terça-feira, 10 de novembro de 2009

Uma Outra Casa: Bagunça

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Não pensem diferente. Que pena... Se a roda do tempo rodasse para trás, bem queria falar outras palavras e mostrar meu rosto. O rosto diferente do que na verdade conheceram.
Não fui o anjo, fui o demônio acorrentado em suas próprias correntes. Anjos, eram os que me cercavam e que pensavam desta forma.
Sentado junto com meu amigo ou, às vezes, sozinho como era meu peito, fui o melhor dos melhores, santo dos santos, exemplo a ser seguido, mas somente para os que queriam aparentar.
Não fumei os cigarros escondido no banheiro. Mas o quiz fazer e até hoje compenso não largando este meu vício tardio. Não namorei nem bolinei nossas queridas meninas, que hoje carregam a santidade das boas famílias, enquanto eu, anjo negro, carrego comigo a triste sina de desejá-las em mórbidos versos. Não fui o bem sucedido senhor da sociedade, mas o feiticeiro em versos ou gestos, que cantou sonhos e sonos de morte.
Aproveitem senhores, enquanto podem, na mente dos que riram as fantasias nunca acordam. Mas outros, como eu, que só choraram, hão de guardar eternamente o que passou. Nada disso já lhes pertence, mas até a sua vida agora é nossa. Uns conviveram com os vivos, outros guardam os mortos.
Confesso crimes inomináveis, que só eu mesmo podia cometer.
Meu amigo tomou três dias de suspensão e um grande puxão de orelha porque, delator, disse para a inspetora que eu tinha levado para aula uma revista pornográfica (só não contou que a denúncia vinha pelo fato de não ter emprestado). Eu não tinha, fui obrigado ao vexame, de melhor aluno de toda a escola, colocar todo meu material em cima da carteira para ser examinado.
Mas confesso agora: tive sorte. Não a levei naquele dia, ela estava escondida na estante que meu pai colocou no meu quarto porque tinha mais livros que um menino comum da minha idade. Mas que a possuía e a tinha levado, isso sim. E se ele mereceu e teve uma suspensão, também merecia e não tive.
Ana, não sabes, quando no velório de nossos segundos pais, a minha alma ficou um pouco mais leve com essas palavras:
- Desculpe meu amigo, se soubéssemos que você era assim, teria lhe convidado para tudo que nós aprontamos...
Eu perdi, sim perdi tudo, mas guardarei na alma a certeza, que mesmo separado, fui e me sinto um de vocês...
Mais bagunças vou contar, calma, espera o tempo.

