segunda-feira, 30 de novembro de 2020

Feito Zunido

 


Escuto a madrugada em meus ouvidos. O silêncio da noite é um tango que acabou dando errado. Mesmo assim eu escuto. Com a solenidade que só os desesperados possuem. Eu nem tropeço mais. As minhas pupilas dilatam como as de um felino habitante de impossíveis malícias.

O zoom da minha câmera falhou na hora exata. Não há mais sonhos e nem peixes em sonoras redes. O menino que eu era acabou de fazer caretas no espelho quebrado. Nada mais importa. Talvez se o tropeção me der mais impulso. Eu voe para bem longe daqui. 

Os grilos fazem coro com os bacurais. Eis o meu medo em outras noites mais amenas quando nada tinha. E mesmo assim era o dono de todas as coisas que estivessem ao alcance da mão. Eram mágicas que eu não percebia. Mas mesmo assim eu era o seu autor. Eu era o senhor de todos os prodígios.

Sinto os cheiros mais diversos como um cão farejador. Não ha mais caça. A caça sou eu mesmo. Não há mais presa. Eu mesmo teço minhas armadilhas. Como quem mente dizendo que espera a morte. Até quando dizemos a verdade estamos mentindo. Nenhum espinho é motivo de aplausos. Nossas vaias estavam em falta.

As correntes quase enferrujadas rangem. Eis a minha teimosia feito maré que leva e traz todas as ilusões. Juntei todos os ingredientes possíveis para fazer a poção. Mas a magia não teve efeito algum. A própria realidade acaba se desconhecendo.

Vaga-lumes e cigarros agora se confundem. Somos quase humanos quando tentamos. O choro iguala todos. O riso nunca faz isso. Quantos cadáveres estreitei em meus braços. Cadáveres que respiram. O papel-moeda sempre cumpre o seu papel. Sempre fere de propósito. Nunca sabe pedir desculpas.

Eu já gritei tantas vezes! Mas a surdez continua na moda. Nunca me escutaram. Falei coisas tão compreensíveis. Deve ser por isso que fui desprezado. Nada mais resta. Pelo menos para mim. A esperança é a última dose no fundo da garrafa. Um suor alcoólico escorre em meu rosto. Principalmente nos dias de mais frio.

Eu quase tenho um desmaio qualquer. Sou vampiro e esqueci onde coloquei meu caixão. A noite desfalece aos poucos. Minhas presas agora se contraem com um bom sorriso burguês. A luz aos poucos surge me aterrorizando. E como um zunido. Um vento mais forte. Começa o dia....


(Extraído da obra "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida). 

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Poética do Absurdo Mais Que Real

 


Eu choro em meio ao riso

Será uma festa o meu funeral

A paixão matou-me sem aviso

Todo começo foi um final


Vamos comemorar o que não tem comemoração

A realidade é apenas mais uma ilusão...


Eu me disfarço sem ter fantasia

Sou apenas mais um desastre formal

Um dragão engoliu-me o dia

Coitado ele acabou passando mal


Vamos explicar o que não tem explicação

O destino é um carro sem direção...


Eu cato as sobras jogadas no lixo

Transformo em bem o próprio mal

Toda necessidade é apenas um capricho

Vamos dançar um tango sob o temporal


Vamos extinguir o que não tem extinção

A alma morre e sobrevive o coração...


Eu sou apenas mais um saltimbanco

E dou o meu pulo arriscado e fatal

Quis que a vida não passasse em branco

E fiz o pior: tornei-me um sujeito normal


Vamos comemorar o que não tem comemoração

A realidade é apenas mais uma ilusão...


terça-feira, 24 de novembro de 2020

My Madness

In my madness

I keep looking at the days ... How will it be tomorrow? The days are similar ... Almost equal in their sadness ... Similar in their tears and worries ... I don't even know what I would want ... Loves have died like rivers that have dried up ...

Dreams flew awaylike frightened birds ...

I try and I can't ... Maybe it was better Put on the old fantasy And make a new carnival ... Or still sleep And never wake up ...


Simples - Um Poema

Não que eu queira

mas tem que ser assim...

Essa alma pequena

encarcerada nesse corpo doente

veio de tantos tempos idos

onde a simplicidade

era maior que muitas estrelas...

