segunda-feira, 8 de dezembro de 2025

Contenda de Perguntas e Respostas Entre O Ser e Um Espelho

- Toma cuidado, muito cuidado. Nem sempre me farás perguntas e quando eu responder, minhas respostas te trarão satisfação alguma...

- Como assim?

- Mau começo este teu, não questione meus métodos, fui feito para permanecer em silêncio, sendo este malvado ou não. Nada depende de mim, não sou eu que faço tua tristeza ou tua alegria. Notaste que fico no canto em que me deixaram e que o tempo também há de acabar comigo aos poucos?

-...

- Eu aos poucos apresento manchas que acabarão tirando minha nitidez, assim como todos os seres acabam trazendo suas rugas tanto de velhice quanto do gasto, sendo este necessário ou desnecessário...

- Mas porque isso acontece?

- Bela pergunta! Se não fosse tão óbvia e por esse motivo, tão idiota... Por acaso não observaste o começo de todas as coisas? Tudo começa a acontecer da melhor forma possível e depois... Ah, depois, meu pobre amigo, transforma-se no que chamamos de final... Olhe em torno, talvez entenda melhor...

- Me dê um exemplo, por favor...

- Um exemplo? Poderia te dar dezenas, centenas, milhares deles, milhões até, já que tudo nesta roda é parecido, mas nada é igual. Imagine só, um breve passeio neste seu bairro... Imaginou?

- Sim...

- Pois bem, imagine que está passando na porta do boteco da esquina e por um motivo que não importa, ele está agora lotado. Esqueça para isso, qual o dia da semana ou o horário, pouco importa para o que eu quero dar como exemplo...

- Está lotado...

- Imagina agora que estão todos bebendo...

-  Estão todos bebendo...

- A maioria, senão todos, estão bebendo algo de algum teor alcoólico.

- Alguns, ficarão embriagados, outros um pouco tontos...

- Exato! E enquanto isso, alguns também se envenenarão, complementando sua bebida com tabaco... Continuando o que eu pedi para que notasse, imagina que alguns são do gênero masculino e outros do feminino. Imaginou?

- Sim. Mas e aí?

- Aí que está, meu caro amigo, aí que está!

- Não entendi...

- Pois bem, veja só, é um boteco, um bar, uma birosca, um botequim, uma barraca, seja o nome que seja dado. O que estão fazendo?

- Bebendo...

- Isso é bom ou é mau?

- Creio eu que mau...

- Mau por que?

- Porque o mau geralmente não traz nenhum benefício à saúde...

- Concordo plenamente, concordo plenamente... Mas se não faz bem, por que estão bebendo? Por que estão gastando seu dinheiro (que sabe-se lá como obtiveram), seu tempo e sua saúde?

- Talvez por vício ou ainda, por outro motivo...

- Boa resposta, boa resposta... Mas não totalmente exata...

- ?

- O vício, na verdade, pouco importa. Veja bem, não estou defendendo ninguém pelo motivo de beberem, quero apenas mostrar o porquê pedi para imaginar tal local e circunstância.

- Prossiga.

- Então. Agora façamos o inverso...

- Como assim?

- Pois bem, o boteco não existe mais, a pequena multidão não há também. Agora existe cada ser, seja qual formos imaginar, chegaremos no mesmo ponto...

- Ainda não entendi...

- É simples, muito simples mesmo. Por exemplo, vou escolher um deles, aquele ali mesmo serve. Está bem?

- Pois não...

- Olha seus cabelos brancos, sua barba malfeita, sua roupa não muito nova e nem muito limpa, seus dentes um pouco cariados, suas unhas já pedindo para serem cortadas e sujas também...

- Continue...

- Seus chinelos já um pouco desgastados, sujos como o resto do conjunto. Talvez tenho no bolso um celular que comprou de segunda mão, para ser igual à maioria que existe por aí. De vez em quando ele entra nas redes sociais para rir daquilo que tem que rir, mesmo que não ache tanta graça assim...

- E...

- Agora observemos mais um pouco. Suas mãos cheias de calos, por conta da profissão que possui - é um pedreiro, por exemplo.

