um balé

E todas elas caíram no chão

Bebeu muita cachaça

Para a ressaca no dia seguinte

Amou como desesperado

Para o vazio de nunca se sabe

Brigou contra o espelho

Para que o vidro lhe cortasse

Beijou a boca da rosa

Mas esqueceu de seus espinhos

Mentiu descaradamente

E esqueceu o quão era idiota

Quis ser só otimista

Mas não se lembrou da maré

Teve todo tesão que podia

Não lembrou da morte do desejo

Bateu na porta errada

E foi ela que abriu de imediato

Acendeu contrito a vela

Mas acabou esquecendo o pedido

Quis fazer uma surpresa

Mas só conseguiu notícias velhas

Estava tão animado

Mas a piada não tinha graça

Fez o melhor samba-enredo

Mas não sabia que o carnaval passou...


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quarta-feira, 22 de maio de 2024

Diálogo de Porra Nenhuma II

 

Ele desejava um boa buchada de gato

Acompanhada de camarões quilométricos

E um suave refresco de cacto venenoso

Por falta total de tais petiscos originais

Engolia sua pobre saliva quase extinta

Enquanto olhava no espelho já aposentado

Do quase banheiro na favela onde residia

E lembrava celeremente do diálogo que teve

Como Joyce Zóio verão passado:


Eu: E aí? Vamos ou não?

Ela: Pra onde?

Eu: Se pudesse respondia...

Ela: ...

Eu: Vamos... Sei lá... Dar uma volta no tempo, um peido, qualquer coisa...

Ela: Logo um peido?

Eu: E o que tem de mais? Não é crime e nem pecado. Todo mundo dá todo dia, mais de um...

Ela: Claro, meu amor, mas há coisas bem mais interessantes para fazermos...

Eu: Tipo o quê, vida?

Ela: Ah, sei lá, meu marimbondinho de cuscuz seco... Tipo quem imita uma estátua com soluço...

Eu: Boa ideia, boa ideia, mesmo, meu periquito australiano com cara de nova-iorquino da favela do Arará, muito boa mesmo...E quando começaremos?

Ela: Na terça-feira que cair na quarto, sobretudo, se for num domingo que tenha ciranda de petiscos na casa da dona Chiquinha Boca-de-Bagre...

Eu: E dona Chiquinha está viva? Pensei que tinha morrido fazem uns quarenta anos de dez segundos cada...

Ela: Não, não, de forma alguma. A pobrezinha tinha que terminar de costurar um lençol freático maior do que aqueles do Saara tropical. Faltou até camelo...

Eu: Por que não usou um avestruz então?...

Ela: Porque avestruz estava em falta na venda do "seu" João.

Eu: Que João?

Ela: Aquele que todo dia cai se estrebuchando no chão...

Eu: Ah! Então tá...

Ela: Tá o que, amor?

Eu: Sei lá, tá lá, tá cá, tá aqui, tá acolá, que nem dona Tatá, a fandangueira de plantão no morro do Belisca...

Ela: Aquela que cisca? Ou aquela que pisca?

Eu: Qualquer uma serve, principalmente se não tiver, que nem feijão na falta de sino da igrejinha...

Ela: Ah, você é o mínimo do máximo...

Eu: Você acha? E você é mais bonita que um leão voando de asa delta...

Ela: Jura?

Eu: Juro pela sua mãe mortinha. Com os olhos arregalados que nem bolinha de pingue-pongue e quatro palmos de língua pra fora...

Ela: Que lindo! E cheia de formiga?

Eu: Sim, sim. Com todas elas, de uma vez só. E um copo de guaraná...

Ela: Nossa! Mais lindo do que isso só espelho quebrado em dia de decisão de campeonato de cuspe à distância...

Eu: Que nada... Maldade sua. Minha cachacinha de litro e meio...

Ela: Assim dá vontade de fazer um estrogonofe de farinha bem caprichado...

Eu: Pois faça, meu amor, colocarei a bunda na janela enquanto isso. 

Ela: Viu? Você é brilhante com essas ideias de jerico viciado em amarula...

Eu: ...

Ela: Por que ficou tão quieto, agora, meu sanduíche de alpiste?

Eu: ...

Ela: Fala alguma coisa!

Eu: Alguma coisa...

Ela: Agora sim, pensei que um bonde tivesse comido sua língua com batata...

Eu: Nunca! Pelas barbas de dona Floricema e as calcinhas de "seu" Napoleão. Sem falar no conhaque do "seu" Peixoto...

Ela: Mais lindo ainda... 

Eu: Então vamos falar porra nenhuma!

Ela: Com torradas bem branquinhas e café?

Eu: É tudo que eu sempre quis...


Fim.


(Extraído do livro "Maluqueci de Vez" de autoria de Carlinhos de Almeida).

O Hoje

O hoje...

O ontem sem medo...

O amanhã que teme...

Artimanhas do tempo

Com brincadeiras

Do mais puro mau-gosto...


O hoje...

O carnaval que desmaiou...

A Paixão que nos sangrou...

Um plano que falhou

Para que a alegria

Pudesse chorar também...


