Eu quero falar. Toda hora é hora e nem vou pedir desculpas por isso. Não me venham com convenções baratas e nem com o modismo que já acabou semana passada. Eu consigo ser elegante como um paquiderme passeando entre os lírios...
Eu quero falar. Mesmo que passado o pleito não fui nem um reles candidato. Eu sou cidadão do mundo. Desconheço as cercas de arame e as linhas dos mapas. Sou mau e mesquinho como qualquer um. Mas pelo menos tento não ser. As minhas bandeiras são mais coloridas. São aquelas que secam nos varais e que minha mãe corria para pegar em dias de triste chuva.
Eu quero falar. Sou a voz de tantos que moram sob o céu. Me visto com o mesmo farrapo dos injustiçados. E faço de trono as inúmeras calçadas que a vida nos legou. Não queiram me calar. Seu esforço é inútil.
Eu quero falar. Com a rudeza dos que calejam as mãos na terra. Com a sutileza dos que manejam as cores na tela. E com o ar da desesperança dos que vivem versos. A minha voz são todas as vozes ao mesmo tempo.
Eu quero falar. Já perdi o medo dos batalhões que poderão vir por aí. Descobri humanos sob as fardas. E medos por sob todos os olhos. Me descobri como sou e isso foi mais que o bastante.
Eu quero falar. Deixem que eu xingue e esbraveje e incomode o sono dos que não possuem pena e nem dó. Eu quero tremer o teto das mansões e o piso dos apartamentos de cobertura. Eu nunca tive bons modos e já é muito tarde para tê-los.
Eu quero falar. Que meu grito derrube as máscaras. Nem todo dia é carnaval em Veneza. O carnaval é outro. É aqui quando fazemos coisas pequenas que o contentamento vem junto. Nada mais e nada menos.
Eu quero falar. Apontar o dedo em direção aos carrascos e dizer: Agora é a sua vez! Abrir a porta de invisíveis prisões e espantar os fantasmas escondidos sob encardidos lençóis.
Eu quero falar. Hoje e amanhã e depois. Todos os dias que os dias me derem de presente. Não posso esperar mais. Cato meu tempo como o velho mendigo que conta suas moedinhas para o próximo café.
Eu quero falar. Declarar meu amor pelos que sofrem. Pedir desculpas por ter feito tão pouco...
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