- Um pedreiro...

- Sua idade pouco importa, se sabe ler e o que leu até agora, não interessa. Não interessa para quem ele fará alguma obra, só interessa o que vai construir e se por isso alguém pagará um preço quase justo e se não será sacaneado por ele, o que alguns pedreiros acabam fazendo...

-...

-  Hoje ele é só isso - um pedreiro. Que mora numa casa em alguma rua deste bairro, desta cidade, deste estado, desta região, deste país. deste continente, deste planetinha.

-...

- Que possivelmente foi traído pela mulher ou por um irmão ou por um amigo. Que já sofreu como a maioria na mão de políticos safados, corruptos, ladrões. Que até agora teve que ir algumas vezes ao cemitério levar algum parente, amigo ou até um desconhecido... Que sabe que um dia chegará sua vez, mas mesmo assim nem gosta de falar nesse assunto...

- Aonde quer chegar?

- Aonde quero? Simples, muito simples... Ao inverso...

- Como assim, o inverso?

- Veja bem, o que eu pedi para que fosse imaginado, é certamente o final. Olhemos o começo. Ele, todos os seres humanos, apenas crianças, que começaram sendo amparadas, cada uma ao seu modo. Algumas em barracos, outras em casas comuns, em casas mais suntuosas ou até em palácios. mas amparadas. Chorando quando queriam alguma coisa, queriam comer, estavam sujas queriam dormir ou sentiam algo desagradável...

- Crianças...

- Sim, crianças, apenas isso, crianças, nada mais do que crianças... E o tempo foi então passando, a maldade, a tristeza, a solidão, todas essas coisas acabaram vindo. Umas viraram assassinos, outras ladrões, outras miseráveis, outras inúteis, outras putas, a ralé do mundo. Enquanto isso outras conseguiram algo menos ruim. E preste atenção: não melhor, apenas menos ruim...

-...

- Um dia todos irão embora, seres e coisas. Para onde? Os homens tentam responder isso. Mas quem realmente o saberá?

- Triste, mas verdadeiro...

- Ah! Agora entendeste o porquê não gosto de responder perguntas? Mesmo assim entendeste a minha resposta?

- Acho que sim...

- Então, faz logo o que vieste fazer. O dia já veio, eles nem sempre são amigos...

Alguns Poemetos Sem Nome N° 364 *

Todas as vezes que falo

acabo falando sozinho, é assim mesmo...

Espelhos não respondem, 

são tímidos demais...

Estrelas nem me olham,

elas têm mais o que fazer...

As nuvens também ficam caladas,

não gostam de dar respostas...

As ondas queriam me responder,

mas não ouviram a pergunta...

Todas as vezes que falo

acabo falando sozinho, é assim mesmo...


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O amor nos escolhe, 

Nós nunca o escolhemos...

Ele geralmente apronta tocaias

E acabamos feridos...

Aqueles que deram certo

Só são propagandas para nos enganar...


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Ainda guardo um bilhete

Em que você disse finalmente

Tudo o que deveria ter dito antes...

Pois é, acontece isso,

Você acabou indo embora

E que deixou escrito

Parecia com tiros na minha execução...


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É que eu perdi o medo,

Principalmente das coisas 

Que deveria ter bem mais...

De que adianta ter medo da escuridão?

Minha alma consegue ser mais do que ela...

De que adianta ter medo da tristeza?

Ela consegue ser mais alegre do que eu...

Por que tentar acabar com a solidão?

Faço dela uma companhia como qualquer outra...

É que eu perdi o medo,

Perdi até medo do medo...


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Em qualquer lugar do mundo,

Em qualquer,

Flores resistirão aos bombardeios,

Crianças brincarão mesmo entre destroços,

Suspiros serão dados por amores eternos,

Ideias novas acabarão surgindo,

Malvados fecharão os olhos para sempre,

Em qualquer lugar do mundo,

Em qualquer...


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Não tenho culpa, não temos culpa,

Mesmo sabendo não imaginamos

Qual será a hora exata que acontece...