Não que eu me esforce

o esforço necessário...

Essas palavras vulgares

serviram-me bem até hoje

no lugar de gritos altos

mostrando-me o desesperos

dos mais sufocados amores...

Simples como a pele...

Mais simples do que uma cor só...

A velha roupa rasgada

que não quero jogar fora...

Simples como a água...

Mais simples que o próprio ar...

As velhas histórias

que insisto em me lembrar...

Não que não queria admitir

e aceitar a derrota do tempo...

A morte não vai me assustar

mais do que me assustou

essa vida cheia de maldades

que acabaram me enrudecendo

e impediram de ser feliz...

Não tenho mais palavras doces

o amargo tomou conta de mim...

Tudo que aprendi foi em vão

e mesmo os cálculos difíceis

perderam-se alcoolizados

pelas muitas e muitas madrugadas

que nem sabia mais meu nome...

Simples como o tesão...

Mais simples que a última intenção...

O amor que eu teimo

mas que nasceu impossível...

Simples... Muito simples...

Um velho poeta por aí chorando...


(Extraído do livro "Muitos Dias Já Passaram" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Alguns Poemetos Sem Nome Número 87

 


Tudo bem

Tudo zen

Tudo além


Nas tristezas que eu mesmo causei

A culpa foi só minha se eu te amei

Eu derrubei todos os meus muros

E no barco eu mesmo fiz os furos

Arrumei a minha cama na solidão

Eis a eterna espera do meu verão


Tudo sem

Tudo nem 

Tudo além


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Sem sabiás e sem manacás

eis aí minha poesia

o sabiá já morreu

o manacá nem floriu

Mil mentiras contadas

afligiram-me feito setas

que me acertaram alvo

Não quero complicar mais

do que assim está

As nuvens se despedaçaram

no mais frio dos choros


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Os aldeões com seu grande alarido

Iluminavam espectralmente a noite

Com suas dezenas de tochas acesas

Como naqueles filmes baratos

De um terror mais que infundados

Mas era um bocado diferente 

O seu mais revoltado objetivo 

Não queriam invadir o sinistro castelo

E matar o monstro criado em laboratório

Estavam querendo matar o sonho

Que tristemente sustentava

Suas próprias vidas já mortas...


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Eu não tenho culpa

Não tenho culpa alguma

É que eu saí pra rua

E não me preveni corretamente

Meu sonho atacou-me

E eu tive que sair voando...


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No caderno de minha memória

Guardei meus segredos mais caros

Como sou infeliz!

O papel foi amarelando e amarelando

As letras sumindo e sumindo

E o que me era tão caro

Acabou ficando sem valor algum

Apenas um velho caderno

Com enigmas indecifráveis


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Olho o relógio

Vejo nuvens

Confundo letras

Construo acasos

Faço propostas

Ganho negativas

É tudo tão simples

Feito um labirinto

A cafeína vai 

Lentamente nas veias

E um som de silêncio

Acompanha solitário

A mais pobre

Frequência cardíaca


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Talvez a dor passe ou me acostume

O que me parece a mesma coisa

Talvez a alma morra ou envelheça

O que me parece a mesma coisa

Talvez a maldade caia ou desmaie

O que me parece a mesma coisa

Talvez os tiros errem ou falhem

O que me parece a mesma coisa

E ainda sobre alguma coisa

Para afinal eu poder comemorar


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Foram tantas as vezes

que fechei meus olhos

e enxerguei a absoluta escuridão

mas isso foi inútil...

A luz voltou aos poucos

e o dia finalmente amanheceu...

Foram tantas as vezes

que eu jurei não mais amar

e sequei minhas veias

para que o coração não batesse...

Um anjo veio me visitar

e acabou me ressuscitando...


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sábado, 21 de novembro de 2020

Com Um Pouco de Sorte

 


Eu tremo de medo da solidão,

Já me cansei de ser sempre o peão,

Acho que morri e esqueceram da extrema-unção...


Vou dançar de olho fechado,

Com um pouco de sorte

Talvez dê errado...


A top model ganhou um tombo em Milão,

Meu dog roeu todos os ossos do barão,

Temos tantas bundas para tão pouco tesão...


Vou beber tudo o que conseguir,

Com um pouco de sorte

Até meu nome esqueci...