O hoje...

O espelho que quebrou...

A notícia que não veio...

O sono que fez falta

Para uma noite escura

Que se fantasiou de dia...


O hoje...


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Sem Título (Miniconto)

Ele não tinha nome, a sua história nem tinha título, igual milhares que existem por aí. Algumas até possuem, mas a dele não. Onde foi criado? Talvez em algum lugar que não se lembrava, talvez a rua que é mãe de muitos que são sem mãe. Sem mãe, sem teto, sem a própria calçada que dormem desde sempre ou de alguma data em diante. Alguns infortúnios podem ter seu começo e ninguém sabe qual o seu verdadeiro fim. Chamavam ele de Zé. Não era feio e nem bonito isso. Até o dia que Zé parou de respirar e ganhou um número, pelo menos nos próximos três anos... 

Carliniana XLVI (Compreensível Incompreensível)

Sensibilidade de alguma pedra

Discursos acadêmicos são tira-gostos

Toda necessidade percorre a cidade

Pés são pés e mãos são apenas mãos

Eu nada concordo até que concorde

A alma tira suas férias no banheiro

Fui convidado para não ir na festa

A fama são alguns palmos de terra

E talvez algum documentário medíocre

A carpideira sentiu tesão pelo morto

A banalidade pode ser algo especial

Agora crimes são motivo de orgulho

O tiro bem mirado atingiu bem na testa

Toda violência começa com a palavra

São milhões de momentos que gastos

Eu sou o meu próprio idioma particular

E um drama que não pode ser encenado

Todo exagero pode ter sua parcimônia

Uma cerveja é apenas a outra próxima

Nem eu mesmo quis me acompanhar

Quando bebo tenho a impressão que bebi

Minha saciedade é um rabo sem rato

Descobri que a descoberta não era

E que o nada pode conhecer várias coisas

Neves agora esquentam e a lava esfria

A panela nunca mais vai sair do fogo...


Alguns Poemetos Sem Nome N° 264

Quando comer é preocupação

Quando a resposta da prova é não

Quando a vida é uma trapaça

E viver apenas uma pirraça

Um trauma, um drama, trama malfeita

Que não pede recusa ou se será aceita...


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Acabei de sofrer uma vertigem

Tropecei num grão de areia...

Estava quase me sufocando

Tinha ar aonde eu estava...

Tive uma visão mais medonha

Meu sorriso sem motivo refletido...

Não parei de perguntar:

Que eu sou? Onde estou? Por que vim?


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As moedas que o cego

implorava e nunca viu...

A ilusão que o louco teve

mas que não existiram...

O amor que o amante

somente viu partir...

As nuvens que brincavam

até caírem pelos chãos...

Os sóis que se apagaram

feito lâmpadas queimadas...

Isso simplesmente 

chamam apenas de vida...


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Eu a gostaria

Como quem segura nuvens

A fumaça caiu dos céus

A pedra afundou n'água

Seu rosto é marca registrada

Nunca mais fui o mesmo do mesmo

Devorei todas as madrugadas

Minha invenção é a mais antiga

Eu a gostaria

Como quem abriu a gaiola...


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Cena de cinema

Cena de poema

O canto da noite 

É meu silêncio

Pintura trágica

Pintura mágica

Rimos e muito

Mesmo sem saber...


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Modo de usar:

Tire seus sonhos da embalagem

E deposite o conteúdo numa tigela

Com as mãos colha umas flores

Acrescente umas pitadas de sonho

E mexa tudo muito bem

Com açúcar à gosto

Unte uma forma com carinho

E coloque em forno brando

Por toda eternidade possível

Sirva acompanhado de contentamento

Rende infinitas porções...


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A esperança tudo espera

A calma sempre se acalma

A ternura é sempre terna

Só o amor e somente ele

Consegue unir os opostos

E até matar enquanto

Dá vida ao mesmo tempo.

terça-feira, 21 de maio de 2024

Carliniana XLV (Indissolúvel)

 

Plano A...

Plano B...

O amor é uma pedra

Que teima se dissolver na água

Quem poderá consegui-lo?

Plano A...

Plano B...

O pássaro encontrou 

A porta da gaiola da realidade

Quem poderá alcançá-lo?

Plano A...

Plano B...

O tempo caminhou

E foi destruindo pelo caminho

Quem poderá evitá-lo?

Plano A...

Plano B...

A lógica arriscou

O tiro saiu pela culatra

Quem está no rebanho?

Plano A...

Plano B...

O carrasco morreu

Seu corpo está pendurado

Quem nasceu pra semente?

Plano A...

Plano B...