Achamos que a mocidade ficará conosco

Enquanto fazemos algumas brincadeiras

De extremo e malvado mau-gosto

Até que chegue a nossa vez...

Eu tenho culpa, nós temos culpa...


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Toda a simplicidade acaba sendo complicada

Porque forçamos caminhos que inexistem...

Quem somos nós para inventar cores?

Toda a ternura acaba nos machucando

Porque queremos o que nem sempre há...

Quem pode mandar no amor que manda?

Toda luz acaba sendo a nossa cegueira

Porque nem sempre o dia acaba sendo bom...

Por que nos esquecemos que há noturnas aves?...

Nunca Saberemos (Miniconto)

Nunca saberemos, isso é bem certo. O tempo nos separou, querendo ou não. Eu daqui faço perguntas sem obter respostas, fecho os olhos e reclamo que o dia é mais uma noite. Tudo envelhece e a tristeza fica por nossa conta. Todos os velhos passaram por pontes que agora quebraram. Assim como os culpados um dia foram inocentes. Poderia ficar falando nomes (alguns inventados, outros não) até o final dos tempos, ou pelo menos, o final dos meus tempos... 

sábado, 6 de dezembro de 2025

Sem Mergulho

Me ajoelhei numa beira de rio

Coloquei minhas mãos em concha

E acabei bebendo toda a sua água...!


Não vá mais para o oceano

Fique aqui dentro do meu eu

E só saia suando ou chorando...!


Abri as asas que nunca tive

Bati duas ou três vezes treinando

E pulei do abismo logo em frente...!


Voar é uma das coisas mais fáceis

Ainda mais quando se tem desejo

Ou a fantasia chega sem licença...!


Fiz um carnaval de um somente

Mais ruidoso do que um exército

Que marcha sem escolher o asfalto...!


Nunca mais escolhi qual o mês

Desconheço qual é o dia da semana

Ou se minha alegria é boa ou má...!


Brinquei até que pegasse no sono

Para nele continuar a brincadeira

Antes que a manhã viesse me ferir...!


Todos os medos que acabei sentindo

Grudaram em minha pobre pele

E viraram cicatrizes bem mais bonitas...!


Escrevi estes versos como muitos

A maioria deles acabei me esquecendo

Versos que serão lidos só por acaso...!


Eu tenho o tamanho de todos prédios

Mesmo sendo menor que uma formiga

E quase que me afogo sem mergulho algum...!


(Extraído do livro "Escola de Mortos" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Alguns Poemetos Sem Nome N° 363 *

Estamos cegos enxergando tudo

O barulho incomoda nossa surdez

Nossa impaciência sabe esperar

Nossos segredos são publicados

Toda tecnologia nos deixa primitivos

O riso é quase sempre chorado

É por isso que somos humanos?


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Eu já vi tudo que não gostaria ver

Fui testemunha de crimes inexistentes

Provei do último pedaço dos carnavais

Fogueiras apagadas me queimaram

Amei o ódio com solene convicção

Ri sem motivo pela mais simples praxe

Sou apenas mais um célebre desesperado

Em que até as palavras me deixam tonto.


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Era um dia de festa e eu não sabia

Meus cálculos eram exatamente opostos

Quase me afoguei em um mar inexistente

Acompanhei rios que estavam secos

Sonhei com as águas mais improváveis

Apontei para todas as estrelas possíveis

Virei as costas para a fé e fui andando

Quis devorar as mais inocentes quimeras

Era um dia de festa e eu não sabia

Geralmente choramos quando nascemos...


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Não faça indagações...

Esqueça as perguntas...

As respostas geralmente ferem mais...

Nunca ajude a tristeza...

Se ela chegar que venha sozinha...

Nós não a queremos nunca...

Lembre apenas do que vale a pena...

Dos gestos mais ternos possíveis...

Dos muitos sonhos que temos...

Não faça indagações...

A verdade sempre chega...


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Eu quero dançar! Eu quero dançar!

Perto do fogo ou dentro dele!

Pouco me importa aonde vai ser...