Até meu carrinho foi pela contramão,

Uma hora rimos, noutra hora não,

Toda regra estética é pura ilusão...


Vou gritar até não poder mais,

Com um pouco de sorte,

Acabou a minha paz...


Faltou farinha pra esse nosso pirão,

Ganhei um centavo e perdi um milhão,

Foi eleito mais um novo ladrão...


Vou dormir mais um segundo,

Com um pouco de sorte,

Acabou-se o mundo...


(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Já Está Feito



A sorte está lançada...

Eu ando desnorteado como sempre, labirintos de febre, cabelos azuis e faces debochadas. Misturados estão todos os sons, mas até que essa cacofonia ficou bem agradável. Baile sem máscaras, sim, senhor...

A lida se cansou...

Sou um ilustre desconhecido que cata as tristezas jogadas fora com as mãos. Estão sujas, mas agora pouco importa. O carteiro não trouxe notícias boas, apenas contas vencidas. Eu bem que tentei, não deu certo...

O corte ainda está aberto...

Falo perguntas só por perguntar, sei a negativa de todas elas. Não se trata de ser fatalista, apenas estar acostumado com realidades pequenas e doloridas. Tudo se repete, nós é que não notamos...

Parei de sangrar depois de morto...

Nossos monstros saem da tela, invadem a sala e se assustam conosco. Nossa modernidade está muito antiga, velhos preconceitos nos fazem corar. A tolice comprou seu duplex em frente ao mar...

O cálice está vazio apesar de cheio...

Minhas tatuagens ficaram mais vivas do que eu, sua estética valeu mais do que meus esforços. Olho com volúpia as pernas de Betty até que minha alma arda de tesão. Tapem os ouvidos das crianças para não verem o meu politicamente incorreto...

Acabou a bateria do meu milagre...

Não sou malandro de lugar nenhum, apenas mais um sobrevivente de um Titanic que ainda não partiu. O cenário não ficou pronto a tempo para encenarmos a peça. Nesse teatro mambembe comemos nossas palmas...

Assobios zunem no meio da noite...

Um terremoto derrubou todo banquete no chão, os convidados agora imitam os cães. Tudo é muito parecido, senão igual. Vermelhos e azuis declararam cessar-fogo por tempo indeterminado. Não estranho mais coisa alguma...

Não quero mais olhar na tua cara...

Perdi as contas de quantas vezes perdi as contas, mas isso deve ser muito ou pouco. Por isso virei todos os espelhos para a parede. Minha criatividade acabou criando várias criaturas...

A velha senhora só quer um rio...

Piedosamente meus pedidos de perdão foram recusados, o que é mais do que normal. Olhando para eu mesmo descobri meia dúzia de enigmas. Tudo perde a sua importância se finalmente acordamos...

A sorte está lançada... Não há mais novidades... O que foi feito, já está feito...


(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Alguns Poemetos Sem Nome Número 86



Vidros quebrados

Roupas rasgadas

Ilusões desfeitas

Rostos parados

Nem mais lembrados

Cenas imperfeitas

Tudo muda

Menos o esquecimento...


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Faz tempo que nem tenho tempo de ver que nem tenho tempo. As raízes da saudade entranharam-se pelo solo seco de minh'alma e são difíceis de serem arrancadas. Tudo passa, menos o vazio de muitas ilusões mutiladas. Não reclamo mais, as minhas reclamações gastei contra mim mesmo. Não choro mais, o choro se tornou um lugar-comum totalmente fora de moda. Estou preso com as minhas próprias liberdades. O descanso pode até cansar mais...


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Quem somos nós?

Evitamos esta pergunta incômoda

Pela exata falta de resposta

Nossa roupa agora é nossa pele

Nossa vontade são os comerciais

Nossa verdade a própria mentira

Matamos nossa empatia

Com as pedras que atiramos

Nada mais tememos

Porque somos o próprio medo

Quem somos nós?

Mais um aplicativo baixado

Em nossos aparelhos celulares...