Plano C...

sexta-feira, 17 de maio de 2024

Insalubre (Miniconto)

Insalubre era a casa dela (se é que podia ser chamada de sua ou ser chamada de casa). Qualquer favela tem coisa bem melhor. Sem porta, sem janela, chão sujo de muitos anos, tralhas e lixo espalhados por todos os cantos (bela decoração, não?). O vaso quebrado, sem sifão, a merda descia direta com o mijo e o cheiro "agradável" subia. Coleção de goteiras, matagal no quintal, coleção de mosquitos com fome e outros insetos daninhos. Algumas lacraias pra dar algum medo, claro. Vez ou outra, alguma cobra. Mobília? Tá de sacanagem, né? Umas roupas velhas, ou espalhadas pelo chão duro ou em sacolas de mercado, alguns cobertores velhos ou  aquele edredom que um dia prestou. Inumeráveis pontas de cigarro do Paraguai e cinzas de maconha. Quem entra lá? Qualquer um! É só estar pra lá de bêbado ou ser tão miserável quanto os moradores fixos. Algum toco de vela por aqui ou por ali (a luz foi cortada faz tempo). Água? Só da chuva ou pega na vizinha que fazia cara feia, mas dava. E, finalmente, maravilha das maravilhas, dois pedaços de concretos já pretos de fumaça, onde vez em quando, o fogo surgia embaixo (madeira velha catada em quintais baldios ou achada em entulhos de obra) onde as latas de tinta vazias ou algumas panelas já velhas e amassadas ferviam a comida igualmente miserável para encher a barriga de quem a cachaça também virou comida. Não adianta roubar nada, aqui não tem nada que preste, apesar de que pode surgir um pobre mais pobre do que os pobres que moram ali, nunca se sabe. O casal dorme junto, abraçados e talvez até sonhem que vivem enquanto não...

quinta-feira, 16 de maio de 2024

Carliniana XLIV (Tranças Imperceptíveis)

Quero deixar de trair a mim mesmo

dentro desse calabouço de falsas ilusões

Nada é mais absurdo do que se enganar

com falsas e amenas soluções

Uma trança vai me enforcando

sabe-se lá até quando...


Beber deste meu último e derradeiro trago

e deitar e voltar para o outro lado até dormir

Para a noite passar desapercebida em branco

até que eu sinta que não estou mais ali

E quando perceber esse abismo

é porque nele eu já cai...


Uma trama imperceptível feito uma teia

que uma simples aranha me espera

E todo sangue seja sugado desta veia

e me devore feito uma quimera

E me livre logo desta cadeia

como quem traz outra primavera...

Poesia Gráfica LXXXVI

T U A T R A N Ç A

T O D A D A N Ç A

T U D O A L C A N Ç A

F E R O Z E M A N S A


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I N V A S Ã O D O J A R D I M

A T E N Ç Ã O E M M I M

I N T E N Ç Ã O E N F I M

T E S Ã O C A R M I M

C O N S U M A Ç Ã O E N F I M


...................................................................................


S E T E P E C A D O S

S E T E P E S C A D O S

M O S C A M O R T A 

M O S C A P O R T A

M O S C A T O R T A


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T E N H A F É 

T E N H A P É

T E N H A R É

T E N H A Z É

T E N H A N É 

T E N H A T É 


...................................................................................


G R E G O S & T R O I A N O S

G R E G O S & B A I A N O S 

G R E G O S & T O S C A N O S

G R E G O S & C U B A N O S

G R E G O S & C H I C A N O S

G R E G O S & P E R U A N O S

G R E G O S & U R B A N O S

C H U R R A S C O G R E G O


...................................................................................


C O N E X Ã O U R B A N A

P R É D I O S A P A T A S

C O N E X Ã O U R B A N A

T É D I O S P R I M A T A S

C O N E X Ã O U R B A N A 

M É D I O S D E P A T A S 


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B O N E C A D E P A N O

S O U H U M A N O

B O N E C A D E P A N O

S O U P R O F A N O

B O N E C A D E P A N O

T E N H O H U M A N O

E S Ó. . .

domingo, 12 de maio de 2024

Poema Baseado Em Nada, Somente Em Nada, Nada Mais Que Nada

Decoro letras impossíveis

Como quem come um pão velho

apanhado neste lixo...


Me dou ao luxo de pensar

Mesmo que seja de forma torta

sobre porra alguma...


Mostro o dedo do meio

Para a sombra do que eu era

como se isso adiantasse...


Quebro a pedra com socos

Sem me importar com ferimentos

esta carne nunca foi minha...


Os pombos não arrulham

Falam em sotaque quase inglês

com pitadas de internet...


Qualquer arte pode ser uma

Mesmo tirar melecas do nariz

de um jeito mais especial...


Eu sou a única testemunha

De mais um crime que não cometi

desde a última noite passada...


É mais um gato consumado

Que a piedade esconde suas cartas

até que caiam todas no chão...


A motocicleta derrapou na pista

Feita entre fileiras de brancas nuvens

feitas com colares de contas...


Dezembros são apenas mais

Um dos janeiros que possuem preguiça

mas mesmo assim chegam...


O carpete cobre ali na frente

Enquanto pássaros azuis ciscam

numa placidez inexistente...


Quando perguntam o enigma

Eu apenas olho pra o outro lado

e simplesmente respondo: nada...

Alguns Poemetos Sem Nome N° 322

O amanhã é o hoje com requintes de ontem. Todo amor acaba sentindo raiva de si mesmo. Os pássaros acabam invejando as serpentes que queriam ...