segunda-feira, 24 de maio de 2021

Me Dá Um Pedaço?

Dá um pedaço de sol aí? Preciso correr algumas léguas de tempo sem imaginar cansaço, sem ver a poeira entrando sorrateiramente pelas narinas até que um dia seja sufocado de vez. Todos esperam na fila, mas nem todos sabem. Toda conclusão é apenas mais um engano que fazemos por natureza. Todo tiro acaba errando o alvo e pega no atirador...

Não precisa escancarar as janelas, luz precisa disso não. Um nesguinha é mais que o suficiente para divertidos invasores. Vamos rir do prédio que desabou, era pra isso mesmo. Os pés se cansaram, os dentes caíram, o moinho parou de moer. Nem os poetas com sua ginga conseguiram correr...

Fico na dúvida se sou palhaço ou ator, mas essa dúvida acaba trazendo consigo pelo menos uma certa certeza: quero agora, amanhã já não mais há, as risadas ou as palmas da plateia são necessárias. Mais que qualquer fast-food, anote aí, um dia cada um verá que era desse jeito e não outro...

Quando o bocado vem na boca, que venha logo o gosto, senão irei cuspir. Não sei se não chão ou na minha própria cara, isso não me importa mais como antes. A memória é um cão que nos lambe a mão antes de morde-la, o gato que roça em nossas pernas antes do arranhão. Doeu muito antes que eu o aprendesse...

Alexandre também foi o Grande antes que seus ossos fizessem o seu papel. Todos os generais já calaram a boca. E os anéis saíram correndo dos dedos e ninguém mais os encontrou. Cada carnaval virou as costas e nem deu um adeus e nem declarou um até breve de enganoso consolo...

O remendo não é pano inteiro, nunca foi e depois do erro, a bagunça já está formada. Escutaram os gritos? São de peitos que antes silenciaram suas razões até que implodiram. A minha emoção está acabando aos poucos. Não consigo mais escutar e chorar com os violinos enquanto os misseis caem sobre Gaza...

A morena gagueja sobre o caixão da filha de onze anos morta, eu me escondo até de mim atrás destas paredes frágeis. A maquiagem será um dia comida pelas rugas, jovens são velhos de um amanhã mais cruel ainda. Só a eternidade do meu choro será minha para até que tudo realmente se acabe...

Dia desses tentei sorrir no espelho e vi as falhas dos meus dentes caídos e fiquem muito aflito: Deveria chorar? Ou cair na gargalhada? Ter a certeza que todos os que venceram, um dia serão perdedores acaba consolando esse meu toque de maldade. Quem mata, um dia morre, quem agride sentirá a bofetada logo, logo...

O macaco entrou na loja de cristais para dançar um tango. Dispensou a orquestra e ele mesmo fez a música. Todo desespero é fugaz, nada vale a pena senão a ternura. Essa faca amolada que eu beijo até que meu sangue escorra até o chão. Prometo não xingar mais as chuvas e nem tentar correr dos ventos, prometo solenemente...

Qualquer dia desses eu saio andando de bicicleta ou voando sobre as nuvens, é quase a mesma coisa. Lantejoulas nas fantasias ou lágrimas nos rostos é quase a mesma coisa. Eu não tenho culpa dos meus pecados, só tenho culpa de ser eu mesmo. Não se escolhem amores, eles não estão nas vitrines, até alguns que possuem preço...

Havia tanta coisa que eu queria e hoje passo na rua sem mesmo olhar. A dor não dói mais. O destino deu com os burros n'água. Minha lápide não me assustará mais, meu epitáfio apenas mais um. Não há morbidez alguma em falar a verdade, por mais suja que ela seja...

Eu não quero nem mais o sol, como o menino olho com meus olhos pedindo esse doce: Me dá um pedaço aí?...

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