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Ando tão mal da memória... Esqueci todos os compromissos firmados comigo mesmo em ser feliz. Transformei-os numa competição barata com outros infelizes. Nesta competição não há ganhadores, todos perdem. Até Machado errou, as batatas estavam todas estragadas... Quase tudo continua na mesma, mas eu mesmo me ceguei de forma proposital. Gosto de coisas ruins, menos da minha própria pessoa. Enveneno-me regularmente procurando a cura para a doença que não tenho. Sou um grande inventor. Transformo a sabedoria em tolice. Manipulo todos os conceitos para chegar ao nada. Ando tão mal da memória...


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Sol para um céu que chorou ontem

O movimento de formigas

Para os homens da feira aqui perto

Tudo é tão divertido

Mesmo com qualquer tristeza que há

Até alguns pés cansados

Ficam de repente com vontade de dançar


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Representações hediondas

De uma miséria qualquer

Cometemos o erro

E escolhemos o castigo

Assim e não mais

Eu me embriago com os sonhos

Rude e cínico e debochado

Até minha tristeza se maquia

Chegou a hora do espetáculo


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Todos os números desapareceram

Não os da agenda do meu celular

Mas os números da vida

A inexatidão pertence à minha saudade

Sinto meu coração doer

Como o mais triste samba-canção

Eu gostaria de um alegre frevo

Mesmo se faltasse o guarda-chuvas


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Sábados

Desejando quase serem domingos

E amedrontados com as segundas

Eu até gosto das segundas

Mas a sua pressa entristece

Eu até gosto das segundas

Mas os carros não diminuem

Sua loucura nem sua velocidade


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quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Alguns Poemetos Sem Nome Número 85

 


Minha cara avermelhou-se

de onde veio tal rubor?

Escutei um assovio

foi um vento que passou...

O tempo passou

foi passando...

Não passará mais

estou aqui voando

no meio dos temporais...


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Esqueci os cálculos

Embaralhei os números

Como qualquer um

Andei perdido

Em comuns labirintos

Como qualquer um

Olhei atento o céu

Para não ver nada

Como qualquer um

Assustei-me com notícias

Que eu mesmo fiz

Como qualquer um

Trouxe meus fantasmas

Para perto de mim

Como qualquer um...


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Nem a chuva poderá entristecer-me

(pelo menos mais do que estou)

eu sou um cara bem teimoso.

Os meus sonhos poderão cair

(estão bem alto nas nuvens)

eu criarei outros mais belos ainda.

Não estranharei a maldade humana

(porque humano também sou)

mas tentarei não ser tanto.

Tentarei uma queda-de-braço 

(se for derrotado não faz mal)

para que a paixão não me mate.

Não me amedrontarei com a morte

(é a nossa grande conhecida)

ela virá na hora certa...


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Chuva chata

Chuva mata

Chuva prata

Sóis em solene protesto

Pardais lamentando-se

Margaridas em luto

Chuva ingrata

Chuva nata

Chuva cata

Mundo menino chorando

Nuvens de quase fumaça

Cena triste congelada

Chuva rata

Chuva bata

Chuva barata


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No meio da noite

Acompanho-me da solidão

Não me importo

Colho uma estrela por vez

Não me iludo

Até meus olhos irão se apagar

Ou será que não?

Talvez se transformem

Em duas novas estrelas


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Na serena noite dos meus dias

Eu rirei até não poder mais

Nada me era impossível

As minhas palavras zuniam

E transformavam-se em canções

Algumas de paz e outras de guerra

Não preciso dos velhos pés

Agora tenho novas asas

Foi a poesia que me deu...


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O coelho saiu da cartola

O pombo saiu voando

As estrelinhas dançaram

A ajudante bonita sorriu

E mesmo acabando o número

Amanhã tem mais

Para cada encanto acabado

Um outro surge...


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Teu corpo de vinho

Faz bem, faz mal

Não ter medo do caminho

Faz bem, faz mal

Ficar assim sozinho

Faz bem, faz mal

Querer rosa e espinho

Faz bem, faz mal

Me dê apenas um carinho

Faz bem, faz mal...


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segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Tiro de Misericórdia



Tristeza grande

Que mais poderia falar?

Humano

Jogado na vida

Perdido no mundo

Cheio de lugares-comuns

O que mais inventar?

Notícias ruins

Que paredes irão desabar?

Sonhos

Apenas pesadelos enfeitados

Fantasias mal-costuradas

Não haverão mais carnavais

Os pássaros poderão voar?

