sábado, 16 de agosto de 2025

Isto Também É Poesia

Isto também é poesia... Isto é...

A primeira ave que canta quando clareia o dia

Interrompendo seu humilde sono 

Que foi em um galho qualquer...


Isto também é poesia... Isto é...

A barata correndo esquiva de um canto a outro

De um quarto quase que sujo

Para poder não ser pisada...


Isto também é poesia... Isto é...

O cigarro que morreu no cinzeiro que está pousado

Numa mesa como nave espacial

E vai ser limpo se estiver cheio...


Isto também é poesia... Isto é...

Os passos dos loucos que perambulam pelo meu bairro

Sem noção alguma porque o fazem

E até podem sorrir mesmo que tristes...


Isto também é poesia... Isto é...

As roupas velhas e rasgadas como se fossem bandeiras

Penduradas por quintais pobres

Que vestirão seus futuros cadáveres...


Isto também é poesia... Isto é...

O sorriso do menino que encontrou um real jogado na rua

Sua alegria é tão bem parecida

Como quem pode comprar o mundo...


Isto também é poesia... Isto é...

A mãe que levanta com seu filho mamando em seu seio

Para abrir a porta pro pai da criança

Que chegou vivo do trabalho no barraco...


Isto também é poesia... Isto é...

A multidão que grita protestando pelas ruas da cidade

Para que a maldade se acabe

E que todos possam ser iguais...


Isto também é poesia... Isto é...

A bondade do coração de uma puta barata de rua

Que pagou um salgado e um suco

Para o velho mendigo que nada pediu...


Isto também é poesia... Isto é...

Qualquer nota que foi escrita em sincero

Ou um coração na casca da árvore

Ou um epitáfio mais do que triste...


Isto também é poesia... Isto é...


(Extraído do livro "O Espelho de Narciso" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Folhas Para O Chá

(A vontade de ir ao banheiro, um incentivo como qualquer outro. A saudade mórbida, um sintoma do pobre paciente)...

Até o silêncio tem seus berros! Até o silêncio tem seus berros! Tem sim...

Lembro-me quase bem de coelhos que não eram coelhos, corriam num círculo desesperado em noites barulhentas, frias e inocentes que a eternidade levou e que jamais vão voltar... Fui testemunhar ocular de feitos banais e heroicos que poderiam ter valido manchetes em revistas de colorido desbotado e não foram...

Até o pecado tem sua inocência! Até o pecado tem sua inocência! Ah, tem sim...

O que fomos um dia, não o seremos mais, mesmo um segundo entra na conta dessa roda de Sansara sem karma algum... Pode rir de mim à vontade, eu não ligo, uma hora chega a sua vez de ser atingido pelo tiro da velhice e do ridículo que acerta todos sem pena e sem dó algum...

Até o medo tem seus limites! Até o medo tem seus limites! Ah, e como tem...

Nossos cinco sentidos são cinco inimigos amistosos que colocam o pé na frente e que fingem se lamentar por nossa queda, até nos ajudam a levantar... Houve a colisão de dois carros de brinquedo, acidente muito sério, como toda brincadeira sempre é, mesmo que não aparente tal fato...

Até a nudez tem seu vestido! Até a nudez tem seu vestido! Não duvide, como tem...

Acabei virando o mestre de minhas tolices mais que absurdas, porém as mais simples que existem... Um cão late lá longe, deve ter insônia, pobre coitado e eu aqui ainda posso sentir aromas mesmo inexistentes, afinal cada dia deu sua contribuição...

As folhas secas e trituradas esperam na caixinha a água fervente para o chá! As folhas secas e trituradas esperam para o chá! Ah, isso esperam, esperam sim...


(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).

sexta-feira, 15 de agosto de 2025

Tá Não?

Tá não?

Olha o gigante anão!

Quem tem dinheiro

Vai no banheiro

Limpa com a mão!


Tá não?

O gato mia feito cão!

A linda donzela

Foi na favela

Foi rodar pião!


Tá não?

Eu me casei de calção!

Quase que engulo

Olha que eu bulo

Nesse teu bundão!


Tá não?

Só quero ter um milhão!

Meu advogado

É cara safado

Me afogou no chão!


Tá não?

Vaca braba boi bumbão!

Essa foi a sobra 

Do pé da cobra

Calcinha pro varão!


Tá não?

Vou rezar pro deus-televisão!

Nós raspou pentelho

Com o aparelho

Que comprei na liquidação!


Tá não?

Filhote de blusa é blusão!

Lá vem seu Bibico

Trouxe um pinico

Pra fumar um bão!


Tá não?

Fui num cabaré fazer oração!

Achei uma meleca

Bem na minha cueca

Chorei de emoção!


Tá não?...


(Extraído do livro "Maluqueci de Vez" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Aos Caçadores de Cabeças

Cace minha cabeça

E não se esqueça

De fincá-la numa estaca no caminho

Vai ficar tão bonitinho...


Grite na escuridão

Até a exaustão

Até acabar com o meu pobre sono

Diga que é meu dono...


Me deixa sem resposta

Todo mundo gosta

Finja que não me conhece na rua

Isso é bondade sua...


Aponte  na minha cara

Se puder dispara

Agora é normal não ser mais normal

É quase um carnaval...


