quinta-feira, 2 de julho de 2020

De Leve Número 4 ou Tudo


Tudo que é nosso não acaba. O que não é já começou no fim. As aparências furam os olhos dos pássaros. E os paradoxos mais verdadeiros do que aparentam ser. O hoje é um ontem teimoso que insiste em estar e o amanhã um grande preguiçoso que anda em passos pesados e lentos.
As pequenas coisas são grandes perdas. Desconhecer isso é seguir as instruções dos mais sórdidos manuais. A maior parte das queixas surgiu da nossa camuflagem que falhou. Atiramos errado e acertamos errado. Só existe um alvo e quase sempre nem o vemos porque os espelhos não colocam comerciais no horário nobre da TV.
Tudo o que queremos será destruído. O que tem preço nem sempre tem algum valor. A estética parece ser passageira e existem outras bem mais rápidas. A ternura marca mais que as tatuagens e o afeto constrói mais castelos que as pedras. O poder do amor dá medo para todo aquele que o conhece.
Notícias boas ou más são esperadas com relativa apatia. Somos bons atores em nossas admirações. Tentar não rir da piada é uma forma desesperada de niilismo. A pedra foi lançada e caiu no lago. Todo inevitável traz questões bem interessantes. Mas quase nunca nos interessam.
Minhas dores são boas parceiras dotadas de sinceridade excessiva. Meus pesadelos são bons porque acabam e meus sonhos são desapercebidamente cruéis. O pobre não tem aquilo que o rico não terá mais um dia. A hesitação da felicidade é o fim desta.
Se tivesse algo contra quem chora nem me cumprimentaria. Todo esforço depende de si próprio. O acaso estuda bem todas as situações antes de dar qualquer passo. Descobrir nossos erros é o maior sinal de bom senso. Todas as pistas levam ao crime.
As formigas são bons exemplos de como detalhes podem salvar ou não. Pois a importância e o tamanho nem sempre estão em entendimento cordial. Quando tudo vai bem devemos suspeitar de qualquer coisa. O pintor sempre suja as mãos quando pratica seu ofício. 
Quando morrer não quero choro e nem quero risos. Os mortos não querem nada. Possuem tudo. O esquecimento total é uma grande mentira. Todas as ações continuarão exercendo sua influência até que todas as estrelas se apaguem nos céus. Nenhuma palavra proferida pode ser destruída. Eis o maior de todos os segredos.
Não existe repouso absoluto e nem movimento contínuo. Ambos são exatamente a mesma coisa. Os opostos nunca foram tão iguais. O homem em suas limitações é a medida de tudo que possa se imaginar.
Se me perguntarem porque tudo que faço é sobre mim. Explicarei de toda boa vontade. É impossível ser de outra forma. Quando saímos de nós mesmos a destruição chega. Nunca vou a lugar nenhum porque já estou lá. O passo seguinte é o único. A biologia é uma filosofia disfarçada com modéstia. 
A verdade absoluta se esconde atrás de toda relatividade assim como os meninos quando brincam. Todo tolo tenta esconder sua tolice demonstrando-a de forma mais aplicada. Os gatos possuem a calma e por isso é que são gatos. A falta desta acaba mudando uma letra e todo o enredo.
Não devo demonstrar demasiadamente minha loucura para que ela não acabe por uso demasiado. A paz é a maior arma que alguém pode ter em suas mãos. A guerra é a incoerência que faz com que todos os jogos terminem. Nada é mais importante do que as crianças querem. Não enxergar isso é que podemos chamar de cegueira.
Aquilo que aprendi não tive intenção alguma. Aproveitei mais com certos desperdícios. A minha carne lembra de algumas emoções com mais veemência que minha alma. Cicatrizes e tatuagens me tratam com uma fidelidade sem par. Desculpem se repito muitas palavras. Somos seres cotidianos e a rotina só mata quem está ao seu alcance. 
Eu não sou velho demais. Tudo é pouco para se ter um final. Culpem a minha data por isso. Algumas delas são malvadas dependendo de onde estão. As lentes são detentoras de todo o poder possível. O que guardo em meus bolsos? Tudo...

(Extraído do livro "Insano" de autoria de Carlinhos de Almeida).

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