Vem pra perto de mim

Mesmo que seja a contragosto

Espere pelo menos eu dormir

E depois pode ir embora...

Alguns Poemetos Sem Nome Número 84

Só será esquecido 

Quem antes notado

Não fui percebido

Eterno abandonado

Eu sou quem passa

E ninguém nota

Por tantas ruas perdidas

E sem nome...


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Quero flores sem nome

Impregnadas de ternura

E um pouquinho de saudade

Um tempo que sobrou no relógio

Mas que ninguém notou

Já me é suficiente

Muito que não fiz

E me arrependo sempre e sempre

Podem andar em linha reta

E com a cara séria e triste

Minha imobilidade é apenas

Uma mera aparência

Eu hoje sou o morto

E sorrio no canto da boca

Pois este é o meu funeral...


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Meio verde, meio maduro,

Meio só, meio multidão,

Meio claro, meio escuro,

Meia mente, meio coração


Meio cego, meio vidente,

Meio falante, meio calado,

Meio saudável, meio doente,

Meio dormindo, meio acordado


Meio estrada, meio ninho

Meia alegria, meia aflição,

Meio desprezo, meio carinho,

Meio com o pé, meio com a mão


Tudo exatamente pela metade...


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Passa tudo, passa nada

Passa boi, passa boiada

Passa que passa que passa

Entre céus e entre mares

O que existe, todos lugares

Passa que passa que passa

Passa trem, passa avião

Passa sim, passa não

Passa que passa que passa

Tudo em volta e dentro de mim...


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Tão perto,

Tão longe,

Tão qualquer lugar,

Nas estrelas,

No chão,

Na terra, no ar,

Apenas solidão,

Querendo me matar...


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Meus versos são pequenos como a morte,

Fim de todas as coisas, de variados tamanhos,

Morre o que vai e o que fica,

Morre todo o encanto e todo o horror,

O carinho mais sutil e toda a agressão,

Espinhos e flores - todos eles se vão...

Meus versos são pequenos como a morte,

Toda e qualquer morte,

Todas elas são simplesmente iguais...


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Quando e talvez, 

Pragas reunidas, 

Dor imediata sem alívio,

Meu rosto sem expressão,

Talvez contentação, 

Talvez deboche,

Linhas de urbanidade

Dando em lugar nenhum,

Nem eu mesmo sei,

Nenhum de nós sabemos,

O destino é apenas um papel em branco

Que o tempo suja e amarela...


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Antes da chuva - o prenúncio

Fecham-se os céus

Como um riso abandonado...

Antes do choro - a tristeza

A receita perfeita

Para matar um coração...

Eu fecharei a porta

E não a abrirei jamais...


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Fundo Musical

 


Passeio mudo pelas ruas triste

De cabeça baixa e mãos nos bolsos

Meu relógio se quebrou

E eu o deixei numa gaveta por aí

Algumas ideias fervilham na mente

Umas absurdas outras nem tanto

Perguntas que nunca serão respondidas

Dão seus gritos desesperados

Que só eu mesmo escuto aflito

Meu sonho vem de cara amarrada

Querendo saber porque demoro tanto

E acredito em sua atitude hostil

Nunca consigo atendê-lo

Um vento bate em meu rosto

Como o hálito quente de um bêbedo

Que agora dorme sentado na calçada

De boca aberta e babando 

Todo apatia do mundo paira serena

Não quero mais recordar nada

Tudo que passou dói mais

O espinho da saudade fere fundo

Toda lembrança agora me parece

Com um ácido escorrendo 

Em minha pobre pele enrugada

Toda poça d'água no asfalto

É mais um velho espelho

Que mostra meu rosto morto

Pela mais triste das antecipações

Qual é a data de hoje?

Todos os dias são semelhantes

Em suas tristezas que tentam cantar

A canção com a letra feia

E com uma melodia mais ainda

Está quase no momento exato

Em que as cores tímidas e esmaecidas

Se tornarão cada vez mais fortes

E invadirão o ar com um certo ar

Como um certo genérico de alegria

E então eu apenas mais um louco

Dançarei o tema da eterna solidão

Mesmo que ninguém escute

Esse tão bonito fundo musical...

