quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Num Dia Desses


Num dia desses...

Calçadas cheias e mesas vazias. Eternamente o ar está parado ou até bem mais. Esqueçamos nossos pecados, já estão pagos com nossas lágrimas. Nossos sonhos nos perseguem como incômodos mosquitos zumbindo em nossos ouvidos. A riqueza ri de pura crueldade. A morte tem paciência ou não. Toda inocência é feita de vidro. E somos atores falidos tentando encenar uma normalidade inexistente. 

Sou o mais exibicionista de todos. Exponho meus sentimentos mais do que a novinha mostra a bunda no baile. Hoje era folga dos leões e Daniel aproveitou para escrever seu novo romance. Na claridade falta qualquer clara idade. O fundo de qualquer coração é tão traiçoeiro quanto um poço. 

Eu faço uma pausa para o café e envenenar-me mais um pouco. A velhice traz mortais sonos para minha pobre agenda. O exotismo é uma banalidade como outra qualquer. E a mediocridade é apenas uma genialidade mal entendida. 

O que resta de mim se debate inutilmente como quem se afoga numa poça d'água. No meu funeral façam o tradicional - abram cervejas e contem piedosas mentiras.

Todo poder é um 38 na mão de uma criança. Uma simples discussão pode acabar com aquilo que nunca foi visto. Um urubu perdeu o tino e acabou caindo na Brasil.

Tento aproveitar certas memórias como quem mata folhas para o chá. E grito parecidamente como o bebê que está cumprindo horários. O feiticeiro rogou suas pragas, mas acabando de escrever o endereço. O sucesso é o fracasso que fracassou. 

Não há mais nada que reclamar, o motor deu pane. A queda do avião e da ave foram bem parecidas, lamentemos tal incidente. Está dada a partida, só não há mais chegada. Isso porque o rio doce já se fez amargo. Os ossos do barão preparados estão e as cumeeiras todas em prontidão. 

Muitas palavras e talvez discreto silêncio de altas vozes. A poeira se acumulou em minhas dores. Numa grande comoção coletiva de saltimbancos de uma tecnologia sem limites limitadamente infame. Eu possuo vários nortes em um somente. Uma piada sem sentido me fez rir muito ontem. Puro carisma. 

Meu dicionário lotou-se de neologismos brilhantes como um velho calendário de curiosidades. Serenamente a minha mente é serena. Palitos de bambu e futuras torturas fartas de solene espera. A conversa cessou e eu acabei chorando. Envelhecimento precoce e memes tão geniais.

O sol agora ferve em seu caldeirão de talvez bruxarias. E um vento quase fresco quase relembra uma ou outra agradável memória. Como em velhos livros infantis de falsas cores. Algumas já esmaecidas demais para serem recuperadas. Eu espetei meu dedo e o sangue caiu no chão. Chorar é muito pouco agora.

Foi num dia desses...


(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).


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