Uma Outra Casa


Não me lembro bem como foi. Mas me lembro das palavras do meu pai que também já foram faz muito tempo.
Foi em maio, quando fazia sol (maios fazem sol?) e eu passeava na cadeirinha da bicicleta. Era na frente da igreja naquela época e eu entrei no meio das outras crianças. Fiquei.
Durante muito tempo foste uma outra casa. Uma casa aonde ia muitas vezes alegre e muitas mais triste.
No começo – eram duas salas de madeira, de onde mesmo alguns traços guardo no sótão da memória, onde existem tantas outras coisas queridas e empoeiradas.
Depois, em outras tantas salas de madeira também, mas em outro lugar.
Um dia, era férias quando tudo começou, ao voltarmos surpresa, salas novinhas de cimento e as mesmas velhas carteiras de dois lugares, pesadas, de madeira escura e algumas ainda sem a parte de baixo para colocar o material.
E assim foi crescendo. E eu gostava lá de cima, o mesmo tanto que detestava ou tinha medo das escadas.
No começo, só o pátio, onde podíamos provar a certeza da Relatividade, quando um mundo se fazia em alguns metros quadrados. Era bom. Mesmo quando chovia ou meio que afobados para entrar na sala de aula (para que o tempo passasse mais rápido) cantávamos o Hino Nacional como bons e inocentes filhos da ditadura.
Me lembro ainda não como pessoa propriamente dita. Mas alguém ou alguma coisa que usava uniformes.
O do Jardim de Infância (onde fiquei por quatro anos por falta de idade) eu nunca gostei porque não sei por que era parecido com um vestido e nada tenho contra eles a não ser usá-los. O quadriculado não me importava. Ele foi parte de um bom tempo da minha vida que fazia até a vez de pele.
Sim. Aí sim. Fiquei contente quando pude colocar as calças curtas (as outras ainda levei um tempo para colocar) e a camisa do mesmo quadriculado azul e branco com o emblema no bolso. Um símbolo que talvez faça falta ainda hoje.
Era bom e eu não sabia, assim como deve ter sido para muitos. Ser vigiado ternamente pelos outros “pais”, que queriam que não víssemos com a nossa malicia inocente as pernas das meninas.
Nos dias de sete de setembro, ainda no azul e branco, carregar bandeirinhas de papel com hastes de bambu que quase sempre quebravam no final e comer sanduíches feitos com sinais de mortadela e beber sucos que tinham uma cor longe e que com alguma imaginação tinha açúcar.
Um dia cismei e maravilha das maravilhas – fui tocar surdo na banda. Só pelo fato de estar ali compensava certos sacrifícios – perder algumas matérias e depois copiar a matéria do Geraldo Cézar com sua letra mais horrível que a minha, ficar com a marca do cinto de couro no ombro, usar baquetas que deixavam ao mais descuidado farpas pequenas nos cantos das unhas, invejar os outros instrumentos de quem sabia tocar melhor do que nós principiantes. As vantagens? Faltar às matérias que depois eu copiava, usar a calça azul com o tênis que doía a ponta dos dedos e a camisa branca de meia com o símbolo da escola, além, é claro, maravilha das maravilhas, a boina vermelha que meu pai comprou.
No ano seguinte meia decepção. Quando podia trocar para a caixa, caminho para o tarol, descobri no primeiro dia que nada podia fazer, já que, definitivamente, só meus ouvidos nasceram para a música, mas as mãos não.
Aí, destino cruel que nem o resto, achei melhor passar para o bumbo e depois carreguei bandeiras.
Essa foi a outra casa. Que falarei tantas outras vezes. E chorarei também, como muitas outras coisas.