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Espalho Pássaros, Folhas, Nuvens e Ventos

Adicionar legenda
Espalho pássaros

Em besteiras que até esqueci

 Espalho folhas em todas as ruas

Ninguém me vê, acho que morri

Morri ontem ou morri agora

Estava tão triste que nem senti

Minha memória anda fraca

Nem sei mais o que esqueci

Onde estou, o que faço

Ou se foi nessa lugar que nasci

Até meu medo saiu correndo

E eu quase que até sorri...


Espalho nuvens

Por sobre este céu agora cinzento

Espalho ventos em todos instantes

Cada qual em seu momento

Só não quero que ele mude

E se transforme em meu tormento

Já faz dias que eu não durmo

Por isso estou meio sonolento

E por mais que não consiga amores

Eu não consigo, mas tento

Já não me importa a tempestade

De tudo  zombo e até aguento...


Espalho, espalho e espalho...

Máquina-Homem


Máquina-homem

Jeito absurdo

Homem-máquina

Cego, mudo e surdo

Máquina-homem

Que maquina

Sua própria estricnina


O dia lhe vê acordar

Cheio de medo no olhar

Cheio de contas pra pagar

Sem nenhum amor pra amar...


Máquina-homem

Sempre mesquinho

Homem-máquina

Todos juntos e sozinho

Máquina-homem 

Que falha

Construindo sua mortalha


A tarde lhe vê andando

Cheio de medo e chorando

Como um escravo trabalhando

Sem saber até quando...


Máquina-homem

Feito de metal gelado

Homem-máquina

Todo vestido e pelado

Máquina-homem

Burro de carga

Sua boca está amarga


A noite é agora

O monstro lhe devora

É quase a sua hora

Às vezes o fim demora...


Máquina-homem

Homem-máquina

Máquina parada

Mais nada...

quarta-feira, 11 de novembro de 2020

Gato Siamês, Gato Persa

 


Gato siamês, gato persa

Não fiquei azul,

Eu fiquei foi nu,

Chega de conversa!

Na crista do dia,

Caí na folia,

Fui me emocionando,

Me peguei chorando...

Vira-latas, cão de caça

Não me desespero,

Quero porque quero,

Sou rei da pirraça!

Acordei molhado,

Mas foi engraçado,

Fui me entristecendo,

Me senti morrendo...

Pomba da paz, ave de rapina,

Não passei no teste,

Seu cabra da peste,

Eu sou tão traquinas!

Não tenho dinheiro,

Não fui o primeiro,

Fui me estranhando,

Me senti voando...

Pássaro, serpente,

Eu sou quase nada,

Caí na porrada,

Mas fiquei contente!

Não há mais futuro,

Fizeram um muro,

Fui quase dormindo,

Me senti tão lindo...

Gato siamês, gato persa,

O resto não interessa...


(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Alguns Poemetos Sem Nome Número 83

 


Certamente não há certeza nenhuma

nesse mercado sem regras

onde cada mercadoria

não tem seu preço fixado

Até os amores são vendidos!

A ilusão se espalha pelo ar

feita a fumaça amarelada e cinza

de velhos cachimbos de ópio

Certamente não há certeza nenhuma

nesse mercado sem regras

onde todas as preces 

acabaram se calando...


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Eu mesmo me feri com minhas unhas

como na aflição de dias melhores

dias bem melhores do que estes

que teimam em não chegar...

Eu mesmo feri minhas pobres carnes

com os sonhos mais absurdos que tive

mordi com a maior raiva que pude

mas não senti gosto algum...

Eu mesmo me feri minh'alma

mas ela já acostumada nada sentiu...


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Nada contra modernidades

elas ficarão enquanto serem

Nada contra antiguidades

todas elas tiveram seu tempo

Nada contra atualidades

umas ferem e outras não

Tudo passa pelo tempo

só o amor é imortal...


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Eu faço e desfaço tanta coisa...

Já me arrependi de ter me arrependido

Tantas e tantas vezes...

Abriguei-me do frio

Sob o maior temporal

Enquanto te procurava em vão...

Se há  sonoras notas não escuto

E costume me atirar em fundos fossos...

Eu te procuro como um suicida

E não confessei nenhum pecado...

Eu faço e desfaço tanta coisa...


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Não tenho mais tempo...

Os últimos estão quase terminando

Entre monotonia e tédio.

