sexta-feira, 12 de junho de 2015

Carta ao Poetinha Número 1 ou Sobre a Arte de Criar Rebanhos de Nuvens

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Meu querido Poetinha:
Como vão as coisas por aí? Espero que bem. 
Quanto à mim há tristezas sem conta. Faltam dedos. Meu querido. Apesar dos anéis continuarem no mesmo lugar... Tristezas e tristezas. Umas preto-e-branco pela minha fraca memória. Outras coloridas porque ainda doem...
Dores são diferentes. Sabia? Umas nós gostamos. Outras não. Umas nós as procuramos. Em cada esquina que houver. Outras fugimos delas. Por sinistros e obscuros labirintos.
Tem rido muito? Espero que sim. Há tanta coisa pra se rir. Castelos que levaram tanto tempo. E que caem com apenas um pequeno sopro. Modas que são como a roupa nova do Imperador. E novidades. Muitas delas com previsíveis desfechos. Vamos rir. E rir. E rir. Porque não há nada de novo no front...
Tem chorado muito? Que pelo menos seja de amor! Um amor novo e puro. Como dias de chuva. Em que deveria haver sol. E todos os passeios ficam tão bons...
Como vão nossos rebanhos de nuvens? Cuide bem delas. São um desenho que o céu não abre mão. São lá que habitam nossos sonhos mais caros... São lá que galopamos. Como verdadeiros cavaleiros de qualquer uma figura... Para lá sobem os incensos de nossas preces mais caras. E também a fumaça de nossos cigarros. Companheiros de nosso desespero. Que morreram nas fogueiras de nossas desilusões. 
Tem se magoado muito com os homens? Não faça isso. Meu caro. O mundo é uma grande bola. E a vida um campo verdinho. Onde os meninos correm. E ralam joelhos. Tudo é assim. Do pequeno ao menor de todos... Os bravos cavaleiros também enferrujam suas armaduras. Com ou sem batalha. Cada dia é um dia. E cada dia solta seu último suspiro. Achando que poderia ter sido melhor...
E sua loucura? Como vai? Espero que bem. Boas loucuras são difíceis de se arranjar. Dessas que parecem o arder dos círios em solenes procissões. E danças ciganas em volta de alegres fogueiras. A loucura que por si só já basta. A doce loucura que ri dos vendavais. E que faz os temporais mais verdadeiros do que nunca. A loucura do menino imortal. Que vive sempre dentro de nós...
Venha me ver logo que puder... Será muito bom repartir tantos passos... E sentir o mesmo cheiro de minhas ruas. Sejam elas alegres ou tristes. Em cada uma delas poderá ver o menino que eu fui ontem. E que ainda sou agora. Rodando silencioso em amarelos dias de chuva... Isso é muito bom. A eternidade esbarra conosco em cada momento. Mas na maioria das vezes. De tão bonita. Acaba passando desapercebida...
Desculpe lá minhas muitas reticências. É que o tempo chega. Invenção boba que amedronta os tolos de plantão. Nada impede o meu desejo. Nada sufoca minha ilusão. E quando tudo parar é porque chegou o fim da cena. Que a cortina desça. Amanhã tem mais...
Como eu gosto de você... Com suas rebeldias e seus cabelos em desalinho... Pode ser até que um dia fui assim. Mas as roupas no varal já secaram faz muito tempo. E não há mais tantas alegres bandeiras. Para mim só resto o meu quintal. Mas muitos jardins esperam suas fortes mãos para poderem sorrir.
Gostaria de mandar mais notícias. Mas a minha garota de programa vai indo embora. De mansinho e sorridente. Tal qual chegou faz pouco tempo. Ela tem muitos compromissos. Muitos beijos sufocantes para dar. E presenciar muitos suicídios de peitos que não mais aguentaram um coração...
Fica bem então. Em suas curvas perigosas e magistrais. Na sua corrida de muitos sonhos. Nunca se esqueça de mim...
Daquele que te gosta tanto, 
                                            Poeta.

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