Espaço

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Na primeira noite em que dormimos, eu não sei. Sei que o cansaço não vinha dos pés, mas do meu peito. Lá fora, um vento que presumo existia fazia um coro como as carpideiras de um antigo funeral, mas confesso que gostava. Como gostava de coisas e coisas que não percebia e que hoje fazem falta.
Doces comidos sentados numa calçada quando em visita, brigas de família resolvidas com e sem sutileza. Óculos e dores resolvidos no gás. E mais não sei que muito me valiam.
O menino era pequeno, o espaço era grande. Um espaço que distanciava o que não se podia medir e até hoje se torna em luta para poder descrever.
Como um avaro eu conto e reconto cada moeda. E me dou por feliz por não enlouquecer por demasia.
A casa que tínhamos era bem pequena. Mas era todo um mundo. No portal o mesmo Sagrado Coração de Jesus com seus misteriosos furos e depois da luz elétrica incontáveis pontos.
No quintal os três pés de coco, o da frente era do meu pai, o perto do poço era o meu e o outro da minha mãe. Perto do coqueiro do meu pai, parecia até coisa de livro, o pé de laranja lima que chorei quando acabou morrendo.
O poço que meu pai tirava água e quase perto a moenda de cana, debaixo da caixa d’água que não me lembro de ter sido cheia alguma vez.
A primeira casa era simples. Uma sala onde estava um rádio azul, o banheiro que abria para a sala e tinha o piso mais alto e quarto. Na sala um sofá azul que meu pai trouxe de Niterói e tempos depois a televisão preto e branca, que no dia de sua chegada, me lembro de ver o caminhão na nossa rua para trazê-la e vim correndo na frente para poder avisar. Aí, já era tempo de luz.
Depois disso, mudamos para uma pequena casa, em frente à escola, enquanto meu pai aumentava nossa casa. Era um tempo de frio e costumava dar mofo nas roupas que não secassem ao sol. Nesse tempo, via o Capitão Aza e sonhava com as incontáveis festas juninas que afinal foram uma ou duas nem me lembro bem.
Voltamos. E tu casa que não me pertence mais, mas que permanece fechada, tinhas crescido talvez mais que o menino. Ganhei um quarto onde também ganhei sustos. Havia agora uma sala maior e uma cozinha e um forro onde fui uma ou outra vez pela escada e confesso que senti medo. Como também senti quando tuas janelas se fecharam e a febre do sarampo quase me consumiu de vez.
Saímos de novo. E permaneceste vazia. E agora, já não mais na frente da escola, mas sim ao lado, vivi meus primeiros amores e desatentos. Nunca, nunca pequena casa, me senti tão mais pequeno do que eu era e nunca senti tanta saudade ao mesmo tempo. Saudade de ti, minha princesa, saudades de todos os meus amigos, saudade até do meu primeiro gesso, saudades suas primo e de nossas brigas, saudades de que mais foi ao vento.
Depois voltamos a nossa casa e depois de tua morte, pai, saímos de lá. Mas passados tantos tempos, ainda sonho que vives (ou vives mesmo?) e estamos lá no mesmo lugar esperando o final dos tempos...

Todos os Nomes


Nomes feios ou bonitos, mas sempre nomes. Não nomes feios desses que a gente fala em várias vezes. Mas feios porque diferentes para nós e não para os outros. Mas como ia dizendo, nomes.
Nomes no balanço do vento que nem barquinhos na água. Alguns que eu amei, outros que não. Mas sempre nomes. Alguns lembrados, outros esquecidos pelo consciente, mas todos ainda no mesmo lugar.
Nomes que foram só porque foram, nomes que foram e eu não queria, nomes que esqueci e nem deram adeus e outros ainda que eu vivo neles.
Nome da primeira vida. Nome da primeira de muitas idas. Nome do primeiro amigo, do primeiro irmão e do primeiro cúmplice. Nome da primeira e das outras amadas também.
E nomes de coisas que dizem não ter nomes, mas acabam por si só tendo. Nome das cores e em cada uma delas. Nomes das ruas e do tempo.
Por onde anda tanta coisa se nunca foram de mim?
Caso encontrem-nos por aí (e a tua piedade for maior que meu pesadelo) perguntem por mim o que é que houve. E me tragam a resposta mesmo se já for tarde.
Perguntem à chuva por onde anda. Perguntem ao sol onde ele começa. Perguntem ao amigo se ele existe. Perguntem pra amada se ainda tenho chance. Perguntem ao colega se agora eu posso brincar. Perguntem se ainda existe um lugar na roda para mim.
E se te perguntarem quem mandou perguntar diga-lhes que não sabes meu nome, não porque não te contei, mas porque não perguntaste por saber bem quem sou eu. Eu sou aquele que vive em cada peito enquanto cada um vive em mim. Aquele que chorou mais do que riu, mas que não se arrepende de ter rido e que rirá quantas vezes necessário for. Mas se ainda assim te perguntarem, diga que meu nome não pode ser dito e apenas lido e quando perguntarem onde indique as nuvens.
Outros, meu amigo, outros nomes e outras cores, leia até o final e descobrirás que somente se resolveres meu enigma eu te direi, mas se não, te devorarei no mesmo espaço...

Alguns Poemetos Sem Nome N° 322

O amanhã é o hoje com requintes de ontem. Todo amor acaba sentindo raiva de si mesmo. Os pássaros acabam invejando as serpentes que queriam ...