Não que eu abomine a alegria, longe de mim tal coisa. É sempre bem vinda, mas não gosta muito de aceitar convites e sempre tem pressa de ir embora, sua escassa agenda é muito cheia.
Eu não te disse? Eu não disse que era tudo poeira? Nas ruas, nas casas, na vida, em qualquer um lugar. Entrando em nossas entranhas, em nossas feridas, até nos matar.
Não que eu tenha o desespero nos meus bolsos, as trinta moedas que venderam o amigo. Carregamos a traição como uma marca que acaba nos aborrecendo, mas é assim mesmo.
Eu não te disse? Eu não disse que era tudo poeira? Nos móveis, nas coisas antigas e nas coisas novas, isso sem importar. Naquilo que queremos ou naquilo que queremos evitar.
Eu gostaria que a festa fosse hoje, fosse agora mesmo, o tempo todo, todo o tempo, sem um fim. Mas o ar se rarefaz, o motivo vira o rosto, a oportunidade desaparece.
Eu não te disse? Eu não te disse que era tudo poeira? Ela levanta de todas as formas possíveis, de todas as cores existentes, tudo o que há. Uma dor, um ardor, um gosto na boca para amargar.
Um hino ecoa pelos céus, anunciando velhas coisas que a minha memória já esqueceu, não há mais o que fazer. Minha visão já turva e agora sim, somos todos velhos, não importando nossa idade.
Eu não te disse? Eu não te disse que era tudo poeira? Pelas igrejas, pelas encruzilhadas, pelos quintais, onde todo espaço há. No meu rosto, em teu rosto, no meu e no teu verbo amar.
O consolo foi em vão, a vida caminha para a morte e um dia terão o encontro marcado, é consequência natural de uma equação feita ao acaso. Façamos um brinde sem motivo, já que só brindar nos basta.
Eu não te disse? Eu não te disse que era tudo poeira. Feche as janelas, feche as portas. não vamos nos descuidar. As flores murcharam, as folhas já caíram, as ruas vazias, só podemos chorar...
(Extraído do livro "Eu Não Disse Que Era Poeira?" de autoria de Carlinhos de Almeida).
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