Eu quero voar! Eu quero voar!

As asas eu mesmo arranjo!

Voar em abismos ou em céus...

Eu quero gritar! Eu quero gritar!

Mesmo acordando a vizinhança!

Será um grito ou meu canto?...


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Esse é o espelho. Um bom ouvinte.

Um bom observador também.

Fale para ele todas as suas dores

E mostre como o tempo é malvado.

Não espere resposta alguma dele.

Sua timidez é muito grande.

Ele permanece calado o tempo todo.

A única coisa que você fazer é confessar.

Não se despeça dele em hipótese alguma.

Ele prefere que você acabe voltando...


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Quero evitar ter ciúmes dela...

Afinal de contas não tem culpa de sua beleza.

Quero ficar bem perto dela...

Mesmo que isso signifique que lhe incomodo...

Quero rir sem motivo algum...

Isso faz parte da minha loucura incurável...

Quero poder lhe trazer um carnaval...

Um carnaval meio diferente e quase eterno...

Quero morrer perto dela...

Porque assim quem tem amor nunca morre...

Carliniana CXXIII ( Teoria Geral dos Beijos )

Tudo semelhante diferente sempre é...

Por tal fato joguemos milho aos pombos

Numa despreocupação mais preocupante 

Como quem tem que contar as gotas do mar

Antes que todas as estrelas sejam desligadas...

Todo silêncio acaba mais gritando...

Lá vem nossa maior convicção sem ter fé

Com vários nomes que acabamos esquecendo

Enquanto o tempo vai rasgando nossas roupas

E as nossas cicatrizes agora são mais comuns...

Nosso tesão acabou indo embora...

A casa grande e a senzala estão carcomidas

Enquanto senhores e escravizados repousam 

Engolidos pela mãe que um dia pariu todos

E que não dá declarações nos vãs noticiários...

Bondade e maldade são feijão e arroz...

Sem palhaços não existem tais folias de reis

Aquela inocência restante não será preservada

A nudez desconhece todos os existentes castigos

E os ventos agora estão fracos demais para algo...

Eu morri anteontem e só hoje me dei conta...

Minha memória é uma pedra perdida pelas ruas

Estou quase me mudando e indo morar em nuvens

Nenhuma poesia é o suficiente para a minha fome

Eu sou o estranho que estranha a estranheza...

Cuspo no chão molhado tentando imitar lágrimas

Deveria ter beijado todas as bocas ao meu alcance

Mesmo que isso tivesse cheiro de heresia e profanação

Afinal de contas nem todos os pecados são crimes...

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Filosofia Pura

Até o que foi morto não morre

O que está parado é o que mais corre

Quanto mais cego é que enxergo

Quanto mais digo não é que não nego

O que vem de mim eu não conheço

Tudo que é de graça é que tem preço

Tudo que se desconhece endereço...


Não existe bala perdida só tem achada

O que tem valor é que não vale mais nada

A beleza é só o fruto de um feio acaso

Quando eu chego na hora é que me atraso

Cada barco ancorado não tem proteção

E o dono de cada dia presente é o Cão

E quem manda em toda a fome é o pão...


O ano que vem vai matar o atual ano

Ninguém sabe aí qual o nome do fulano

As cadeiras da morena não são para sentar

Toda rua pode parecer que é o nosso lar

O arranha-céu não pode arranhar nada

Quem não sobe nunca na vida é a escada

O palhaço é que nunca faz palhaçada...


A cabeça que não pensa é a do prego

Quanto mais eu não aceito é que relego

Nem toda vida é parecida com a novela

Não existem todas as cores numa aquarela

Nem todo remédio vem trazendo a cura

Nem toda fruta que se come já está madura

Nem toda pura filosofia é filosofia pura...


(Extraído do livro "Farol de Nulidades" de autoria de Carlinhos de Almeida).

Contenda de Perguntas e Respostas Entre O Ser e Um Espelho

- Toma cuidado, muito cuidado. Nem sempre me farás perguntas e quando eu responder, minhas respostas te trarão satisfação alguma... - Como a...