Me pega e pinta e borda

No pescoço a corda

Quem sabe eu precisa de carpideira

Ou outra besteira...


Cospe no meu copo

Olha que eu topo

Todo vivente é um masoquista

Chamem o analista...


Cace minha cabeça

E não se esqueça

De fincá-la numa estaca no caminho

Hoje eu quero vinho...


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

De Marca

Essa é a nulidade desde os primórdios

Nós só queremos o que não queremos

E isso é que nos satisfaz

Para onde vai tudo isso?


São esses os prédios que não são nossos

Cercados de muros feitos para desabar

O amanhã é o mesmo ontem

Onde estará nosso relógio?


Dançar sobre cacos de vidro é nova moda

O engolidor de espadas me deu um lanche

Voar como se fosse uma anêmona

Os vermes precisam ter asas?


Fazer silêncio no nosso próprio funeral

Tudo que vi e que não vi já me basta

Não há fantasmas suficientes

Quem vai apertar o botão?


Toda fama escorrerá feito água na calçada

Só as lápides testemunham as nossas sagas

Eu nem sei quem sou agora

Quem descobrirá isso por mim?


As sextas apenas são convulsões de sábados

E os domingos chegam querendo nos matar

Toda a ingratidão nos cerca

Você gosta de roupa de marca?...


(Extraído da obra "Farol de Nulidades" de autoria de Carlinhos de Almeida).

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Absoluta Mente

A vodca mais barata do mercado.

O energético também.

Nem toda a estética é pra ser entendida.

Toda razão acaba existindo.

Só conhecemos o que vem na tela.

Mosquitos matam mais do que guerra

Mas a mentira é sempre o prato do dia.

Sungas de marca vendidas na feira.

São tantos gritos.

Jogar algo fora é apenas jogar.

Nossa ignorância é sempre bem-vinda.

Todo mundo já mijou na piscina.

A fome pode ser mais triste que a morte

Mas as novelas cegam bem mais olhos.

Só conseguimos reparar na sua bunda.

É o mais comum.

Qualquer uma hora dessas o avião cai.

Vamos para a felicidade na hora do lanche.

A tumba do faraó é atração turística.

Uma nave espacial pousou  no meu quintal

Mas eu não tive tempo de fazer um rock.

Eu me xingo tanto em frente ao espelho.

Quase um costume.

Uma tontura chega quase de mansinho.

Há muitas palavras que eu me esqueci.

Nem me lembro mais quando bebi alguma.

A minha mente não deixa rastros

Mas só vez em quando fico rindo sozinho...


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Alguns Poemetos Sem Nome N° 357

Tudo muda

Nada muda

A aparência é simples engano

Somos as mesmas crianças

Como sempre fomos e seremos

Temos estrelas

Somos estrelas

Só os lugares é que mudam

Ainda não percebeu isso?


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Ainda bem que eu quase não passo mais lá. Meus pés estão cansados. Minha alma está cansada. Bastam as tristezas que os dias me dão de presente. Mesmo que o mar fique no final da rua. Isso já importou. Não me importa mais. Importa para tanta gente. Não eu. Os bolsos estão tão cheios de lembrança. Portão fechado. Plantas invasoras. Janelas escancaradas ou arrancadas, Tanta poeira, entulho e lixo. Os anos se passam. O apetite do tempo é tão voraz. Não posso fazer nada, ninguém pode. Ainda bem que eu quase não passo mais lá...


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Minha rua se chama silêncio

No inverno até os medos se recolhem

Se porventura chove cada gota dói

As lâmpadas dos postes pouco fazem

Qualquer barulho jaz sufocado

Escuto um avião passando ao longe

Mas ele também já foi embora

Minhas pálpebras ainda pesam

Mas permanece a dúbia teimosia

De continuar em frente ao computador...


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Aconteceu? Virou acontecimento! Eis porque o nada se transforma em alguma coisa. Uma palavra ecoou no ar - acabou o silêncio. Um pássaro cantou - eis uma cantoria. No primeiro olhar nasceu o amor - eis o novo romance, ocorrendo ou não. O primeiro suspiro ou o último - eis uma história. Aconteceu? Virou acontecimento...


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Quantas vezes terei de repetir que te amo?

E que a impossibilidade desse amor é apenas detalhe?

Que não queria invadir sua vida mas que você fez isso comigo?

Quantas vezes terei que fazer o mesmo verso?

E terei de dizer que não preciso de asas para voar?

Quantas vezes os meus sonhos irão me ajudar a fazer isso?


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Toda normalidade acaba sendo excepcional. Todos os passos dados ficam registrados. A mesma luz do sol que ontem iluminou continua seu caminho. Somos grandes enganados. Nada realmente acaba. A eternidade sabe se disfarçar muito bem. Tolos é o que somos. Nem percebemos que a vida registra todas as cenas...


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O espelho é meu amigo...

Não fala nada, nunca me criticou...

Tão solidário!

Se rio, ri comigo;

Se choro, também chora...

E nunca reclama

Quando vou embora de repente,

Sem lhe dizer um até logo...

Isto Também É Poesia

Isto também é poesia... Isto é... A primeira ave que canta quando clareia o dia Interrompendo seu humilde sono  Que foi em um galho qualquer...