domingo, 16 de julho de 2023

Quase Veneno

Estou estendido

estatelado e caído

usando palavras e letras que quiser

A falta de palmas não faz falta

e miraculosamente das regras foram-se

Tenho saudade de alguns outros tempos

em que o nada era quase tudo

Livros para bordar

Agulhas sem pontas

e alguns milagres corriqueiros

A vinha vinha e não veio

e a ampulheta quebrou-se na mudança

Acertei um tiro que não mirei

minha gaveta anda tão cheia de saudades

Roubei de mim as alegrias

como o xamã que errou no feitiço

e fez brotar morango entre couves

Quebrei sem querer o sino

e achei graça nas bochechas de Maryana 

Os coqueiros agora dançam

enquanto abacateiros são tímidos demais

O metal só sorri em brinquedos

eu perdi todos os que eram meus

até que me tornei um deles

O teto da senzala logo irá cair

mesmo que um certo nervosismo

faça-me confundir todas as cores

Conheço todas as bandeirinhas da festa

e todos os gostos passaram pela minha boca

Nada contra o sábio

mas eu me tornei um tolo

porque faltavam vagas para idiotas

Na lua acenderam um lampião

enquanto os ventos contam anedotas

que só falam de coisas sérias

Sou o rio que tem pressa

apenas quando isso significa calma

Tudo é quase veneno

e eu só quero mesmo é dormir...


(Extraído da obra "O Livro do Insólito e do Absurdo" de autoria de Carlinhos de Almeida).

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