Não tenho mais razão...

A paixão devora-me aos poucos

Só sobrarão meus ossos.

Não tenho mais contentamento...

Se existir um motivo para continuar

Mandem-me logo pelo correio.

Eu percorrerei as tristes alamedas

Desta solitária e assustadora necrópole

Buscando a inscrição da minha lápide...


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Eu olho o rosto dela

Tão feliz

Entre os bichos de pelúcia

Eu olho o corpo dela

E maldigo intensamente

O que o tempo

Acabou me aprontando

Eu olho a tristeza dela

Mesmo com um sorriso

Eterno sorriso

Que quer enganar

Mas não consegue

Sou especialista em desenganos

Eu olho sua alma

E lamento desesperado

Que já perdi a minha

Faz tanto tempo...


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Escreverei teu nome

Naquele céu com brancas nuvens

Para que ele dure

Até depois do final dos tempos

Eu não sei onde estarei

Nessa exata hora

Eu-demônio choro e choro...


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Eu gosto de ver o movimento

Sou inquieto como um átomo

A pedra caída nas águas

As folhas dançando nas ruas

As fogueiras subindo e subindo

Sou a plenitude do grito

Que pula da garganta

A minha escuridão

Morre por todas as manhãs

Meu sangue é um rio transbordando

Quando chove demais


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Um, dois, três

a morosidade dos passos

os semblantes fechados

o luto em variadas cores

eu me esqueci de tudo

e os outros assim o fizeram


Um, dois, três

todos os caixões pesam

levando suas vãs eternidades...


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Tamanhos


Intermináveis goles de café mesmo que frio...

 Pontas de cigarros empilhadas no cinzeiro...

O meu quarto que está todo desarrumado...

Eu acabo enxergando tudo e todas as coisas

Sobretudo quando estou cego

Sobretudo quando estou nessa contínua escuridão...

Penso na inutilidade útil de tantos outros

E tremo de medo de ser mais um deles...

Escuto palavras tão estranhas e familiares

E muitas promessas que foram quebradas...

Os meus fantasmas me acompanham

E gritam no meu ouvido que nada deu certo...

Até o que me deu alegria se acabou...

Algumas cenas são como velhas fotografias

Eu não sou apenas mais um só...

E como elas acabam me fazendo chorar...

Percebo certas verdades imperceptíveis...

O invisível tem um certo charme...

O inexistente é capaz de prodígios maiores...

Não podemos escapar de tal acontecimento

Pois a fatalidade nos comprou na promoção...

A nudez perambula pelo mundo distraída

E faz poses para as capas de revista...

Do alto dos prédios pulam certeiros

Diversos pássaros sem asa

Que se espatifarão no duro asfalto

Num  novo espetáculo mambembe...

Todo mundo agora tem pressa

Principalmente da morte banalizada...

Todo mundo agora tem pressa

De virar um número com mais pressa...

Mostrar uma moral que nunca teve...

Ser mais careta do que realmente é...

Somos apenas rebeldes falidos

E a nossa tolice ultrapassa

De longe a barreira do som...

Procuremos a falta de lógica

Que aliada ao desconforto

Chamamos idiotamente de moda...

Maldosos problemas de sobrevivência

Numa rotina inusitada qualquer...

Os dedos doem por sobre o teclado

Como um pianista que erra as notas...

Compre um real de pão e faça uma festa...

Inveje a ração do cachorro...

 que emagrece o porco

São os olhos do vizinho...

O garoto é tão feminino

Quanto qualquer outro na rede social...

Bundas e genitálias em destaque...

E o candidato honesto feito um rato...

A sociedade é um grande hospital

Mas todos os médicos estão de folga...

Tudo acaba sendo fashion 

Até os andrajos do velho mendigo...

Está aberta a temporada de caça...

O jogo de dados sobre o manto

Ainda não terminou...

Toda obscenidade acaba sendo correta...

Mesmo quando faltam doses de Bukowski...

Certas medidas valem a pena e outras não

Respeitados seus respectivos tamanhos...

Alguns Poemetos Sem Nome N° 322

O amanhã é o hoje com requintes de ontem. Todo amor acaba sentindo raiva de si mesmo. Os pássaros acabam invejando as serpentes que queriam ...